Por isso, não existe o certo ou errado.
Sorri para a escuridão que subia ao meu encontro, e me obriguei a pesar o que eu poderia me tornar. Meu coração pulsou quando sorri para o espaço vazio.
De súbito pararam, observando as distâncias, mantendo o foco num gigante gasoso que circundava um gigante azul. Todos sentiram uma pancada violenta no coração, pois era evidente que algo estava acontecendo ali, e ele se mostrava com um forte aspecto do mal.
Com cuidado se aproximaram, procurando se manter ocultos.
Sênior sentiu algo estranho crescendo dentro de si, enquanto via muitos milhares de irmãos, assombrados e enojados, se afastando céleres, desaparecendo além da escuridão.
Com o rosto endurecido observou atentamente os que permaneceram, e viu que eles embalavam os mesmos sentimentos que agora o possuíam.
Lentamente sacou a vintana, sendo imitado por todos os outros que desembainharam suas espadas.
- Isso aqui não é uma colônia, mas uma prisão, uma despensa onde os escuros guardam alimentos – falou com a voz dura e tensa. – E não há só esta despensa. Observem e verão que eles mantêm outros lugares assim. Não está em mim aceitar isso...
Quando caíram sobre o planeta uma imensa matança ocorreu. Como ceifadores não se diziam mais que combatiam irmãos, mas sim que buscavam erradicar de vez o mal, e de uma tal forma o faziam que as mônadas que os corpos escuros ocupavam sofriam e se lamuriavam enquanto partiam.
Após a limpeza de todo o sistema, indo de planeta em planeta, vigiavam a subida das mônadas libertadas, os corações duros, apenas conferindo, como sonâmbulos, que elas estavam felizes, satisfeitos ao verem que eram rapidamente amparadas por anjos postados muito longe, que se mostravam confusos, se perguntando de onde elas tinham saído e porque apresentavam aspecto tão roto.
Então os tardischs se ergueram e buscaram um outro setor, e mais outro, penetrando cada vez mais no cinturão da horda, um anel de sistemas que a escuridão reivindicava como sendo de sua posse, e que lhes foi tomado em um espaço muito curto de tempo.
Quando os tardischs terminaram no cinturão nada mais havia, com vários dos planetas se mostrando irremediavelmente destruídos.
Foi após a guerra no último planeta do cinturão, um planeta médio de cor amarronzada chamado Hamem Deith, quando os tardischs dele se elevaram, que se encontraram com uma parede de anjos guerreiros. Em suas faces viram apenas desprezo e nojo ao examinarem quem eram, o que pouca importância teve para os tardischs.
Os tardischs flutuaram sobre o planeta que fumegava, envolto em uma densa neblina de caos e destruição. Após observarem os anjos por alguns segundos se viraram para partir, examinando as distâncias, procurando algum outro ninho de escuridão.
- Esqueçam suas intenções, recuem de suas vontades – ouviram do anjo que comandava o exército.
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Sênior estacou e se voltou para encará-los, tal como todos os outros.
- Não vejo escuridão em vocês, então partam. Não coloquem suas vontades contra as nossas – avisou, a voz reboando fria no espaço frígido.
- Não temos escuridão em nossos corações, mas vocês têm. Devem nos acompanhar – falou, fazendo surgir, em cada anjo da linha de frente de seu exército uma cadeia brilhante, avisando que seriam acorrentados. – Serão julgados pelos seus atos.
Sênior, de súbito, surgiu bem à frente do comandante, os olhos ferinos, fincados nos olhos do outro.
- Julgados, pelo que? As centelhas estavam sendo torturadas das formas mais horrendas possíveis. Eles as queriam deformadas, transformadas em algo que à escuridão servisse. Agora elas estão livres.
- Se engana, tardisch. Não viu que muitas delas, após vocês as terem libertado, se uniram novamente à escuridão.
- Se assim é, foi porque lhes foi tirada a capacidade de decidir, porque tentaram destruí-las. Vocês deveriam combater a escuridão e...
- Combatemos o mal, e agora vocês se revelaram como tal. Respeitamos as escolhas feitas, mas o que vocês estão fazendo, a forma como estão batalhando, acreditando que lutam pela luz, é um caminho perigoso demais. Vocês combatem com a escuridão em seus corações.
Sênior ficou em silêncio, avaliando. Então sorriu, um sorriso sarcástico e cheio de fel.
- No fundo de seus corações nos temem, não é mesmo?
- Três impartidos escuros existem. Esse universo não precisa de muitos mais.
- Não vê que até mesmo os que se partiram possuem sua expressão impartida? – falou, a voz reboando pelo espaço.
- Mas, eles não são como vocês...
- E como somos nós?
- Loucos...
Sênior se virou, observando as centenas de milhares a que agora estavam reduzidos, e viu uma luz vigorosa e dura em cada um. Porém, sorriu ao ver que era somente luz o que via.
- Afastem-se – ordenou, dando-lhes as costas e se afastando. – E se mantenham longe de nossos caminhos. Avisem aos outros... Agora, mais uma vez peço que saiam do caminho, ou então serão tirados dele.
- E como pensa em fazer isso?
- Não estou sozinho.
- Nós fomos enviados pelo conselho.
- Já disse isso – debochou - Não vamos ficar inertes enquanto a escuridão avança. Vários postos angélicos sucumbiram, e agora são postos escuros. Não veem que esse discurso lhes foi passado de forma maliciosa pelos escuros para que não reajam? Não ouvimos esses discursos, e quando chegam até nós não lhes damos ouvidos.
Sênior sentiu a torção no espaço-tempo, e reagiu.
O punho, visivelmente, manipulou o espaço, criando um cisalhamento, que pegou o comandante anjo atacante totalmente desprotegido. Ele tentou se afastar daquele lugar, mas o tecido do tempo também havia sido manipulado, ele percebeu tomado de horror, vendo o rosto daquele anjo zangado se formar à sua frente, enquanto a espada entrava com suavidade em seu peito.
Sênior sentiu o exato momento em que a massa de anjos se moveu contra eles.
Onda após onda se defendiam e atacavam.
Assim foi até que Sênior observou os anjos, e soube que o cuidado que eles tinham em não matá-los não era correspondido.
Com os olhos endurecidos se perguntou se o seu desejo de preservá-los era uma indecisão perigosa, que colocava em risco muito mais que pensava. Já passara por algo assim uma vez, e fora doloroso demais.
Então se decidiu.
E foi essa decisão que a tudo alterou.
A partir desse momento, quando atacou não mais era contra irmãos que lutava, mas contra pobres seres que usavam sua força para impedi-lo de proteger os mais fracos. Então toda sua força foi colocada à sua vontade.
O primeiro que morreu sob sua espada foi o que assumira a vaga de comandante, e depois, sob os tardischs, todos os outros anjos.
Os seres escuros que a tudo seguiam, assustados com o que viam, abandonaram seus covis e redutos, numa desesperada tentativa de se afastarem, mas foram impedidos, caçados e dizimados com violência.
Como uma terrível onda os tardischs foram avançando, cada vez mais duros, cada vez, agora, mais implacáveis. Eram como um vagalhão que explodia as linhas que se lhe opunham, nada mais deixando após sua passagem.
Por um tempo enorme demais os tardischs foram caçados, pela luz e pela escuridão, e a ambos os lados respondiam, conscientemente sendo bem mais terríveis com os escuros, apesar de serem impiedosos com ambos.
E tudo se tornou ainda mais terrível quando retornaram à Aden.