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Capítulo 39 - Seita

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Os passos do grupo ecoaram pelo salão vazio. O interior da igreja era ainda mais impressionante do que o exterior, com vitrais coloridos lançando sombras distorcidas nas paredes, criando uma atmosfera quase surreal. Símbolos estranhos e livros de couro que falavam de rituais e cultos às sombras estavam empilhados em altas estantes. A atmosfera dentro da igreja era quase sufocante.

— Isso não parece uma simples seita emergente. Eles têm algo intenso em mente — comentou Júlia, folheando um dos livros.

De repente, perceberam movimentos nas sombras. Não estavam sozinhos.

Um pequeno grupo de treze seguidores emergiu de um dos cantos escuros do local, conversando entre si com sussurros. Estavam vestidos com mantos negros com belos contornos carmesins e carregavam espadas elegantes, parecendo mais adequadas para cerimonias do que para um combate real. Suas expressões eram calmas e não transmitiam hostilidade. O grupo se preparou para a batalha, as armas em mãos, os olhos fixos nos adversários.

— Estamos cercados — murmurou Felipe, segurando firmemente sua prótese.

— Lembrem-se, sem misericórdia. Eles escolheram esse caminho — falou Ana, dando um passo à frente.

A luta começou com uma explosão de movimento, a rainha mercenária avançou com um salto, sua lâmina cortando com precisão mortal dois membros do grupo sombrio.

“Uma espada realmente tem suas vantagens”, pensou ela, vendo como a lâmina mais longa do que estava acostumada dilacerava mais da metade da cintura dos homens, os quais desabaram de imediato.

Felipe se lançou em um seguidor mais afastado com sua prótese preparada para lançar projéteis comuns, não querendo gastar as poucas balas rúnicas em situações onde não fossem necessárias. Em sua outra mão, sua espada iniciou o movimento para finalizar seu oponente, uma ação bruta, mas efetiva.

Júlia e Alex lutaram lado a lado, cada um contra um seguidor, suas armas criando um balé de destruição. Enquanto o grande caçador acertou pesadamente o peito de um deles, a garota ruiva girou seu martelo, o pesado casco esverdeado esmagou a cabeça da mulher que a encarava, produzindo um som terrível de algo molhado sendo despedaçado. A seguidora caiu ao chão, imóvel, e Júlia soltou a arma, suas mãos tremendo de forma incontrolável.

— Eu... eu a matei — murmurou, os olhos arregalados em choque, antes de começar a gritar para si mesma. — Eu a matei!

— Concentre-se, Júlia. Não temos tempo para hesitações, você já fez isso antes — Ana se aproximou rapidamente, pegando o martelo e colocando-o de volta nas mãos de Júlia.

Mas a jovem caçadora estava em crise. Seus olhos se encheram de lágrimas enquanto olhava para o corpo sem vida da seguidora.

— Eles são humanos... eu não posso… foi diferente com os piratas, eu precisava sobreviver, mas… olhe para eles, nem mesmo revidam.

Com as palavras da garota, a luta parou repentinamente, com o resto da Ironia Divina olhando intrigada ao redor. A situação ocorreu tão rapidamente que nem mesmo tiveram tempo de prestar atenção, mas Júlia estava certa, além dos cinco seguidores mortos, os demais estavam apenas parados com os braços estendidos para cima, seus lábios se moviam rapidamente e seus olhos estavam suavemente fechados.

Sem entender o que estava acontecendo, Ana se aproximou e tocou levemente com a espada curta no estranho homem à sua frente. A falta de reação atiçou ainda mais sua curiosidade, se aproximando do homem para tentar entender os baixos murmúrios.

— Obrigado, oh Mãe. Obrigado pela recompensa que nos oferece hoje.

“Mas que merda está acontecendo aqui”, questionou-se a mercenária, com a testa franzida.

— Você conseguiu ouvir algo? — perguntou Alex, ainda em guarda.

— Sim, estão… orando.

— O quê? Tem certeza? — perguntou Felipe, com um olhar confuso enquanto também cutucava de longe um dos seguidores.

— Não, mas é o que parece. Vamos embora desse lugar bizarro, de qualquer forma o bispo é quem importa.

Ana virou-se, caminhando na direção de onde os supostos inimigos acabaram de vir. No entanto, assim que ela se afastou, o homem que rezava baixinho abriu os olhos bruscamente. Diferente de antes, uma expressão de raiva preenchia todo seu rosto.

— Não, você não pode ir! Me dê a benção! Eu exijo — o homem começou a gritar descontroladamente. A voz rouca parecia arranhar sua garganta, e seu rosto ficava cada vez mais vermelho.

Os outros seguidores, ouvindo os altos rugidos, também abriram seus olhos. Notando que o grupo se preparava para sair, gritaram de forma semelhante. Alguns começaram a chorar, caindo no chão de joelhos enquanto exigiam seu suposto direito. Outros arranharam seu rosto a ponto de sair sangue.

— Saiam de perto de mim! — gritou Alex, empurrando duas mulheres que começaram a se aproximar. Apesar da sua tentativa de não machucar as pessoas insanas, um descuido fez com que usasse mais força que o normal, fazendo com que uma delas caísse e batesse a cabeça pesadamente no duro chão de madeira.

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— Que a Mãe seja louvada! — gritaram os demais membros da seita em coro, vendo a poça de sangue começar a se formar ao redor da companheira caída.

Quase que em sincronia, todos começaram a se jogar em direção a Alex, implorando para também serem abençoados.

— Porra, saiam de perto de mim! — Ele tentou fugir, mas as mãos o seguravam de todos os lados.

Vendo o jovem coberto pelos corpos, todos correram para ajudar, mas não importa o quanto os empurravam para longe, eles voltavam a pular nos caçadores, de forma cada vez mais violenta.

— Não temos escolha, temos que acabar com isso antes que mais apareçam. Matem todos — resmungou Ana, um pesado suspiro saindo de seus lábios enquanto afundava sua espada nas costas do louco mais próximo.

O grupo torceu o nariz ao ouvir as ordens. Era diferente de uma luta contra alguém que queria matá-los, estas pessoas não eram fortes ou ardilosas, apenas estavam obrigando-os a cometer um assassinato em massa, o que deixou um gosto amargo na boca de todos.

“Estou sendo egoísta”, pensou Júlia, vendo o massacre que ocorria em sua frente pelas mãos de seus amigos. Com esforço visível, a caçadora enxugou as lágrimas e pegou seu martelo novamente, atacando um seguidor que ia em sua direção.

Após um curto período, os seguidores restantes tornaram-se apenas carne espalhada pelo chão. A visão da cena, somada ao nauseante cheiro de sangue no ar, fez com que todos saíssem dali rapidamente. Seus semblantes estavam cansados e uma notável exaustão mental era mostrada em seus rostos. Cada um dos integrantes do bando caminhou pelo caminho em um predominante silêncio.

A igreja era grande ao ser vista do lado de fora, mas ao observarem os longos corredores, todos adornados com pinturas de locais esquecidos no tempo, vasos esculpidos detalhadamente ou versões menores da estátua do hall de entrada, notaram que era muito maior que o esperado. A estrutura era labiríntica, se estendendo para o subterrâneo como um formigueiro.

A princípio, paravam para olhar cada sala que encontravam. No primeiro andar, se depararam com uma vasta biblioteca. As estantes de madeira escura eram tão altas que quase tocavam o teto abobadado. Livros antigos, com capas de couro desgastadas e títulos em línguas esquecidas, estavam cuidadosamente organizados. Alguns livros tinham marcadores de página decorados com fios de prata e ouro.

Nas mesas de leitura, velas parcialmente derretidas ainda estavam acesas, lançando uma luz bruxuleante que dançava nas paredes de pedra. Em um canto, uma pilha de cartas não enviadas e diários pessoais oferecia vislumbres das vidas dos seguidores.

— Esses textos são antigos, mas alguns parecem ter sido escritos recentemente — observou Ana, pegando um diário que estava aberto e encostando levemente na tinta. — Talvez ainda haja alguém aqui escrevendo. Vamos continuar.

O segundo andar era um grande contraste com o anterior. Os refeitórios eram vastos salões com longas mesas de madeira, todas arrumadas com pratos e talheres, como se uma refeição tivesse sido interrompida abruptamente. A luz das velas nos candelabros criava sombras alongadas, e o ar estava impregnado com um cheiro azedo de comida que estragava lentamente.

Nos dormitórios, fileiras de beliches militares estavam arrumadas de maneira meticulosa. Cada cama tinha um baú aos pés, alguns ainda trancados, outros abertos revelando roupas simples e objetos pessoais.

— Parece quase uma cidade — refletiu Ana, passando a mão por um amuleto pendurado em um dos beliches. — Viviam aqui, treinavam, comiam juntos. Não é só uma igreja, é um lar para eles.

Quando o grupo desceu ao terceiro andar, a atmosfera mudou drasticamente. O cheiro forte de substâncias químicas e algo mais podre os atingiu imediatamente. As paredes estavam cobertas de fungos escuros e manchas de mofo, e o chão de pedra estava úmido sob os pés.

— O que será que faziam aqui? — perguntou Felipe, examinando uma bancada cheia de frascos de poções e instrumentos cirúrgicos. — Parece um laboratório de alquimia.

“Algo realmente interessante!”, pensou Ana, apesar de, com sua noção cada vez melhor da sociedade, suas palavras terem ido na direção do óbvio.

— Nada de bom, com certeza. Vamos continuar. O bispo é a prioridade.

Em uma grande sala, gaiolas de ferro pendiam do teto, balançando levemente. Algumas ainda estavam trancadas, mas vazias, enquanto outras estavam abertas, com as portas de ferro rangendo ao menor movimento.

— Será que mantinham pes… — Júlia, que estava olhando para uma das gaiolas por um tempo, parou no meio da frase, decidindo que era melhor não saber a resposta para suas dúvidas.

Nas bancadas, havia manuscritos espalhados, descrevendo experimentos detalhados com uma grande variedade de seres, tentando fundir suas essências através da mana.

— Isto é horrível — murmurou Alex para si mesmo, olhando uma ilustração de um humano parcialmente transformado em uma criatura sombria, antes de seguir os demais no escuro corredor.

O macabro acontecimento de antes não foi um caso isolado. Ao longo das horas, muitos outros seguidores das sombras apareceram. Em raras ocasiões, eles sacavam suas espadas ornamentadas, mas a habilidade básica não era uma ameaça para Ana e os demais. Então, tudo sempre se repetia: a luta, as súplicas, o massacre.

O número de mortes nas mãos dos integrantes da Ironia Divina aumentava a cada hora. Proporcionalmente, suas expressões escureciam. Júlia, em particular, parecia cada vez mais abalada, lutando para manter o controle.

Em certo momento, encontraram um pequeno quarto isolado no fundo da igreja. Parecia um pequeno armazém, com caixotes de suprimentos amontoados por todos os lados.

— Vamos passar a noite aqui — sussurrou Ana, não querendo chamar atenção de seja lá quem passasse do lado de fora. — Podem descansar primeiro, eu fico de guarda.

Acenando lentamente, todos sentaram-se em um canto. O clima estava tenso e a incerteza do que ainda estava por vir era angustiante. Júlia recostou-se em Alex, com lágrimas que não paravam de sair, enquanto Felipe apenas olhava para as mãos sujas de sangue com os olhos vazios.

Ana segurava sua espada, observando os muitos novos riscos presentes nela com uma expressão relaxada. Ela não estava tão abalada quanto os outros, mas também não conseguia entender completamente a situação. O tempo passou lentamente, mas logo chegou sua hora de revezar o posto de vigia com Alex. Apesar da falta de sono, a garota se obrigou a dormir, pois não sabia quando teria outra oportunidade.

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