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ALÉM DA CORTINA [português]
EGO OU CORAÇÃO - 2,011

EGO OU CORAÇÃO - 2,011

Foi num sol que foi criado o oxigênio.

Como sinto ao ver que esquecer não é mais uma opção.

I

- O que foi, Angelina? – perguntei, vendo uma dor incomum em minha irmã.

- Há algo mais – confidenciou, mostrando confusão em sua luz. – Não sei o que é, mas é sobre esses que encontramos. Eles não parecem novidade para mim – falou, os pensamentos se esforçando. - Parece que já os encontramos antes.

- Este é um sentimento que muitos estão relatando – contei.

- E então?

- Então... Precisamos saber o que está acontecendo. Vamos? Precisamos reunir os outros – sugeri.

Em pouco tempo estávamos todos reunidos, milhões, uma massa de energia tornada uma. Então manifestamos a intenção e nos expandimos, sondando os tempos e as dimensões, e como uma explosão de luz tudo se abriu, e soubemos parte da verdade das coisas que estavam acontecendo.

Com o corpo energia que sou, assustado e trêmulo cortei a ligação e me retirei. Por um momento aquilo se tornou insuportável, e me senti miserável demais. Aquele sentimento de familiaridade com as coisas que estavam ocultas era muito amargo por si só, confuso e doloroso demais. Mas, mais ainda, era terrível saber que eu precisava daquelas lembranças.

Olhando ao lado vi que muitos de nós estávamos assustados e assombrados com o que havíamos visto. As energias que éramos estavam um pouco fora do equilíbrio. Então muitos de nós nos estendemos e irradiamos amor, trazendo um novo e benfazejo equilíbrio, sussurrando que tudo estava bem, que apesar de doloroso e desconfortável tudo aquilo, toda aquela sensação de espanto, medo, raiva e desprezo não era de todo desconhecida por nós. Nós já a havíamos sentido antes, e a havíamos vencido, nos dissemos.

Um silêncio medonho caiu em todos nós, e por um bom tempo ficamos assim, quietos, pensando. Então, lentamente, fomos despertando de nosso marasmo e nos aproximando um do outro. Ainda estávamos silenciosos, avaliando a nós mesmos e aos outros.

Mas havia de um de nós que se ocupou de vasculhar o tempo mais metodicamente, com férrea determinação. Foi esse irmão que se levantou, enchendo com sua luz aqueles espaços, pulsando como um farol para todos nós, porque ele havia se lembrado em parte.

- Sabem quem sou – ele começou a falar, a voz macia e vigorosa, - porque em um momento eu fui, e Haamiah eu sou. Isso que encontramos aqui se chama escuridão, e é uma fase da experiência desejada pelo UM – contou, - e nós já a encontramos antes, nos superuniversos onde já estivemos. Porém, lá ela era apenas uma experiência leve, a saudação de uma curiosidade, uma brincadeira. Mas, aqui em Orvônton, e mais precisamente aqui em Onáriah, ela avançou para um nível terrível, se tornando dualidade, para si criando várias estruturas de casca como medo, poder, luxúria e outros tantos sentimentos que nos são estranhos.

Ouvindo aquilo algo em mim cresceu, e eu vi, e vendo me lembrei quando o que sou se abriu. Estava tudo ali, nossos encontros anteriores com a escuridão, quando não era tão densa, e como nós a combatemos, nos esforçando para que não contaminasse outras consciências, abrindo mão da energia do coração que éramos.

> Superuniverso após superuniverso – continuava ele, - o desejo de um novo nível de experiência pela escuridão foi avançando, e assim deixamos, porque era o que se desejava.

> Mas, aquele não era nosso desejo.

> Então abandonamos a energia do ego, deixando de ser os guerreiros que éramos e nos tornamos novamente energia do coração. Em paz com as escolhas que todas as consciências faziam, porque esse é um direito, nos afastamos, vindo buscar refúgio em Orvônton.

Com um peso estranho sondei os outros irmãos, e vi que muitos encaravam essa verdade, recordando o que havíamos sido.

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> Como agora sabemos quem fomos – continuava Haamiah, - sabemos o que temos que voltar a ser, porque a escuridão nos encontrou, e ela está tremendamente mais densa que antes. Um dia, muito recuado, tomamos uma decisão, acreditando que ela seria a melhor, a de barrar a escuridão, mas... Fomos os primeiros a fazer-lhes frente, e sofremos por isso. Fomos um dos primeiros a não aceitar a escuridão, como fomos um dos primeiros a enfrentá-la. A escolha que fizemos pelo coração vai ter que ser abandonada – declarou, o brilho aumentado em uma escala mais dura, como aumentavam as auras de todos os que ali estavam.

II

Samael baixou a cabeça, os pensamentos se perdendo, vasculhando, recuando.

Com surpresa viu toda a crueza do que seu irmão descobrira, do que ele recordara. E, ao acreditar que era real, real ela se tornou, bem sabia.

- Eles estão muito diferentes – Samael cintilou fracamente. - Eles estão duros e desesperados... Algo aconteceu, em algum momento.

- Eles acreditam que estão abandonados pelo UM – suspirou Haamiah. – Eles estão fora de controle.

Samael então se fechou e recuou, tempos e lugares criados, espaços e eons, até que se viu, anjo no paraíso recém-formado.

Eram recentes ainda, e tudo como novidade existia. Enquanto cuidavam e criavam viram algo diferente, cheio de estranhos ruídos se aproximar, e assustados a viram se derrubar sobre eles como uma onda que trazia em si uma tempestade monstruosa. E a onda escura os encontrou e os engolfou. Pegos na massa escura se viram obrigados a aprender a fazer-lhe frente, barrando seu avanço terrível, louco, cheio de pavor e desespero. No início tentaram fazê-los se verem, da loucura e enganação em que se haviam lançado; mas eles não queriam ver, não aceitavam ver, desconfiados em sua monumental vontade de descobrir novas formas de experimentar a criação. Então, cientes de que nada podiam fazer para resgatá-los, porque eles não conseguiam ouvir, viram que lhes sobrava apenas a alternativa de aprender a combatê-los. Talvez aquela fosse uma outra face da mesma experiência que eles experimentavam, se disse naqueles velhos dias.

Sem escolha que encontrassem, em guerreiros se viram.

Por eons batalharam e lutaram, tornando-se cada vez guerreiros com mais dores e dívidas, até que em um dado momento se perguntaram o que estavam fazendo, o que estavam aceitando perder. Então pararam e se foram daqueles setores onde se esforçavam em conter a escuridão.

Em cada um de seus irmãos, em cada pulsar que eram, sabiam que não era o ego que desejavam, porque ele nada acrescentava, a não ser mais dor e mais sombras, a tudo endurecendo, a tudo se justificando. Era a pureza do coração, era o sentimento nobre e silencioso da luz que desejavam com todas as forças.

Então novamente despertaram e subiram na luz que nunca haviam deixado de ser.

Foi assim que se esqueceram das guerras e do ego, foi assim que se esqueceram das sombras e da escuridão. Suas armas se desfizeram na energia em que tinham sido invocadas, e em paz se olharam novamente.

De anjos coração a guerreiros cheios de ego, que voltaram a ser apenas anjos coração. Assim em paz se foram para um novo superuniverso recém-criado, que foi pelos Elohins chamado de Orvônton, e para um lugar ainda mais promissor dentro dele, chamado Onáriah, onde em paz se puseram a criar e emoldurar.

Como podiam saber que voltariam a ser inocentes novamente, quando deixaram o ego para trás?

E agora a escuridão novamente os encontrava, e ela estava ainda mais ensandecida e louca do que antes.

Samael se virou para os seus irmãos, a luz um pouco esmaecida ao ver que a escuridão os rodeava novamente.

III

Samael se ergueu na luz que era e pulsou forte, chamando a atenção sobre si. Haamiah, o que primeiro se lembrara e disparara a lembrança na grande maioria, sorriu satisfeito, voltando-se para ele.

- Samael era o meu nome, há muito tempo atrás, quando tentamos conter a escuridão, e era o meu nome quando acreditamos que poderíamos voltar a ser como antes, puros, inocentes, envoltos no reconhecimento do UM – falou, uma energia se condensado a partir de sua mão. – Por um tempo foi assim, e isso foi bom, em termos. A escuridão avançou e estilhaçou muito da inocência que havia. Talvez fosse a experiência que os escuros desejavam, mas, certamente, não é a experiência que desejo – declarou, vendo que havia milhões à sua frente, as velhas energias surgindo, se endurecendo uma oitava, da qual tomavam posse novamente, tal como ele, que tomava posse da sua, que afagava com intimidade.

Devagar olhou para si mesmo, sua energia pulsando levemente em um azul claro e suave com alguns veios verticais brancos.

- Um dia desejamos novamente a energia do coração – retomou Haamiah, - e estávamos certos. Mas, a escuridão não conseguiu diminuir sua dor e sua revolta consigo mesma e com outros por não terem caído, e avança para que não haja a luz que tanta falta lhe faz, que tanta saudade lhe dói. Então, o que nos resta?

Sem qualquer som as energias pulsaram mais fortemente.

Samael sorriu condescendente. Era compreensível a reação de muitos deles que partiam, se recusando a se tornarem novamente o que haviam deixado para trás.

> Vai demorar – ouviu Haamiah dizer assim que se aproximou o suficiente de si.

- Sim... Tal como foi demorado e doloroso quando decidimos deixar a energia do coração e ser energia do ego, e quando novamente decidimos voltar à energia do coração. Mas, logo vamos reaprender, e a escuridão terá que rever seus caminhos. Afinal, é na adversidade que a consciência tem que se reavaliar, não é?

- Um eterno bailar, meu irmão – sorriu Haamiah confiante. – Seremos poucos, mas suficientes – declarou, não conseguindo esconder uma nota de tristeza na voz.