Barbara caminhava pelo mercado fora da seita, com olhos curiosos e atentos a cada detalhe ao redor. A rua estava repleta de espadas voadoras, de lâminas afiadas que cintilavam sob o sol, e de pílulas energéticas guardadas em frascos minuciosamente selados. Havia bolsas espaciais em exibição, encantadas para carregar volumes impossíveis e objetos cobiçados por cultivadores de todos os níveis. Mas Barbara não estava em busca desses tesouros extraordinários. O que realmente lhe interessava eram itens mais… mundanos.
Entre os artigos incomuns que procurava, um deles lhe chamou a atenção: um frasquinho de pó para o rosto, cuidadosamente armazenado na prateleira de uma das barracas mais discretas do mercado. Talvez não passasse de um toque estético, mas Barbara sabia que, nos círculos externos à seita, itens como aquele podiam ser úteis para camuflagem ou até disfarces.
Ao se aproximar, a vendedora — uma idosa de olhos que pareciam saber mais do que o que deixavam transparecer — notou o interesse de Barbara e a recebeu com um sorriso enigmático.
— Interessada em um toque de “charme”, jovenzinha? — perguntou a vendedora, estendendo o frasco com mãos firmes.
Barbara assentiu, observando o pó claro e levemente cintilante, sem imaginar que havia algo além de uma simples utilidade cosmética naquela mistura. Para ela, aquilo era uma ferramenta discreta para se misturar mais facilmente em qualquer ambiente, especialmente entre mortais. A verdade, porém, era bem diferente: o pó não era um mero cosmético; ele continha ingredientes sutis que, ao contato com a pele, poderiam ter efeitos inesperados. Mas, para Barbara, aquele pequeno frasco não passava de uma curiosidade mortal, uma peça de disfarce.
Barbara finalizou a compra com a idosa, guardando o frasco de pó no fundo de sua bolsa com um movimento rápido, antes de continuar sua caminhada pelo mercado. Seus olhos percorriam cada barraca, avaliando itens, embora soubesse que possuía uma vantagem rara: as sementes em seu espaço mágico e secreto. Essas sementes, bem protegidas de olhares curiosos, cresciam sob condições ideais, abastecendo-a com plantas espirituais que supriam a maioria das suas necessidades alquímicas. Porém, uma coisa inesperada acabou prendendo sua atenção no mercado.
À frente, uma confusão começou a se formar. Um cultivador errante — desgastado, mas claramente forte — discutia com os guardas do mercado. As vozes se elevavam, atraindo curiosos e preocupando alguns vendedores próximos. De repente, o cultivador lançou um golpe direto contra um dos guardas, iniciando um confronto de artes marciais que logo escalou. Os movimentos eram rápidos e afiados, demonstrando habilidades que Barbara observava atentamente. Ela se lembrou de que estava fora dos domínios da seita e, portanto, mais vulnerável a conflitos. Ali, fora da proteção dos anciãos e discípulos, as leis do cultivo eram menos rigorosas e as disputas resolviam-se na base da força.
Em meio àquele cenário de tensão, Barbara refletiu sobre seus recursos. Havia guardado consigo uma boa quantidade de pedras espirituais, trocadas por pontos de contribuição dentro da seita, e agora convertidas em um recurso valioso para negociar no mercado. As pedras eram aceitas como moeda de troca por cultivadores de todos os níveis e poderiam servir para resolver problemas, caso a situação se complicasse. Barbara tinha noção de que aquele mercado era um lugar de oportunidades, mas também de perigos, onde o cultivo e as ambições se entrelaçavam de maneiras imprevisíveis.
Ela observou a luta, contemplando os golpes e bloqueios com interesse. Percebeu que o cultivador estava utilizando técnicas agressivas e desgastantes, enquanto os guardas empregavam movimentos defensivos e de contenção. Em meio àquela disputa, uma ideia surgiu: se encontrasse uma técnica marcial discreta para complementar sua alquimia, poderia aumentar sua segurança em futuras viagens. Sabia que a dependência total de sua seita não era uma garantia para sempre, e ali, fora dos muros familiares, a realidade de ser uma cultivadora ganhava novas camadas.
Barbara entrou na loja de alquimia com um ar atento e curioso, observando as prateleiras repletas de frascos de elixires, ervas exóticas e instrumentos delicados. A loja era um lugar que transbordava conhecimento e poder, e o aroma misturado de ingredientes místicos parecia envolver Barbara, como se cada item ali tivesse uma história. Ela se aproximou do balcão e perguntou com interesse genuíno o que poderia adquirir para aprimorar suas habilidades alquímicas, mesmo já possuindo um forno de qualidade.
A atendente, uma mulher de meia-idade com olhos afiados e gestos calculados, sorriu e começou a listar alguns itens, muitos dos quais Barbara já possuía. Mas então, como se tivesse acabado de se lembrar de algo importante, a mulher inclinou-se para frente e sugeriu, em um tom quase confidencial:
— Que tal investir em uma chama espiritual?
Barbara ergueu as sobrancelhas, interessada. A mulher continuou, explicando que uma chama que ressoasse com a alma de quem a usa era um recurso inestimável para refinamento de pílulas mais avançadas. Com a chama certa, Barbara poderia atingir um nível de alquimia elevado, aumentando a pureza e a potência das suas criações, algo essencial para evoluir como uma verdadeira alquimista.
Intrigada, Barbara perguntou se haveria uma chama do elemento madeira, um elemento que combinava perfeitamente com sua raiz espiritual e amplificaria suas habilidades de cultivo e alquimia. A atendente, porém, suspirou e balançou a cabeça com pesar.
— Ah, chamas de um único elemento são raras, especialmente do elemento madeira. Esse tipo de chama você só vai encontrar em pavilhões especializados ou em lojas de renome. São itens difíceis de conseguir e altamente cobiçados por cultivadores que buscam excelência no refinamento.
Barbara ponderou sobre a ideia. Uma chama que ressoasse com sua alma e com seu elemento poderia transformar suas habilidades e alavancar suas pílulas para um novo patamar, mas a raridade e o preço de um item tão especial também a preocupavam. Ela sabia que isso exigiria uma busca cuidadosa e uma quantidade significativa de recursos, como suas pedras espirituais. Contudo, a visão de um poder alquímico superior a seduzia profundamente.
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Agradecendo à atendente pela dica, Barbara deixou a loja com uma nova missão em mente. Encontrar uma chama de madeira poderia ser um desafio que exigiria paciência e determinação, mas ela estava disposta a arriscar. Afinal, o caminho de uma cultivadora era feito de oportunidades que exigiam ousadia, e uma chama espiritual poderia ser a peça que faltava para sua ascensão na seita e em suas ambições de alquimia.
Enquanto Barbara caminhava pelo mercado, seus olhos captaram uma figura familiar: sua amiga Hai Tu, a discípula externa da seita e também aprendiz de alquimia. Elas se cumprimentaram com sorrisos e rapidamente começaram a conversar sobre o que ambas mais amavam: alquimia. Era raro Barbara ter a chance de conversar livremente com alguém de confiança sobre esse tema tão importante.
Entre as risadas e os comentários sobre ingredientes e métodos, Barbara, com um ar de curiosidade genuína, perguntou se Hai Tu possuía uma chama espiritual. Ela mal conseguiu esconder a surpresa quando Hai Tu respondeu afirmativamente, com um sorriso orgulhoso.
— Sim, eu tenho uma — disse Hai Tu. — Recebi essa chama da seita, como um presente especial para os melhores alunos de alquimia. Eles têm todo um ritual para nos entregar as chamas, sabe? E a minha foi uma das que ressoaram perfeitamente com o meu espírito.
Barbara a ouviu com atenção, os olhos brilhando de um misto de admiração e… talvez um leve toque de inveja. Hai Tu continuou, explicando como usava a chama para refinar suas pílulas e como vendia todas as suas criações na seita em troca de pontos de contribuição. A chama que ela havia recebido não era uma chama qualquer, mas um símbolo de reconhecimento, uma ferramenta que a tornava ainda mais habilidosa em suas práticas alquímicas.
A conversa com Hai Tu fez surgir uma lembrança profunda na mente de Barbara, algo que ela quase havia esquecido. Ela se lembrou de um evento marcante: o dia em que encontrou o cadáver de um alquimista antigo e poderoso. O cadáver fora uma descoberta improvável, perdido em uma caverna esquecida, e dela Barbara havia retirado um colar mágico e o forno de alquimia que agora tanto lhe servia. Mas agora, com os olhos de Hai Tu brilhando à sua frente, ela se perguntava: será que aquele cadáver também possuía uma chama espiritual?
Ela começou a sentir um arrepio de arrependimento. Naquela época, Barbara estava tão focada no forno e no colar que talvez tivesse ignorado o que poderia ser a maior oportunidade alquímica de sua vida. Será que uma chama espiritual, poderosa e ainda intacta, havia sido deixada para trás? Ou será que, com o passar dos anos, a chama se extinguira junto com o corpo do alquimista? A dúvida fervilhava em sua mente, uma mistura de ansiedade e arrependimento.
— Talvez eu devesse ter investigado mais aquele cadáver… — murmurou Barbara, quase sem perceber que falava em voz alta.
Hai Tu a olhou com curiosidade, mas Barbara sorriu, disfarçando a inquietação. No entanto, aquela lembrança ficaria gravada em sua mente, uma faísca de possibilidade que agora ardia como um novo objetivo.
Com a lembrança do cadáver do alquimista ainda fresca em sua mente, Barbara olhou para Hai Tu com uma expressão séria e, depois de um breve silêncio, perguntou:
— Hai Tu, me diga… uma chama espiritual pode sobreviver após a morte de seu cultivador?
Hai Tu parou por um instante, refletindo. Seus olhos se estreitaram como se ela estivesse mergulhando nas aulas e lições aprendidas na seita. Finalmente, assentiu levemente, como quem confirma algo de grande valor.
— Em algumas circunstâncias, sim — respondeu Hai Tu, com um tom solene. — Uma chama espiritual é profundamente ligada à alma de quem a nutre, mas, em casos raros, se for uma chama poderosa ou antiga o bastante, ela pode sobreviver por algum tempo depois que o cultivador morre. Mas isso depende muito da força da chama e do grau de ligação espiritual que o alquimista tinha com ela.
Barbara escutava cada palavra com crescente ansiedade e uma ponta de esperança. Hai Tu continuou:
— Há histórias sobre chamas lendárias que, ao perderem seus mestres, entraram em um tipo de hibernação, preservadas no local onde o cultivador morreu. Porém, para que isso ocorra, a chama precisa de condições específicas, como um ambiente adequado ou algum tipo de energia residual para se alimentar. É um risco, claro, mas… — Hai Tu fez uma pausa, olhando com um brilho de interesse no olhar. — Se você encontrou um alquimista poderoso o suficiente, talvez a chama dele ainda possa estar lá, à espera de alguém que a reivindique.
Barbara sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Ela tinha deixado para trás uma possibilidade que agora se tornava muito mais concreta. Se aquele alquimista, com seu antigo forno e o colar mágico, realmente possuía uma chama espiritual, talvez ela ainda estivesse naquele local, dormindo nas profundezas da caverna, esperando por alguém forte o bastante para domá-la.
O coração de Barbara batia acelerado enquanto ela considerava suas opções. O que antes parecia um encontro fortuito com um cadáver poderoso agora se transformava em um possível caminho para alcançar um novo nível de alquimia.
Ela agradeceu a Hai Tu pela informação, e, com um sorriso enigmático, se despediu, já formando um plano em sua mente.
Enquanto a conversa continuava, Hai Tu olhou para Barbara com uma expressão um tanto crítica e falou, com um toque de leveza:
— Barbara, eu sei que você gosta de aprender sozinha e que tem seu próprio ritmo, mas… por que você não vem às aulas de alquimia da seita? Ser autodidata é admirável, mas tem suas limitações.
Barbara fez uma expressão pensativa. Embora estivesse ciente de seu talento natural, ela sempre valorizou a independência de suas descobertas e o prazer de explorar alquimia ao seu próprio modo. Mas Hai Tu continuou, com um tom de voz que deixava claro o quanto ela levava a sério essa recomendação.
— Nas aulas, temos mestres que ensinam técnicas e segredos que levaram décadas para aperfeiçoar — Hai Tu insistiu. — Até eu, que já tenho uma chama espiritual, aprendi coisas que nunca teria descoberto sozinha. E a seita não ensina apenas o básico. Eles compartilham métodos avançados e insights que só quem possui uma experiência profunda consegue entender. Você teria a chance de entender melhor o que pode fazer com o seu forno e até aprender a utilizar materiais que talvez nem tenha considerado.
Barbara ponderou as palavras de Hai Tu. Ela sabia que, apesar de sua genialidade e habilidades instintivas, havia conhecimentos e recursos da seita que dificilmente encontraria sozinha. E talvez, com a orientação certa, pudesse descobrir formas de aprimorar suas técnicas e, quem sabe, até encontrar uma pista sobre como obter uma chama espiritual própria.
— Você é muito talentosa, Barbara — Hai Tu acrescentou, com um sorriso encorajador. — Mas, na seita, talento é apenas o ponto de partida. Eles podem lhe mostrar o caminho para se tornar uma verdadeira mestra alquimista, alguém que transforma mais do que pílulas, mas também o destino daqueles ao seu redor.
Barbara sentiu as palavras de Hai Tu ressoarem em seu interior. Ser uma alquimista poderosa não era apenas uma ambição egoísta; era um caminho que poderia fortalecer sua seita e até aqueles a quem ela desejasse proteger. Talvez fosse a hora de aceitar o convite e explorar o conhecimento que a seita tinha a oferecer, um passo essencial para se tornar tudo o que ela ambicionava.
Com um sorriso decidido, ela olhou para Hai Tu e assentiu levemente.
— Talvez você esteja certa, Hai Tu.