O momento sempre vai chegar, como sempre chegou, a grande maioria sem que percebêssemos.
- Mas, e Paã? – Layla mostrava em sua voz toda a dor que tinha no peito pelo pensamento de se separar de sua neta.
- Ela é uma guerreira, um dahrar de imenso poder – Gadhiel tentou tranquilizar. – E ela não é nenhuma criança, meu bem. Ela vai estar bem... Além disso, se acaso ela precisar de nós, ela sabe como fazer para nos chamar. Antes mesmo que termine de falar conosco já estaremos ao seu lado... Não há o que temer, Layla. Se os próprios pais não se preocuparam em deixa-la aqui, por que você deveria ficar preocupada?
- Mas, temos que ir embora mesmo? Podemos ficar por aqui mais algum tempo e...
- Com receio, você? A dêmona que se divertiu invadindo o céu, e que pelo céu foi aceita? – riu, saboreando a confusão na face de sua companheira.
- Sabe que não é receio...
- Sei que não, meu bem. Eu estava brincado.
- Eu sei, eu sei – murmurou um pouco abatida. - Teme que o adensamento da escuridão que está acontecendo aqui me atinja, Gadhiel?
- Também não, você sabe. É que... – e seus olhos se tornaram sonhadores ao se voltarem para os grandes espaços, além do planeta.
Layla observou aquele seu jeito, e seu coração cresceu. Como podia pedir para Gadhiel, para Damâni não voltar para casa? Suspirou com força. Não podia, ainda mais considerando que nada mais tinham ali que não fosse a neta, que tinha em suas mãos o próprio destino.
- O ninho está vazio há bastante tempo já – ela sussurrou. – Zardrara, Taná, Zunda... – relembrou. – E logo Paã também vai embora... Quer saber de uma coisa? Eu também sinto o chamado de casa. Você está certo, meu querido. Ela não é mais uma criança, e sabe se cuidar muito bem. Ela cansa de nos provar isso.
If you encounter this story on Amazon, note that it's taken without permission from the author. Report it.
E, como se tivesse esperando por isso, ao longe a viram surgir na trilha que saia da floresta escura. Ela era uma flor-de-fogo espigada, de cabelos ruivos e o rosto pintalgado de sardinhas. Atravessado ao peito o arco, a aljava completa às costas, uma lança delgada e envelhecida em batalhas em sua mão, e, à cintura, uma de cada lado, suas adagas de fogo. Ela vinha caminhando tranquilamante, ao lado de um queixada de aspecto tranquilo, chamado de Fogueira.
Assim que os viu Paã começou a correr, um sorriso imenso se espraiando pelo seu rosto. Havia uma felicidade contagiante nela assim que trombou com os dois em um longo e amoroso abraço.
- Que bom que me esperaram – falou ao se separar, os olhos brilhantes pregados nos dois.
- Ah, meu amorzinho, e achou mesmo que não estaríamos aqui?
- Confesso que tive meus receios. Afinal, fiquei fora por um tempo longo demais, e da última vez vi seus olhos – falou se dirigindo para Gadhiel. – Eu vi a saudade neles, e soube que não iria demorar para irem embora.
- Se tivéssemos decidido a ir e você não estivesse aqui, iriamos até você – ela sorriu, dando um beliscão carinhoso em Paã.
- Eu sei, trisa, eu sei... Mas, fiquei com receio. Mesmo no meio das batalhas eu me voltava para cá, para saber se ainda estavam aqui.
- Bobinha – Layla a abraçou com imenso carinho.
- Então vão mesmo? – perguntou, enlaçada em Layla, os olhos sondando os olhos de Gadhiel.
- Sim... Nosso tempo por aqui já acabou.
- E quanto à Lázarus, Ariel...
- Já estivemos com eles, e já nos despedimos. Devo avisar que pedimos para eles ficarem de olho em você... – riu, bem sabendo que ela gostava muito deles.
- Sou apaixonada pelos meus tios. E vocês são bem malandros, mas está bem, eu vou cuidar deles – riu também.
Então viu os olhos dos dois passeando saudosos pela majestosa construção que eles haviam levantado do chão.
- Vou cuidar dela para vocês – a flor-de-fogo prometeu entre sorrisos.
- É sua... O mais importante para nós é você, que é a casa de nossos corações – falou Gadhiel beliscando com suavidade sua bochecha.
A menina se soltou de Layla e se grudou no anjo, que desfraldou as asas e, juntamente com Layla, que também havia aberto suas asas negras, ficaram assim embrulhados, a energia se elevando e se enrodilhando nos três.
Então a menina deixou os ombros caírem ao sentir uma brisa mais fria. Ao abrir os olhos viu que só estavam ela e o queixada, parados à frente da portentosa e esguia construção.