Tem que existir um limite até onde podemos ir em nossa loucura. É muita doideira acreditar que esse limite não existe.
A parede de anjos toda se poderou enquanto se dividia apressadamente em quatro gigantescas ondas, cada uma partindo para um dos sistemas destruídos.
Sênior atingiu uma nave com extrema violência, libertando do sofrimento um dos anjos que o acompanhavam. Assim que refeito o viu partindo contra um grupo de naves que caçavam dois anjos.
Como um autômato apenas atingia uma nave, sentia um obstáculo quase desprezível e fagulhas, que sabia serem os átomos sementes dos escuros, estranhando o quão débeis estavam, e depois mais uma, e outra mais, numa sequência automática e insensível. Achou curioso, mas sem muita importância, que até mesmo os pensamentos estavam mecânicos. Apenas atacar e destruir, e não se importar muito com o que fazia.
- Não há certo ou errado. Cada um com suas escolhas – recitava a cada novo ataque.
Como um sonambulo olhou com indiferença a destruição que causavam e continuou em frente, entrando pelas nuvens quentes de gazes e pelas rochas e detritos espalhados a esmo, caçando a próxima nave.
O tempo correu triste e longo na destruição propositada, até que a última nave foi destruída e as mônadas que haviam sido capturadas libertadas.
Ao olhar à volta viu do quanto haviam abdicado.
O número de que eram estava muito reduzido.
Podia ver com clareza o quanto haviam sacrificado.
Lentamente viu os anjos se juntando, como se estivessem se contando, avaliando o quanto haviam sofrido.
Sênior olhou nas outras dimensões todas, e viu as mônadas dos que haviam morrido sendo amorosamente conduzidas, e isso o deixou feliz.
- Conseguimos... – falou, absorto na destruição.
Seu coração doeu ainda mais ao sentir os outros. Havia aquele alívio doloroso, aquele choro que escorria incontido. Inspirou com cuidado, se dizendo, como um mantra tranquilizador: são as escolhas, são as consequências...
Porém, podia sentir um intenso pesar enquanto se reuniam, todos com o mesmo sentimento de realização e perda.
- Deve haver um limite para tudo isto – gemeu Khyah abarcando tudo à volta. – Tem que haver. Me diga, Sênior, onde está o limite para tudo isto?
Sênior e muitos outros se aproximaram e se tocaram, e todos choraram juntos, desconsolados, um apoiando a energia do outro, impedindo que o irmão ao lado caísse.
Por longo tempo ficaram assim ligados, abraçados, envolvidos.
- Não sei se há, Khyah – disse por fim. - Mas não podíamos deixar que eles raptassem as mônadas.
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- Que experiências terríveis poderiam, podem fazer com elas? – gemeu Khyah. – Por que aceitaram que suas almas ficassem tão negras? Está num grau maior a escuridão deles.
- Por aqui já acabou, e nada restou para nenhum dos lados, porque é fato que agora existem lados - sussurrou Sênior, tentando se isolar das dores de Khyah, oferecendo para os outros o agir. - Vamos até os outros grupos, para ver se conseguiram evitar o rapto das mônadas dos colonos.
Em total silêncio volitaram, juntando lentamente todos em um grande grupo.
Ao receberem os relatórios houve um nítido sentimento de alívio, apesar de terem sido recebidos em um silêncio recolhido: todos os escuros foram mortos e nenhuma mônada, daqueles quatro sistemas destruídos, fora perdida.
No entanto, era visível que o custo havia sido muito alto.
- Perdemos quase um terço dos nossos irmãos – gemeu Haamiah, a dor parecendo ter imergido um ponto a mais em seu coração. – Os escuros desenvolveram armas mais eficazes.
- Não foi pelas armas, Haamiah, nunca foi – um anjo caçador interrompeu, um guerreiro terrível que Sênior reconheceu se chamar Lúcifer. – Foi por nossa causa, novamente, que isso chegou nesse nível. Nosso poder frente a eles é incomparável. Mas, o que acontece é que não sabemos reagir, nem no tempo certo e nem mesmo na força necessária.
Haamiah observou o grande anjo com cuidado, e o que viu o deixou desconfortável.
Com cuidado olhou à volta, e viu que o discurso dele estava sendo atentamente seguido por muitos dos que ali estavam.
- O tempo e a força, você diz...
- Isso mesmo. Na verdade, quer saber, não foi nem mesmo isso.
- E o que seria então, caçador?
- A liderança aqui não existe... Eu vi como os escuros funcionam, e eles tem sempre um líder, alguém que manda, porque conhece mais...
- Esse título de “líder” nos é estranho, você sabe, não é mesmo? – estranhou. – Como pode um anjo aceitar se sujeitar a um outro?
- Os tempos são diferentes, e eu digo que é disso que precisamos. Para que possamos ter alguma chance de êxito precisaremos aceitar algumas coisas, perder algumas coisas. Eu estaria disposto a abrir mão de algo por alguém que se mostre à altura. Você acha que poderia ser esse líder?
- Não, porque não reconheço essa figura.
- E você, Sênior, deseja esse encargo? – perguntou, o ódio espalhado em tudo o que dizia.
- Também, Lúcifer, não reconheço essa figura.
- Lúcifer está certo, então – ouviram de um anjo no meio dos outros. – Nós podemos parar isso.
- Que assim seja – Lúcifer falou dando de ombros, enquanto pulsava num forte vermelho, tão forte quanto um fogo bravio. – Vocês não me representam. E, aqueles que pensarem como eu, que venham comigo – falou pulsando forte e desaparecendo.
Haamiah e Sênior olharam à volta, conferindo que a grande maioria se fora, acompanhando o anjo vermelho.
- Que tempos são esses? – Haamiah gemeu para o negro do espaço.
- Estranhos eles são, sem dúvida – falou Khyah suave. – Ao menos ainda somos muitos, e podemos fazer alguma diferença – disse, a atenção se perdendo nas poucas milhares de figuras que ainda permaneciam unidas. - Parece que tudo está passando por uma peneira – cismou.
- Tardischs – sussurrou Azazel.
- Como? – estranhou Angelina.
- Tardischs, é o que nós somos. Sabe, “os que desejam somente a luz”. É isso o que somos – esclareceu, instilou uma ligeira alegria dos outros. Talvez tivessem ficado alegres não pelas palavras, mas por terem sentido a saudosa leveza de Angelina, que lembrava a todos que, se os dias anteriores foram bons, nada impedia que os dias futuros também o fossem.
- Eu estava pensando em “umdosirmãos”...
- Sim, eu gostei, é bonito – sorriu Uriel com um largo sorriso. - Mas concordo com Azazel sobre ser tardisch, que é um nome mais para guerreiros. O “umdosirmãos” adorei, mas só entre nós, família que somos. O que acham?
- Que seja então. Gostei do nome – sorriu Sênior.
- Pois eu gostei mais do “umdosirmãos”. Suaviza a escuridão que procura nos cercar – Jasmiel falou, um pequeno sorriso bailando nos lábios.
- Um afago na alma – Dangelo sorriu.
- Bem, gostei de ambos, apesar de que vão continuar a nos chamar de justiceiros, ainda mais se depender do Lúcifer – falou Haamiah.
- Cada um escolhe seu caminho dentre as possibilidades que se apresentam, não é mesmo? – proferiu Anaita com tranquilidade.
- Vamos, Tardischs? – chamou Haamiah. – Precisamos ver se temos aliados.