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A Eternidade de Ana [Português, Brasil]
Capítulo 162 - Frágil Refúgio

Capítulo 162 - Frágil Refúgio

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— Você tá me deixando cansada, Cassandra — disse Madame, ajustando sua postura atrás do balcão. — Senta logo, caramba!

Na frente da velha taverneira, a musculosa mulher permanecia imóvel, encarando o mundo lá fora por uma fresta na janela. Seus olhos estavam fixos na praça ao longe, o caos ainda se desenrolando em espirais de fumaça e sangue.

Cassandra bufou, mas não se moveu. Os dedos dela tamborilavam no peitoril da janela enquanto seus olhos percorriam cada sombra, cada canto da rua. A luz fraca que entrava iluminava apenas parte de seu rosto, mas era o suficiente para mostrar a expressão de frustração na rainha mercenária.

— Devíamos estar lá fora, não aqui, escondidos — murmurou, sua voz baixa, mas carregada de irritação.

Madame soltou um riso seco, mas não olhou para ela.

— Não vamos repetir essa conversa, mulher. Quer ir, vá. Mas se quebrar o contrato de me proteger, não espere conseguir bons trabalhos com os mercenários novamente.

Cassandra virou-se bruscamente, os olhos brilhando com frustração.

— Se entrarem aqui, vamos morrer do mesmo jeito!

Antes que Madame pudesse responder, como se o destino quisesse reforçar as palavras recém ditas, o som da madeira se rachando ecoou pela taverna. A porta foi arrebentada com um chute violento, batendo contra a parede com força suficiente para soltar lascas para todos os lados.

Um soldado entrou com a espada em punho, a lâmina ainda brilhando com o sangue de algum desgraçado lá fora. Ele abriu a boca para gritar algo, mas não teve tempo.

Madame puxou o gatilho sem hesitar.

O disparo da Remington 870 explodiu como um trovão, e a força da bala de calibre 12 arrancou metade do rosto do invasor. Sangue, massa cinzenta e fragmentos de osso voaram pela sala, manchando a porta e o chão com pequenos pedaços grotescos. O corpo caiu para frente com um baque surdo, a espada deslizando de seus dedos inertes.

A arma que Madame empunhava já não era apenas uma arma. Modificada ao longo dos anos, carregava marcas que contavam histórias de batalhas passadas enquanto seguia sua trajetória pelo Novo Mundo.

A coronha, feita de ferro misturado com madeira negra, era gravada com uma série de linhas delicadas, mas desgastadas pelo uso. Essas inscrições brilhavam levemente em um tom azul-esverdeado, como se pulsassem com uma energia própria. Não eram as mais poderosas das runas, nem as mais sofisticadas, mas ainda permitiam que mesmo um leitor pudesse ativá-las com facilidade, o que era perfeito para sua dona. Sua utilidade em muitas situações também deixava a desejar, apenas aumentavam a força cinética dos disparos, mas para ela já era o suficiente.

O cano, também reforçado com aço runificado, era mais longo e apresentava pequenos sulcos que canalizavam a energia imbuida. Esses sulcos criavam uma leve luminescência durante o disparo, um detalhe que, embora sutil, tornava a arma tanto uma ferramenta mortal quanto um aviso para qualquer inimigo que ousasse enfrentar Madame. Tais runas claramente foram feitas por uma pessoa diferente da primeira, o que nunca é o ideal se você quer evitar explosões, mas já haviam se provado mais do que seguras após o contínuo uso.

Por fim, a Remington estava equipada com um compartimento de recarga modificado, permitindo que ela fosse carregada com rapidez e fluidez. O mecanismo fora alterado para acomodar cartuchos de grande calibre que, além de mais letais que as versões originais, eram mais fáceis de fabricar do que as precisas e pequenas balas, ao menos em um mundo onde o maquinário não estava disponível.

Madame passou o dedo pela estrutura da arma, quase como um hábito, enquanto substituía as balas fumegantes com um movimento fluido que claramente já havia repetido centenas de vezes. Com eficiência militar, ajustou-a novamente em cima do balcão enquanto continuava a conversa de onde havia parado.

— Não enquanto ficarmos quietos. E enquanto tivermos balas, claro.

— Balas não vão nos salvar de um rank B... — retrucou Cassandra, a irritação clara em seu tom enquanto cruzava os braços.

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— Pra isso vocês dois estão aqui. — ela gesticulou com a cabeça para a grande mercenária e Jorge, que estava sentado em um canto da taverna, aparentemente indiferente à cena que acabara de se desenrolar. — Mas sim, se vocês acabarem morrendo, as balas não vão me salvar. Por isso sai logo da porra da janela.

Jorge, que até então lia um jornal desinteressadamente, soltou um suspiro pesado quando a discussão chegou aos seus ouvidos. Sem dizer uma palavra, ele levantou o calcanhar e deu alguns toques em um pequeno canto do tapete a sua frente.

Com o pequeno aviso, uma porta deslizou para o lado, e quatro mulheres emergiram do alçapão que se abriu. Suas peles pálidas brilhavam sob a luz fraca da taverna, e seus movimentos eram rápidos, quase automáticos. Elas correram até o cadáver sem dizer uma palavra.

Duas delas pegaram-no, arrastando-o para o alçapão com esforço aparente, mas sem hesitação. As outras duas se ajoelharam para limpar os restos espalhados pelos móveis. O cheiro acre invadiu o ambiente quando uma delas puxou um balde com água escura e começou a esfregar com força, como se quisesse apagar mais do que apenas a mancha.

De dentro do esconderijo no chão, os sons abafados de choro e murmúrios podiam ser ouvidos. Ali, escondidos no subsolo, estavam aqueles que não podiam lutar: crianças e seus familiares, incapacitados ou não aptos para a guerra.

O porão não era grande, mas cada canto estava preenchido. Havia colchões improvisados, cobertores rasgados e pequenas luminárias de mana para manter a luz fraca e o ar minimamente respirável.

As mães mantinham as crianças próximas, sussurrando palavras tranquilizadoras, mesmo quando elas mesmas tremiam. Alguns idosos, com rostos marcados pelo tempo e olhos cheios de resignação, sentavam-se em silêncio, observando a porta que levava à superfície como se esperassem a qualquer momento que ela fosse arrombada novamente.

Um garoto, com não mais de sete anos, segurava um brinquedo de madeira, o apertando com tanta força que seus dedos estavam brancos. Ao lado dele, uma menina um pouco mais velha segurava sua mão, tentando ser forte por ambos.

O jornalista observava tudo isso com um peso evidente em seus olhos enquanto as mulheres terminavam de limpar o chão.

— Obrigado pelo serviço rápido — disse ele, quebrando o silêncio assim que as mulheres terminaram o serviço. — Reforcem que todos devem ficar quietos. Não podemos arriscar.

Uma delas ergueu o olhar brevemente. Ela não disse nada, mas sua expressão era suficiente para transmitir compreensão e cansaço. Seus olhos ficaram marejados rapidamente, e com um breve aceno, desapareceu no alçapão com as outras.

Antes de fechar a tampa, o homem olhou uma última vez para as pessoas escondidas lá embaixo. O garoto com o brinquedo ergueu os olhos, e por um instante, os dois se encararam. Jorge balançou a cabeça em um gesto quase imperceptível, como se prometesse à criança que tudo ficaria bem.

Por fim, puxou o tapete para cobrir a sala novamente e, enquanto o fazia, sua expressão endureceu.

— Você acha mesmo que podemos sobreviver a isso dessa forma, Madame?

A taverneira não respondeu imediatamente. Ela olhou para o rifle em suas mãos, depois para o local onde o sangue seco estava a um minuto atrás.

— Supostamente também somos puros. Só precisamos dizer que paramos na cidade para reabastecer as provisões. Ficamos presos no meio da guerra, só isso. Não estamos participando ativamente, então deve funcionar. Claro, desde que nenhum emocionado entre aqui atacando igual esses idiotas que têm vindo.

Cassandra bufou novamente, finalmente afastando-se da janela com passos pesados.

— Isso é muito "se". Você sabe disso.

— O "se" é o que temos. Então faz o que você faz de melhor e fica quieta.

A taverna mergulhou em um silêncio profundo. Madame recostou-se no balcão com o gatilho da Remington ainda firme entre seus dedos. Apenas o som distante do campo de batalha preenchia o espaço, um lembrete constante de quão perto estavam da linha entre a vida e a morte. Cassandra se jogou em um dos bancos, mas não disse mais nada, enquanto Jorge voltava lentamente a ler o seu jornal.

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