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Graco, como um expectador fantasmagórico, está atualmente vendo toda a paisagem como se estivesse manuseando em sua mente um globo de neve. Neste cenário, Graco assiste o funcionamento de uma sociedade com pirâmides de pedra, com escadas que sobem até seu topo.

E neste topo, em um altar de pedra, quatro homens nus e pintados de um pó branco seguram os quatro membros de uma mulher adulta de quase trinta anos, que tenta se soltar, se debatendo e uivando à toa, pois sua boca está coberta por um couro felpudo.

Pelada a luz do sol, ela ainda sente um frio mortal em seu corpo trêmulo.

Em frente ao altar, um homem mais alto, com tatuagens, adornos de ossos e pelagem animal, brincos de gemas escuras, cicatrizes em forma de letras estranhas, ruge aos céus com os olhos observando o sol escaldante em fanatismo limítrofe.

Como plateia deste ritual macabro, está uma multidão de pessoas, de todas as idades e sexo, vestidas com peles animais que cobrem sua pélvis, berram e vociferam com fervor em ritmo uníssono com o bater de seus pés no chão e bater de palmas.

Como um hino animalesco e infernal, o som de um apito parecido com gritos de tortura, mistura-se com no espetáculo distorcido.

Novas pessoas, com pelagens mais refinadas com joias e acessórios exóticos, saem do alvoroço de humanos para ficar em frente ao início da gigante escada, estes, com o rosto banhado em sangue, se ajoelham diante dos degraus, esperando a benção de seu deus.

Graco, vendo toda a trama desumana com olhos obscuros, sente-se com nojo e ódio. Ele sabe que é a cultura desta sociedade desalmada, uma que culminou por gerações e por meio de histerias favoráveis, perdurou em sua história.

Estranhamente, Graco, tem um sentimento de conexão com a mulher de longos cabelos pretos. Graco consegue sentir suas intensas emoções de terror, fúria e vergonha, ele sente a sensação de ser traído, aquele amargo véu da confiança e fidelidade apunhalada, de expectativas sendo destruídas.

Graco do mesmo modo que a mulher, vê a sombra gasosa e dançante se erguendo em frente ao rosto da mulher, propondo-o uma generosa vingança.

Com seu linguajar diabólico, a mulher balança a cabeça em concordância com olhos injetados de irá por tudo, a emoção que Graco mais carregou em seu ser.

"Seu tempo será dado, Eztli, mas com novos objetivos e métodos. Este povo em poucas décadas será dizimado por doenças e massacres de outro civilização mais distante, então não se apresse, querida, você verá o fim dos que lhe infligiram desgraça."

A voz sombria e congelando da fumaça preta, chega aos ouvidos de Graco, fazendo-o descobrir que talvez existam outros que tiveram a mesma chance que ele.

Em súbito movimento, o Xamã ergue um facão de pedra, e o finca no coração da mulher, que se contorce em agonia, mas o encara com raiva ardente.

Surpreso com sua resistência, o mestre de cerimônia, começa a cortar e despedaçar o centro do peito da mulher, arrancando seu coração ainda vazando sangue quente e o ergue ao céu, apenas para deixar cair a cascata sangrenta em seu rosto.

Graco, agora, sentindo toda a dor física e emocional de Eztli, começa a rugir atormentado. Ele não tem nenhum corpo enquanto sonha, apenas sua consciência, mas isso não o impede de ter todos os seus sentidos no gatilho.

Os quatro homens nus ainda seguram os membros da mulher, o xamã, já satisfeito, joga o coração escada à baixo, vira-se para o altar e inicia um desmembramento dos braços, pernas e cabeça do cadáver de Eztli.

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Os homens esbranquiçados agora seguram seus presentes com entusiasmo, cada um morde sua parte preferida e voltam caminhando lentamente para suas famílias.

O Xamã louco, com força, atira a cabeça entre a multidão, causando uma comoção de brigas. Sobrando o torso, as pessoas ajoelhadas iniciam sua subida, com honra e glória, quando chegam em frente ao Xamã, começam a se despir lentamente.

Quando prontos, o Xamã salpica seus ombros e torsos com os dedos sangrentos.

Todos em antecipação, seguem em passos firmes para o autor, se ajoelham em frente ao altar e perante ao seu sol, e são tragados pelo banquete antropofágico de um torso de uma mulher jovem, saudável, virgem, e o delicioso tempero da derrota de seu inimigo.

Diante da panaceia canibal, Graco ressente novamente o reacender do desespero que se afastou dele, a pura repugnância asquerosa da laia detestável que este povo mundano representa, deixa Graco sedento por uma chacina que limpe o âmago.

''Gostou do meu passado? Ou ainda me considera um placebo de sua própria loucura, Loc?" Falando com indiferença patológica e com uma pequena risada, Eztli zomba da situação.

Graco, vira-se para olhar apaticamente para Eztli, sentindo-se oco por dentro, o imenso vazio voltou a ele, ocupando sua existência e o sugando lentamente para o familiar limbo escuro e ilimitado.

Eztli surge em sua forma de fumaça branca e translúcida, mas ocasionalmente aparece tons de preto, carmesim, roxo, azul e cinza no gás de sua alma, todas contendo traços doentios e umbrais. Cintilações que Graco encara com desconfiança.

"Você chegar do nada em minha mente, começar a implorar desesperadamente e falar coisas incongruentes não é eficaz em qualquer situação.''

''Concordo, mas você faria diferente em meu lugar? Como eu disse, vivi muito tempo naquela escuridão indiscernível, perdi muita memória de minha vida, mas adquiri muito da sua, para saber o mínimo de seu caráter cínico seletivo. Se eu chegasse já exigindo algo, você provavelmente iria me apagar, e isso é morte para mim.''

Eztli explica calmamente para Graco, os dois com a dificuldade da confiança, caem em um embate na mesma ideologia, mas de circunstâncias distintas.

Graco direciona seu olhar novamente para a paisagem canibal, e responde Eztli com sua típica apatia volátil.

''Tem razão. E por que você está na minha cola? Não existem outros usuários que você poderia ter ido? E que utilidade você terá, além de que não posso confiar em você. Eztli, você vive na minha cabeça, posso ser influenciado e até controlado futuramente por ti. E me chame de Graco."

Eztli, sentindo a puxada violenta de sua alma costurada na existência de Graco, Eztli fica nervosa e com medo, voltar para aquele lugar ou morrer sem nem ter tido a chance de viver corretamente seria algo que ela não aceitaria, mesmo que tivesse que se submeter a Graco.

Por ter passado muito tempo na escuridão, Eztli sentiu a saudade de estar vivo, de sentir algo além de seus pensamentos. Ademais, ver Graco se apegar a seu novo nome somente serviu como prova a ela o charme de estar vivendo em uma realidade confortável.

"Não faça isso, por favor. Graco, você pode me tirar a qualquer momento de sua mente. Eu conheço as nuances do poder da entidade, eu mexia com o poder da fumaça quando estava na escuridão, eu posso lhe ensinar.

Confie em mim, Graco, este poder ele corrompe o portador e é muito corrosivo à psique, e por mais forte que seja sua resiliência, o umbral irá utilizar de suas emoções e sentimentos para te controlar. Você pode ferir as pessoas que não quer Graco, este é um poder maligno e oportunista, ele somente precisa de uma marionete não de uma pessoa"

"E me agarrei a você, Graco, porque você era um dos poucos entre a dezena que estava lá, que não caiu completamente no abismo, você caminhava nele carregando uma pequena vela acesa com uma chama fraca, mas persistente.

Você ainda quer viver, Graco, você não foi arrastado para as profundezas do desejo de destruição, você existiu no abismo, inconsciente, mas afastado da escuridão esfomeada pelo resto de humanidade que ainda pode estar em nós."

"Graco, por favor, me ouça. Você me descobriu e conhece a poucas horas, mas assisto sua vida a muito tempo. Vi as atrocidades que fez, mas você nunca riu do que fez, você ria da insanidade que sua vida submergiu você.

Seus atos não tinha prazer sádico, apenas a inatividade de emoções, você se tornou débil de empatia por quase tudo, Graco, mas não jogou fora sua escassa decência.''

"Você nunca teve relações sexuais com alguém, Graco. Isso pode ser considerado um constrangimento para a cultura da sociedade de sua época, mas para o abismo isso é uma calúnia do mais alto nível, aquela entidade é hostil, ela repugna suas migalhas de pureza, ela quer que você se afunde em hedonismo, ela quer amputar seu lado bondoso. Graco, você nem matou crianças ou pessoas inocentes."

"Acredite em mim, toda aquela cena que você viu fui eu sendo sacrificada, você não encontrou mortes em minha alma, você não se lembra. Eu não sou uma vítima, eu tramei contra meu inimigos, mas meus pais me traíram e morreram por barganhar meu corpo, e não por mim.

Eles me jogaram naquilo somente porque achavam que uma mulher virgem que tem os pais mortos é amaldiçoada, Graco. Atesta por si."

A voz chorosa na súplica de Eztli não desequilibra a inatividade emocional de Graco. Tentando dar o voto de confiança, Graco fecha sua consciência e entra instintivamente nas fendas do que resta da memória de Eztli.

E ele vê o que ela relatou, uma tímida jovem chorando e amargura devido a ganância de seus pais, trancada em reclusão por anos para servir como uma grande fortuna por sua beleza.

Eztli viveu durante anos no mesmo espaço, isolada de pessoas, com pais que a tratavam como mercadoria, a tratavam bem para deixar bem fisicamente, não se importando com a sua qualidade mental.

Até o início de sua adolescência seu país deixava ela sair de casa, contudo, quando os traços de sua beleza começaram a aparecer, ela foi jogada em cárcere privado.

Quando saiu, foi entregue como escrava sexual à nobreza indígena.

Todo o ódio que foi criado, a fez envenenar seu captor e pais, mas ninguém morreu. Seu captor, pensando que a conspiração foi de seus pais, os mata e os alimenta as onças da selva e acusa Eztli como amaldiçoada para sair impune.

"Eztli ... porque você quer viver?" A indiferença e migalhas de desconfiança é presente, mas as palavras carregam curiosidade bondosa.