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A manhã estava calma, mas dentro da guilda, uma tensão invisível pairava no ar. Jasmim estava em seu escritório, absorta em mapas estratégicos e relatórios de operações recentes, todos espalhados sobre uma grande mesa de carvalho, logo ao lado de uma coleção de penas e tinteiros dispostos de maneira perfeitamente ordenada.
O escritório era um misto de rusticidade e elegância, e de certa forma um reflexo de sua personalidade: organizado, eficiente e com um toque de austeridade. As paredes de pedra estavam adornadas com bandeiras da guilda e troféus de batalhas passadas, cada um contando uma história de vitória e sacrifício.
Uma grande janela atrás de sua mesa permitia que a luz do sol entrasse, lançando sombras alongadas que traziam certa calma ao local. A jovem mulher passava as páginas lentamente quando uma batida rápida na porta dispersou sua concentração. Ela ergueu os olhos, franzindo a testa ligeiramente, aborrecida pela interrupção em um momento tão crítico.
— Entre — disse ela, a voz autoritária ecoando no silêncio do escritório.
Um jovem membro da guilda, em meados de seus quinze ou dezesseis anos, entrou apressado, parecendo um pouco nervoso e seus olhos evitavam os de Jasmim enquanto se aproximava da mesa. Seu uniforme estava impecavelmente limpo, mas a ansiedade era visível em seu rosto. Ele parou a alguns passos de distância, fazendo uma reverência curta antes de falar.
— Senhora Jasmim, alguém está aqui para vê-la.
— Quem é? — perguntou a líder desta seção da guilda, voltando sua atenção completamente para o jovem. A irritação anterior foi substituída por uma curiosidade cautelosa.
— Uma garota, Lúcia, se não me engano. Ela está acompanhada de uma criatura de mana — respondeu o membro da guilda, hesitando por um momento antes de continuar. — Pelo que nos disse, Ana pediu para procurá-la.
O nome de sua irmã foi como um soco no estômago de Jasmim, fazendo o ambiente no escritório ficar sutilmente tenso. Ela sentiu um calafrio percorrer sua espinha, e por um momento, seu semblante endureceu, refletindo a tempestade de emoções que borbulhava sob a superfície. Seu coração acelerou, mas seu rosto manteve uma máscara de calma, apesar de ter escurecido momentaneamente. Os lábios se comprimiam em uma linha fina, mas logo se transformaram em um sorriso estranho e gentil, uma máscara de falsa tranquilidade.
— Mande ela entrar.
O jovem assentiu e saiu apressado, deixando a porta entreaberta. Jasmim respirou fundo, tentando controlar as emoções conflitantes que a assolavam. Ela se levantou e caminhou até a lareira, onde ajustou um tronco e iniciou o fogo, fazendo chamas dançarem alto. A ação parecia não ter sentido, mas queria de alguma forma mascarar o frio que sentia por dentro.
Quando a porta se abriu novamente, a criança entrou timidamente, com o enorme animal ao seu lado, mal passando pela grande abertura. Os guardas inicialmente não queriam permitir que ele fosse junto, mas cederam frente à forte insistência da garota para que o lobo permanecesse ao seu lado, deixando claro que a fera era sua família. Ela parecia cansada e um pouco desorientada, mas seus olhos mostravam determinação.
— Você é Lúcia, certo? — perguntou Jasmim, mantendo o sorriso gentil. — Sente-se, por favor. Vamos conversar.
Lúcia assentiu, sentindo-se ligeiramente mais à vontade, mas ainda cautelosa. Ela se sentou na cadeira em frente à mesa da caçadora, enquanto o lobo se deitava ao lado, observando tudo com atenção. A madeira da cadeira estranhamente rangeu sob o peso da menina, e o ambiente pareceu fechar-se em torno delas, criando uma bolha de tensão e expectativa.
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— Você é a irmã da Ana? — começou Lúcia, segurando sua pequena bolsa com força.
Jasmim inclinou-se para frente com seus olhos se estreitando ligeiramente, avaliando a jovem diante de seus olhos. O sorriso em seu rosto permaneceu, mas havia uma nova dureza em seus olhos.
— Sou sim, mas e você, criança, como a conhece?
— Ela cuidou de mim quando minha família… — Lúcia parou no meio da frase, com seus olhos marejados pelas intensa lembranças. O término de sua frase era facilmente deduzível, e a garota não continuou no assunto. — Alguém tá indo atrás dela, mas ela não fez nada de ruim! A gente tinha acabado de chegar na cidade!
— E depois disso ela te pediu para falar comigo?
— Não… ela disse que eu deveria te procurar se ela não voltasse — concluiu a menina, mal conseguindo segurar seus pequenos soluços. — Você… você pode me ajudar a encontrar ela?
As lágrimas finalmente começaram a escorrer, e a garota limpou-as com as mangas continuamente. Os olhos de Jasmim se fixaram nela, analisando cada palavra e expressão. Por um instante, o ambiente ficou em um pesado silêncio, com apenas o som ocasional do lobo movendo-se sobre o tapete para demonstrar que o tempo ainda estava passando.
“Realmente é apenas uma coincidência essa jovem estar aqui?”, pensou Jasmim, enquanto ouvia atentamente, tamborilando os dedos na mesa, mas sem responder.
Após um curto suspiro, se levantou novamente, caminhando até a janela do recinto, vendo os integrantes da guilda acertarem espantalhos com espadas de madeira no pátio abaixo. Ela permaneceu em silêncio por alguns momentos, ponderando sobre a situação. Uma grande nuvem cobriu o sol nesse instante, fazendo o céu ser tingido de um laranja suave, refletindo nas ruas molhadas pelo orvalho da noite anterior.
— Me diga, Lúcia, você é uma humana pura?
— Eu não sei o que é isso — resmungou a garota, emburrada e confusa.
— Humanos puros são aqueles que não foram alterados pela mana. — explicou Jasmim, sua voz calma mas carregada de intensidade, sem desviar o olhar da janela. — Muitas pessoas foram corrompidas, mutadas pela exposição prolongada à mana. Quero saber se você ou sua família têm alguma ligação com essas aberrações.
— Eu sou... normal, eu acho — Lúcia balançou a cabeça lentamente, ainda processando a pergunta. O lobo ao seu lado soltou um baixo rosnado, como se percebesse a tensão crescente.
Jasmim assentiu, seu olhar se suavizando ligeiramente, mas a dureza ainda permanecia.
— Entendo. Isso é bom… Muito bem, vamos fazer o seguinte — disse a caçadora. — Você e seu lobo ficarão aqui esta noite. Amanhã, começaremos a planejar como ajudar Ana.
— Obrigada, Jasmim — murmurou Lúcia, aliviada por encontrar apoio, mas algo na forma de falar de Jasmim a deixou desconfortável.
A mulher se virou lentamente, dando mais uma olhada penetrante nos dois convidados inesperados, e então deu duas pequenas batidas em uma pequena sineta sobre a mesa, a qual emitia um leve brilho rosado. Nenhum som foi emitido, mas em poucos segundos dois jovens escudeiros, sendo um deles o que trouxe Lúcia para o escritório anteriormente, apareceram em frente à porta.
— Você, leve os dois para um quarto confortável. E certifique-se de que tenham tudo o que precisam — ordenou Jasmim, voltando-se para a Lúcia. — Não se preocupe, garota. Encontraremos Ana.
Com essas palavras, a menina seguiu o garoto para fora, sem cerimônia adicional. No escritório, Jasmim permaneceu pensativa, olhando para o fogo na lareira, ainda com um estranho frio enquanto pensava na irmã. O outro escudeiro, aguardando suas ordens, observava a líder com admiração, mas também certo incômodo.
— Senhora Jasmim, com todo o respeito, isso é certo? — perguntou o jovem, hesitante. — Ela está em ligação com uma sombra… não deveríamos prendê-la?
Jasmim lançou um olhar feroz para o escudeiro, e sua voz saiu firme e autoritária.
— Não comente sobre isso.
— Sim, senhora — respondeu o escudeiro, engolindo em seco, ao sentir uma forte intenção de matar em sua direção
— Avise Henrique que teremos uma nova integrante treinando com os novatos amanhã — disse ela, com um olhar determinado. — Parece que tivemos uma sorte inesperada dessa vez.
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