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Duas risadas altas ecoavam pelo campo, soando como uma mistura bizarra de alegria e algo que beirava a insanidade. Para o grande cavaleiro montado em seu sapo colossal, aquele som não era nada reconfortante. Ele apertou as rédeas da criatura, tentando ignorar o suor que escorria de sua testa. Cada gota que descia parecia anunciar um presságio sombrio.
O homem, um veterano da Guilda dos Brutos de Ferro, havia encontrado as duas mulheres mascaradas enquanto vagava pela cidade, e, à primeira vista, achou que seria uma luta simples. Uma delas empunhava uma espada tão grande e desproporcional que parecia mais decorativa do que prática, e a outra carregava um instrumento musical, um alaúde, que parecia ainda mais absurdo em um campo de batalha. Ele quase riu quando as viu, o cenário era, no mínimo, inusitado.
Suspirou desanimadamente. Tudo tinha sido tão entediante desde que se separara do resto de sua guilda. Não havia ninguém com quem trocar uma boa conversa, e pior, o povo dali era simplesmente… fraco. Ainda assim, era uma pessoa otimista, então tinha esperança de que aquelas duas figuras ao menos o entretecem um pouco.
Ativando um pequeno dispositivo, um choque de baixa proporção atingiu o sapo-boi em que montava, fazendo-o parar. Era uma aberração da natureza, resultado de cruzamentos controlados de monstros, a especialidade de seu seleto grupo de Jóqueis.
Era uma visão aterrorizante por si só, com quase quatro metros de comprimento, dois pequenos chifres afiados e uma pele esverdeada e salpicada de manchas negras que brilhava como um pântano sob a luz. Suas patas traseiras, musculosas e potentes, eram capazes de saltos devastadores, enquanto as dianteiras, menores, escondiam garras afiadas que cravavam no solo como se marcassem território. A cada coaxar profundo, suas glândulas pulsavam, emanando um cheiro acre que trazia náuseas.
A sela era um espetáculo à parte, um trono improvisado com metal bruto e couro, cravado com runas que canalizavam eletricidade diretamente para o corpo do animal, ajudando em seu controle. Nas laterais, dois suportes reforçados seguravam curtas lanças de arremesso, enquanto um compartimento escondido carregava frascos de veneno extraído diretamente de seu animal.
— Vocês duas — o Jóquei chamou de repente, fazendo com que as mulheres virassem simultaneamente os rostos. — Não façam disso um tédio, ok? Meu Bogaroth está cansado de não fazer nada.
Sem intenção de acabar com aquilo rapidamente, o cavaleiro deu um comando silencioso. A montaria respondeu com um coaxar profundo que reverberou pelo campo, e sua longa língua foi disparada em direção à Ana.
O órgão viscoso cortou o ar com uma velocidade impressionante, mas, para sua surpresa, a mulher mascarada nem se mexeu. Ela apenas inclinou a cabeça ligeiramente, observando o ataque com uma calma perturbadora.
O cavaleiro sabia que não era possível ela defender com aquela estranha espada. Não fazia sentido. A lâmina era enorme, desequilibrada, desajeitada, e a mulher sequer parecia se preocupar em usá-la com o devido cuidado. Ainda assim, com um giro elegante que desafiava as leis da física, segurando diretamente na lâmina, mas sem um único arranhão, a mulher mascarada girou o braço e prendeu a língua da criatura no chão. A perfuração foi abafada, mas fez o sapo-boi guinchar em uma mistura de dor e surpresa quando, por instinto, a puxou de volta, dividindo a ponta ao meio.
— Finalmente achamos alguém — murmurou Ana, limpando um pouco do muco que escorria pela lâmina com a ponta do dedo.
— Ele não parece muito forte — comentou Nyx, inclinando a cabeça de forma entediada enquanto afinava as cordas de seu alaúde.
— É uma pena… Vamos procurar algo mais interessante.
— Combinado!
E assim, como se a luta não fosse digna de sua atenção, a rainha arrancou a espada do chão e voltou a caminhar, com a Sombra seguindo vagarosamente ao seu lado. Nenhuma delas olhou para trás. A cena era tão absurda que o cavaleiro ficou paralisado, sem saber se ria ou se gritava de ódio. A mão apertou o punho da espada bastarda que carregava, os nós dos dedos ficando brancos.
— Quem pensam que são para me ignorar assim?! — murmurou ele, finalmente recobrando a compostura.
Com um novo comando na lateral de sua montaria, o sapo-boi lançou duas novas línguas ao mesmo tempo, ainda mais rápidas e ferozes. A dupla de Insídia, sentindo a flutuação no ar, reagiu imediatamente. Antes que as massas rosadas atingissem seus corpos, ambas saltaram em direções opostas.
— Você é estúpido? — perguntou Ana, pousando suavemente no chão, o tom de sua voz carregado de puro desdém. — Vai procurar o que fazer, caralho.
O cavaleiro tremia de raiva, o rosto queimando sob o capacete.
— Você… como ousa um simples mascarado falar assim comigo?
Sem aviso, sua montaria deu um salto poderoso, lançando-se ao ar com uma força surpreendente. O impacto das patas traseiras contra o solo levantou uma nuvem de poeira, enquanto o sapo-boi projetava sua massa colossal diretamente sobre a espadachim. No alto, o monstro parecia ainda mais ameaçador, e sua sombra engoliu Ana, uma ameaça tangível que a fazia parecer pequena em comparação.
Enquanto isso, Nyx, agora confortavelmente sentada em uma pedra próxima, encarava o céu preguiçosamente.
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— Quer ajuda?
— Não esquenta. Vou acabar com isso de uma vez — Ana ajustou sua postura, os olhos avaliando a trajetória do ataque no ar.
Com a espada pronta, ela preparou um corte vertical, de baixo para cima, mirando o centro da criatura. Era um golpe calculado, direto, preciso.
Mas quando começou o movimento, ouviu um riso abafado vindo debaixo do capacete do cavaleiro. Era discreto, mas carregava uma satisfação maliciosa que a fez hesitar por um segundo.
"Ah, merda… Vacilei"
No momento em que a lâmina tocou a barriga do sapo-boi, em vez de cortá-la como esperado, deslizou sobre o muco que cobria sua pele. O atrito inesperado desviou a trajetória da espada e desequilibrou Ana, que deu um passo em falso para trás.
O riso do cavaleiro aumentou, e como se já soubesse o que aconteceria, moveu sua espada com força em direção às costas de sua oponente, certo de que o golpe seria fatal. A arma atingiu o ar, pois, inesperadamente, Ana usou sua longa espada negra como uma vara de salto, impulsionando-se para o alto com uma agilidade que muitos achariam impossível naquela situação.
O homem ainda assim estava satisfeito. Mesmo errando o corpo de sua oponente, ainda atingiu em cheio a espada que ela usava como apoio. A força do impacto lançou Ana para longe, como uma boneca de pano sendo arremessada pelo vento, e ela deslizou pela avenida poeirenta. Sem ferimentos graves, mas agora coberta de sujeira, ela se levantou com um murmúrio irritado.
— Quem é o estúpido agora, mascarada idiota? — zombou o cavaleiro, rindo ao vê-la se recompor e balançando levemente conforme o sapo virava o corpo.
Ana o encarou, seu olhar se demorando no longo risco avermelhado que sua espada havia deixado no corpo do sapo. Sem responder, ela começou a bater as mãos na lateral de sua armadura para tirar a poeira. O som metálico era irritante, e ela sorriu ao perceber isso. Fez questão de continuar batendo, como se apenas quisesse incomodá-lo.
— Tem certeza de que não quer ajuda? — provocou Nyx, os pés balançando vigorosamente enquanto continuava sentada, observando a cena com um interesse renovado. — Agora que olho melhor, ele talvez não seja tão ruim assim.
Ana revirou os olhos, sem responder, chutando uma pedra com descaso.
— Você — começou ela, encarando novamente o homem — De que guilda é?
O inimigo a observou com atenção, mantendo a espada em posição defensiva para qualquer sinal de um ataque surpresa.
— Sou um orgulhoso Jóquei dos Brutos de Ferro — declarou em uma voz carregada de orgulho.
— Jóquei? Então faz parte do grupo de elite?
— Não apenas de elite! Somos a nata entre todas aquelas guildas inúteis.
— E por que você está sozinho? Não deveria estar com o resto do exército?
— É entediante enfrentar pessoas tão fracas em conjunto…
— Te entendo — resmungou Ana. — Seria bom se as próximas lutas também fossem interessantes, mas justo os Jóqueis…
— Qual o problema? — questionou Nyx, curiosa.
— Se estão andando sozinhos, vamos ter sorte se encontrar mais algum. É um grupo bem pequeno…
O cavaleiro não esperou por mais conversas dispersas. Golpeando as rédeas com mais força do que pretendia, e o sapo-boi reagiu com um coaxar furioso antes de voltar a saltar. Desta vez, a criatura não foi para o alto, mas diretamente na direção de Ana. A mercenária sorriu, mas não desviou. Em vez disso, repetiu a estratégia de usar sua espada como uma vara de salto, impulsionando-se para cima e girando o corpo no ar, em um movimento que fazia sua silhueta parecer um borrão no céu.
O cavaleiro ergueu sua espada bastarda, preparado para aparar o ataque. Mas a mulher, no último segundo, soltou a espada com uma mão e a pegou com a outra, mudando a trajetória do golpe com uma precisão que fez o cavaleiro arregalar os olhos.
Bogaroth, percebendo o perigo iminente, lançou sua língua novamente, acertando-a com uma força brutal no estômago. O impacto arrancou o ar de seus pulmões, forçando-a a cuspir involuntariamente, mas sua espada ainda alcançou o cavaleiro. No entanto, o golpe, embora preciso, apenas deslizou pela armadura pesada, deixando um profundo risco no metal, mas sem tocar a carne, e logo ela foi arremessada para longe.
Ainda no ar, a rainha mascarada fincou sua espada no chão para amortecer a queda antes de atingir uma das casas na lateral da avenida. Seu movimento parou com um estrondo, mas ela já estava de pé antes que a poeira assentasse.
— Porra, estou muito despreocupada — resmungou para si mesma, enquanto se alongava para tentar afastar o desconforto. Ela então ergueu a espada novamente, girando o punho com um movimento ágil em direção a Sombra.
— Finalmente encontramos nosso objetivo, só por isso vou permitir que você toque.
— Que mentira! Sei que você está se coçando pra me ouvir, minha voz é tão bonita! Então… posso realmente começar?
— Pode sim — respondeu Ana, balançando a cabeça com um sorriso desconcertado Não conseguia desgostar da mulher ao seu lado, por mais idiota que fosse.
O sorriso de Nyx se alargou enquanto seus dedos começavam a dedilhar uma melodia intrigante, destoando do caos iminente. A primeira nota reverberou como um eco profundo, vibrando no ar ao redor do campo. O cavaleiro, ainda no alto de sua montaria, franziu o cenho, sem entender o que estava acontecendo. No entanto, um arrepio percorreu sua espinha ao notar a fumaça negra que começou a emanar do instrumento.
— Calma, Bogaroth… — ele murmurou, vendo o sapo sobre si estremecer, a voz carregada de uma apreensão que não existia minutos antes. Mesmo sua armadura pesada parecia mais fria, como se o ambiente estivesse drenando sua coragem. — Que porcaria é essa?
— Isso? — Ana perguntou, se alinhando em um movimento preguiçoso. — Segundo essa mulher estranha, é a hora do show.
E assim, com este último sussurro de resposta, o ar foi preenchido pelo doce canto da barda.
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