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A TERRÍVEL SAUDADE

Eu te vejo e quase não te reconheço. É melhor saber que estarei sempre atento.

Foi no contraforte de uma montanha que Lázarus a localizou. Em silêncio apontou o lugar para Ariel.

Não porque ela se mostrasse, mas porque, desde quando tivera contato com ela através das memórias de Castiel, guardara sua energia.

Em silêncio rodearam o lugar, descendo sem estardalhaço no caminho de pedras que ela tomava, em direção a um canto do mar.

Ela parou, os modos arredios e desconfiados. Por fim, vendo que era ela que eles fixavam, se tornou bem mais animosa.

- Vão embora – falou, os cabelos se movendo como largas ondas. – Hoje não estou muito desejosa de uma batalha, apesar de que isso até poderia alegrar o meu dia.

- Não viemos por você, sedenerá, mas por um velho amigo meu.

- Não o conheço, caído degenerado, nem a você, caída nojenta. Então, como poderia ter um conhecido comum com vocês? Desapareçam! – rilhou.

- O nome dele era Castiel. Se lembra dele? – perguntou Lázarus, os olhos vasculhando a cabeleira negra e brilhante, atento aos brilhos disfarçados daqueles olhos ocultos que queriam parecer maus.

- E eu deveria?

Ariel notou uma vibração de dor na voz dela. Curiosa, a observou com atenção. Ela era esguia e alta. O cabelo totalmente negro e escorrido chegava-lhe quase até a cintura, caindo por todos os lados da cabeça, como um espesso e longo elmo, tão espesso que era bem difícil até mesmo discernir seus olhos. Era uma bela pessoa, essa sedenerá, se viu avaliando.

Ela se balançava lenta e ameaçadora de um lado para outro, mantendo-se no mesmo lugar, os olhos ocultos provavelmente presos nos dois, talvez mais em Lázarus, que estava mais próximo.

- Ele poderia ter escapado da prisão em que o mantinha, mas permaneceu lá por você, suportando toda a dor que injetava nele – Lázarus acusou com suavidade.

Os cabelos dela demonstraram mais vida, movendo-se nervosamente em torno de toda sua cabeça.

- Você eu não conheço, ou reconheço – falou para Ariel, a voz tornando-se dura e desapaixonada. – Mas você eu consigo ver, das memórias dele. Você é o maldito anjo – falou, a voz como o som do vento passando em um bambuzal.

- Se olhou realmente fundo nas memórias dele, viu que um dia ele te chamou de irmã e te amou. Talvez tenha sido por essa lembrança que ele te procurou, e se deixou aprisionar. Foi por amor a você que ele aceitou o que você lhe deu.

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– Eu só vi um fraco, que estava preso por um anjo. Você o prendia numa jaula – ela acusou, a voz ferina e mordaz. – Eu não tinha, nem nunca tive, qualquer responsabilidade com ele. Ele não era da minha espécie. Ele veio e me importunou. No final, vi a prisão em que você o mantinha e eu o libertei da jaula, da maldita jaula em que você o mantinha - a risada resvalou oca pelas paredes úmidas e bolorentas. – Eu vi, e era você o carcereiro sedento, sempre ali, observando, controlando, firme e frio. Ele quase ficou louco, sabia? Ele te amava. No final eu vi isso. Ele queria te chamar, mas não quis arriscar. No final ele quis te proteger, tão dominado que estava por você. Por alguma razão, ele achava que eu seria sua fraqueza também, seu anjo maldito.

- Ele estava certo, quanto a julgar que eu poderia fraquejar perante você. Você, um dia, eu chamei de irmã – murmurou.

- Por isso trouxe sua puta? – riu sarcástica.

- Talvez! Mas sabe, sua influência sobre mim não é tão forte quanto era para ele, apesar de que poderia haver esse risco sim – sussurrou em resposta. – Apesar de que, pensando bem, vendo no que você se tornou, tenho certeza de que não te julgaria merecedora do meu respeito, muito menos do meu amor. Teria pena, dó, pela sua dor e pela desgraça em que se afundou, mas só isso – confessou, para agonia da sedenerá, o que demonstrou pelos movimentos mais nervosos.

- Isso já foi a um tempo longo demais, mas ainda a importuna muito, não é mesmo? – perguntou Ariel, os modos tranquilos, as mãos longe das espadas. – A saudade ainda te tortura muito?

A sedenerá a examinou, o corpo se erguendo. Então se voltou de vez para Lázarus.

Sem aviso seus cabelos se revolveram, tentando chicotear Lázarus, que se afastou o suficiente para não ser atingido pelo ser.

Num movimento rápido e até violento, Lázarus pegou grande quantidade de cabelos e enrolou em seu braço, trazendo-a de súbito para o seu lado, imobilizando-a, a outra mão aferrada à sua garganta.

A sedenerá, os olhos agora dolorosamente expostos, o olhava, tomada de ódio, a garganta endurecida, sobre a qual Lázarus mantinha a pressão no limite do suportável.

- Você, anjo miserável, não tem qualquer respeito nem pela memória dele – rosnou na voz arranhada e dolorida. – Ele disse que você não se aproximaria, que respeitaria... Mas eu vi o quanto o desprezava, e eu o libertei de você. É por isso que você me perseguiu?

- Quando resolveu se aproveitar e feri-lo, quebrou uma promessa familiar antiga – disse. – Então, você não merece o respeito que dispenso – sussurrou ameaçador soltando o cabelo e tomando o cabo da espada, que começou com terrível lentidão a puxar da bainha. – Como demente você está condenada. Vou cumprir essa condenação. Eu vou te libertar...

Ariel segurou o braço de Lázarus, reconhecendo toda a dor que o tomava, até o ponto de toldar os olhos e não ver a consciência do UM no corpo que se preparava para destruir.

- O que fizer aqui, não fará a ela, mas a você – alertou com suavidade na voz.

Lázarus pensou em ignorá-la, mas viu que as palavras dela tinham a verdade, e por isso tinha que ouvir.

Então a olhou de esguelha. Com um suspirou fundo aceitou a verdade.

Por fim, deu um sorriso pequeno e agradecido.

Deixou a espada escorregar de vez para a bainha, os olhos se prendendo nos olhos da sedenerá.

- Você foi minha irmã, Danatura. Que tenha maior sensibilidade e bom-senso, para que sua triste sorte seja diminuída. Vou cuidar para que sua centelha parta sem dor.

Num movimento seco apertou os dedos e estraçalhou a garganta do ser, que tremeu e amoleceu, abandonado de qualquer força.