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O sutil brilho do luar contrastava com a expressão sombria da garota. Sentada em um quarto escuro, ela lia e relia os complexos livros e artigos, absorvendo seu conteúdo como se seu corpo se alimentasse disso.
“Droga, isso vai complicar minha vida”, um ponto em comum de todos os textos lidos a incomodava: a criação de ferramentas mágicas exigia o uso de mana. Para a sorte de Ana, isso era apenas em sua confecção, se bem feito, o equipamento poderia ter certa autonomia absorvendo mana da atmosfera.
Se levantando da cadeira, Ana alongou seu corpo com uma grande espreguiçada. Seus músculos ficaram cada vez mais tensos com a correria dos últimos dias, então considerou as poucas horas de leitura como seu período de descanso. Com um olhar relaxado, ela se apoiou na janela.
A noite tecia um véu de serenidade sobre o mundo, suas ruas e edifícios cintilando sob um manto de orvalho. “Há uma beleza silenciosa na escuridão”, Ana refletiu, perdida na dança das sombras e luzes que apenas a noite conhece.
Com um salto pela janela do segundo andar, ela foi em direção a sua nova forja. As 3 moedas de ouro restantes deste mês foram usadas para equipá-la de forma básica, assim como comprar alguns materiais comuns. Felizmente, com a alta disponibilidade de materiais do novo mundo, o aço era extremamente barato.
As ruas jaziam em silêncio, um testemunho do mundo adormecido. Ana, com suas roupas desgrenhadas de dormir, movia-se como uma sombra entre as construções antigas. Seus pés descalços tocavam os frios ladrilhos de pedra e a suave brisa passava por seus cabelos soltos. Ela estava com saudade de sentir o mundo com seu corpo, já que estava evitando velhos hábitos que não se adequam à sociedade. Sempre que ela esquecia que não estava sozinha, centenas de olhares eram lançados em sua direção, a deixando desconfortável.
“Assim que eu me cansar, vou morar em alguma floresta por aí. Não me lembrava de como essa paz é boa…”, enquanto devaneava, pegou seu celular do bolso e iniciou uma chamada.
— Hm? Ana? Aconteceu alguma coisa? — A voz de Felipe era confusa, deixando claro que estava em meio a seu sono.
— Aconteceu sim, me encontre no covil.
— Covil? Do que você está falando?
— Covil, forja, campo de treinamento, sei lá! É difícil nomear um lugar que serve pra tudo. Apenas vá.
— Certo… mas no meio da madrugada? — A voz de Felipe vacilou entre a sonolência e a surpresa. — Não podemos esperar até de manhã?
— Vamos lá, não reclame, apenas vá. Finalmente chegou a hora de te ajudar.
— Me ajudar? Ah, certo! Estarei ai em alguns minutos. — supondo que Ana estava falando de se encontrar com o ferreiro que reconstruiria seu braço, a mente de Felipe despertou, fazendo-o responder com uma voz animada e desligar o celular.
“Parece que encontrei minha cobaia”, Ana deu um sorriso torto, seus olhos animados viam o horizonte de possibilidades que iam além dos muros da cidade. Cantarolando sons aleatórios, ela se dirigiu para o local de encontro.
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Ana adentrou a forja vazia, o coração palpitante ante a promessa do que estava por vir. Primeiro, ela distribuiu cuidadosamente a lenha no forno, cada pedaço colocado para maximizar a circulação do ar e a eficiência da queima. Com a lenha arrumada, ela virou-se para os foles, ajustando-os meticulosamente para garantir uma oxigenação perfeita.
— Faz tanto tempo, velho amigo — enquanto organizava as ferramentas de trabalho com precisão meticulosa, ela murmurava palavras de loucura que eram perdidas no fogo.
As chamas dançaram à vida, consumindo a madeira com uma fome voraz. Movendo-se para as foles, Ana as manuseou com cuidado, garantindo que o ar alimentasse as chamas até que se tornassem um rugido poderoso. Cada ferramenta, cada pedaço de metal, estava em seu lugar designado, esperando pela alquimia que viria.
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Ali, naquele instante de preparação, Ana dançou com as sombras e a luz, as chamas refletindo em seus olhos a promessa de novos começos. Este não era apenas o prelúdio de uma noite de trabalho; era o despertar de um novo capítulo em sua jornada, cada centelha uma estrela nascendo em seu universo de possibilidades. Enquanto aguardava Felipe, o coração de Ana batia em uníssono com o calor da forja, pronta para moldar o futuro com as próprias mãos.
— Você viu como eu melhorei? — ela murmurou, lançando um olhar para o vazio onde ele costumava estar. — Lembra quando você duvidava que eu conseguisse manusear o martelo? Olha pra mim agora.
Uma risada era compartilhada com o ar, sua visão ficou borrada com lembranças, vendo sombras que não existiam acenando pelos cantos. Naquele momento, alguém entrou pela porta principal, quebrando seus pensamentos de insanidade.
— Oi Ana, estou aqui. — vendo a forja já preparada, sua animação cresceu ainda mais, cheia de antecipação — Você conseguiu contato com o ferreiro que me disse? Posso conhecê-lo?
Ana ficou sem entender por um momento, até lembrar que não havia esclarecido o mal entendido de antes. Com um giro e uma profunda reverência, ela se apresentou novamente ao homem de um só braço.
— É um prazer, sou Ana, a artesã.
— O quê…?
— Vai ficar ai com cara de tacho? Sou uma pessoa de muitos talentos!
— Okay… então não podia ter avisado antes?
— Me esqueci — respondeu ela, dando de ombros.
— Entendi… — Felipe suspirou e se sentou na bancada próxima a porta. Ele olhou ao redor do pequeno galpão, a fornalha acesa dava um ar misterioso ao local, e as ferramentas dispostas no balcão o encheram de expectativas.
“Bom, só posso torcer pelo melhor. Se foi ela quem forjou a peça de antes, deve estar tudo bem”, pensou ele, lançando um profundo olhar em direção a Ana.
— Certo, chefe. Então por onde devemos começar? — Felipe decidiu apenas ver os resultados, então questionou a garota que mantinha um sorriso bobo no rosto.
— Começamos pegando as medidas exatas de seu braço esquerdo. Depois, seguimos para a fornalha, onde vou modelar a prótese em aço. Bem, por fim temos que aprender a aplicar as runas de engenharia mágica nela. Simples, não?
— Ah, falando assim parece simples sim, mas… o que você quer dizer com “aprender”?
— Não foque tanto nos detalhes, apenas me siga, o fogo já está quase na temperatura de derretimento do aço — disse a garota, fugindo da pergunta.
Com meticulosidade impecável, ela verificou os contornos do braço restante de Felipe. Cada curvatura dos músculos e tendões foram esboçados em seu caderno, e o processo de modelagem foi simulado repetidamente em sua mente.
Ana posicionou-se diante da fornalha, onde o calor emanava como um sopro do próprio coração da terra. Ela avaliou novamente a liga de metal escolhida, sorrindo ao constatar que tinha a durabilidade adequada. Com um gesto firme, alimentou novamente o fogo com a lenha preparada, finalmente chegando a uma chama perfeita para o trabalho que tinha em mente.
O aço começou a aquecer, adquirindo um brilho vermelho-alaranjado que parecia capturar a essência do amanhecer. Perfurando a massa incandescente utilizando um pequeno espeto de aço, garantiu que a maleabilidade estava ideal.
— Vamos começar — sussurrou ela, entrando em seu próprio mundo. O fogo à sua frente era tudo que existia nesse momento.
Com o martelo em mãos, ela começou a moldar a prótese, cada batida no metal quente era calculada e precisa, uma sinfonia de faíscas. As proporções precisas foram impostas ao metal, garantindo uma ergonomia adequada para o item.
“Não é algo que alguém comum possa fazer, ela é incrível”, pensou o caçador. Os golpes seguiram por horas a fio, o brilho do amanhecer já entrava pelas frestas das janelas. Felipe ficou em silêncio o tempo todo, com medo de que suas palavras quebrassem o ritmo que emanava o poder da criação. Era apenas uma cena repetindo-se incessantemente, mas seus olhos não conseguiam se desprender das costas da ferreira.
Quando chegou a hora de gravar as runas, Ana finalmente fez uma pausa, respirando fundo. Com um pedaço de carvão, ela desenhou cuidadosamente os símbolos representando controle e movimento ao longo do aço recém moldado, cada um era um vórtice de potencial mágico.
— Venha aqui, vou precisar da sua ajuda nessa parte — sua voz estava seca após tanto tempo em meio ao calor escaldante.
— O que preciso fazer? — saindo de sua hipnose, Felipe se aproximou da bigorna.
— Não sei exatamente como explicar… preciso que mantenha um fluxo suave de mana enquanto termino o processo. Consegue fazer isso?
Felipe pareceu pensativo por um momento, mas logo respondeu de forma afirmativa.
— Acredito que sim, desde que seja o mesmo que faço para fortalecer as armas durante as lutas… Vamos tentar.
Ana respondeu com um aceno. Vendo que Felipe começou a fazer sua parte, ela começou a cantarolar baixinho o conhecimento que havia estudado, tecendo a mana transmitida nas linhas do metal. Então, utilizando um pequeno maçarico, aqueceu cada runa individualmente, ativando-as com o calor da chama e o poder de sua vontade.
O processo foi longo e demorado, dezenas de runas foram escritas em cada centímetro do aço. Por fim, ela mergulhou a prótese formada na água, aumentando sua resistência através do tratamento térmico. O som de sua criação se solidificando era como música, uma harmonia entre o fogo, o metal, e a água. Um polimento suave foi aplicado, garantindo a suavidade da superfície. Ana observou a peça, agora resfriada, com um olhar de satisfação.
— Veja — ela sussurrou. — não é só aço. É sua vontade materializada, é futuro. Experimente!
Ela havia criado não apenas um substituto para um membro perdido, mas uma obra de arte que encapsulava a essência da magia, da ciência, e do espírito humano. A prótese, agora completa, brilhava sob os primeiros raios de sol, um testemunho do novo mundo representando o poder de transformar sonhos em realidade.
Felipe a colocou cuidadosamente em seu ombro vazio. Uma estranha força de sucção comprimia a peça contra seu corpo, trazendo uma sensação de união que não condizia com algo feito de metal. Era como se seu braço tivesse voltado a existir.
— É surpreendente — murmurou ele, uma clara admiração adornava sua voz. A ponta dos dedos do novo braço tremiam levemente. — Mas… não parece funcionar.
Os dois se encararam por um momento. Um sorriso torto apareceu em seus rostos e uma gargalhada inesperada provinda do cansaço preencheu o ambiente.
— Não é como se eu esperasse conseguir de primeira. Nada nunca é tão fácil pra mim — com um suspiro longo, Ana jogou a prótese de volta na fornalha. — Esse vai ser um dia beeeem longo.
A fole começou a avivar novamente o fogo.
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