Tudo vai dar certo, tudo vai dar certo... Tem que ser assim, pois ele me disse isso, e me disse ainda que nunca estarei sozinho.
I
- Somos nós? – Theliel olhou assustado para Adiene, percebendo que a menina silenciara e que a “voz” se fora. O peso monstruoso da responsabilidade que sentia o estava deixando zonzo.
Adiene suspirou e abriu os olhos, saindo do transe em que estivera.
Então, lentamente olhou para Theliel, porque ouvira seu sofrimento, tendo conhecimento de seu pânico.
Sorriu apaziguadora.
- Fique tranquilo, Theliel, porque ELE estará por perto. Além disso, eu vi que outros protetores estão sendo preparados, e não tardarão a se apresentarem.
- Mas, no começo...
- Somos nós esses treze anjos – apartou, a voz tranquila e suave. – Vejo agora que estamos juntos, não por acaso. Gadhiel não despertou por acaso; não fomos separados de nossas famílias originais por acaso, não foi por acaso que em nós nasceu o desejo de descer como AsasLongas, não nos tornamos família por acaso; não... Agora tudo ficou um pouco mais claro, não ficou?
- Uma família, é o que somos, sem sombra de dúvida – sussurrou Gadhiel. - Forças vão se levantar e questionar a vontade do UM, dizendo até mesmo que ele foi enganado para exprimir essa vontade, e muito provavelmente irão se enciumar dessa, dessas novas criações, porque é normal que, quando se tem algo novo, ele seja tratado com mais cuidado, até saber, realmente, em que ele vai se tornar. Não foi assim quando os demônios surgiram?
- E nós vamos ser um daqueles que vão tomar conta do que surgir – Anael sorriu, confiante. - Devemos, meus amigos, sermos gratos e honrados – declarou, os olhos sondando os olhos de Gadhiel.
- Esse é o meu sentimento, e essa é a minha intenção.
- Não, meu amigo, essa é a nossa intenção – assumiu Bhantor, sob os olhos tranquilos e decididos dos outros.
Gadhiel sorriu, os olhos se desculpando.
- O ego é terrível – sorriu.
- É terrível mesmo. Mas, você é jovem e vai superar isso rapidinho – brincou Bhantor aplicando-lhe um leve soco no ombro.
- Então, temos que encontrar esse lugar – declarou Layla, toda alerta. – Se estamos a par do que está sendo preparado, outros também devem estar tomando ciência disso. Como não sabemos quando isso vai acontecer, temos que estar preparados.
- Se não me engano, fomos avisados de dois eventos de criação – preocupou-se Zadiel.
- Os dois estão ligados – sussurrou Haniel, como se estivesse desfiando um tapete. – O segundo só ocorrerá, ocorrendo o primeiro. Essa é a importância do que está para acontecer.
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- Pelo UM... – suspirou Theliel, sendo novamente tomado pelo pânico. – Vocês estão vendo a importância do que nos foi designado para proteger?
- Não somos só nós os enviados – Adiene tentou tranquilizar Theliel novamente. – Tudo vai dar certo, acredite!
- Está bem, desculpem... – sofreu Theliel.
- Somos fortes o bastante para isso, para desempenhar essa missão, tenho confiança nisso – falou Bhantor com tranquilidade. - Agora, vamos ser práticos, está bem? Quanto a essa fabulosa cordilheira, tenho quase que absoluta certeza que se trata de Zardun. Já estive lá inúmeras vezes. Ela nasce no sul e dá a volta lá por cima, igual à visão de Adiene. Quanto à essa única e poderosa cadeia de montanhas que corre perto dela, à leste, confesso que não reconheço. Há muitas cadeias dessas, ao lado de Zardun. Mas, por sorte, há esse diferencial de que, agora no verão, apenas doze das montanhas mantém o topo congelado. E tem esse rio largo do lado dela correndo para o norte, e esse local muito verde e agradável, aparentando ser uma planície, mais para o oriente com poucas florestas... Alguém já viu um lugar assim? Ou pelo menos tem alguma noção por onde começar? – perguntou, tentando puxar algo assim pela memória. – Por aqueles lados há planícies imensas.
Anael chamou novamente a atenção de todos para sua filha, pedindo para ficarem em silêncio, enquanto a observava com cuidado.
Ela parecia ter entrado novamente em transe, o corpo tenso, os olhos se virando para o alto antes que se fechassem.
Mais que depressa Layla estendeu às costas dela um apoio escuro e macio, onde ela se recostou.
- Há um sinal para vocês – ouviram a menina falar, apesar da voz que se ouvia ter se tornado diferente outra vez, diferente até mesmo da que ouviram no transe anterior. Essa era um pouco mais rouca e sonora, parecendo exalar um sentimento imenso de paz e poder. – Uma das montanhas, agora que o frio se foi, terá sua face do sul cortada por uma faca de nuvens, que nela permanecerá pelo tempo suficiente para que entendam que esse é o lugar. Levantem-se e sigam para o ocidente.
Então a menina estremeceu e seu corpo relaxou de imediato. Layla a amparou, até que ela despertasse de vez.
- Nossa missão começou, meus amigos. Temos que achar esse lugar e nos prepararmos para o que está para acontecer – declarou Gadhiel se levantando e saindo do casebre, indo para o sol que ardia.
Rapidamente todos se reuniram ao seu lado, os olhos postos no oeste.
- Vamos, não temos tempo a perder – falou, abrindo suas asas, os olhos felizes postos na face luminosa de Layla.
II
Durante muitas horas voaram para o ocidente. Quando avistaram a gigantesca e magnífica cordilheira de Zardun, desceram até seu ponto mais ao sul e voltaram subindo para o norte, procurando. Iam devagar, sondando as montanhas, procurando um rio perto de uma cadeia montanhosa. Especial atenção eles davam aos picos nevados, que para o levante da cordilheira eles começaram a aparecer mais, mas nenhum que se casasse com a cadeia que procuravam. Quando tocaram sua ponta bem ao norte, após cruzarem com o imenso rio descrito na visão de Adiene, voltaram novamente, aumentando um pouco mais a altura em que voavam, para ampliar a visão, mesmo com o risco da perda de perspectiva.
Quando as sombras das montanhas e montes já estavam bem espichadas sobre o chão eles viram uma cadeia de montanhas com um rio largo correndo ao seu lado. E, aumentando a esperança de que haviam encontrado o lugar, havia aquele imenso campo verde, rolando para o oriente. Se entreolharam, a esperança se mostrando em cada rosto.
Devagar desceram de frente para as montanhas, no lado oriental da margem do rio.
Era uma cadeia de montanhas altaneiras, e contaram doze montanhas de picos nevados. E, como se para confirmar, a partir do segundo terço da base subia um revestimento branco, como um creme de açúcar, até atingir seu topo.
Os olhos se voltaram para Adiene, e ela sorria confiante.
- Esta paisagem é bem parecida com a da minha visão, apesar de que ela está ficando um pouco desbotada. Mas, pelo que me lembro, está bem parecida sim. Acho que vamos ter que aguardar e ver se o sinal vai aparecer.
- O problema, Adiene, é que não sabemos quando essa faca vai cortar a montanha. E se não for aqui, vamos esperar indefinidamente? – se preocupou Theliel.
- Tudo vai dar certo – tranquilizou Tueris. – Afinal, não estamos aqui apenas pela nossa vontade.
E todos sorriram ao ouvir isso, concordando com ela.
Então, satisfeitos, em pouco tempo montaram um pequeno acampamento e se recolheram.