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O GRANDE MESTRE ATLANTE

E se você pudesse se ver novamente, no momento em que tomou consciência de que estava vivo e consciente, não como um indivíduo separado, mas como um indivíduo, sendo um com o todo? Que luz maravilhosa éramos, então...

Em silêncio olhei para o monte Atlas, e deixei o ar escapar de súbito do meu peito. Há alguns dias eu vinha sentindo essa urgência, esse espremer do próprio tempo. Eu me sentia responsável por fazer alguma coisa, e isso me agoniava.

A Atlântida não iria durar muito mais, é o que se sentia, é o que se via. Já não havia mais harmonia como antes, e a inteligência parecia ser um item cada vez mais raro. Talvez porque os humanos animais proliferavam como ratos, e estavam alterando a aura do próprio planeta.

E os que sabiam disso, os que viam isso, ficavam se perdendo em conversas longas e infrutíferas.

Eu estava parado no terraço do templo. Estava irritado, nervoso.

Eu não conseguia entender, nem mesmo digerir tudo o que estava acontecendo. Era uma coisa tão óbvia, e por isso era incompreensível que não fosse imediatamente aceito. E tudo se agravava ainda mais por não ter apoio do lugar mais óbvio, onde o apoio deveria ser mais que natural.

Olhei com um certo rancor e desprezo para as diminutas figuras que zanzavam aos pés do imenso templo, onde eu e os meus vivíamos.

O vento ali no alto era mais forte, e minhas vestes e mantos se remexiam nervosos, talvez copiando o que ia na minha alma. Olhei de soslaio para o meu irmão ao meu lado, que parecia alheio observando as pessoas abaixo.

- Eles não entendem. São ignorantes demais – reclamei. - É absurdo que não conseguem ver o que estamos fazendo aqui. Afinal, isso já foi feito bem antes, quando esses homens eram nada mais que macacos pendurados nas árvores. Por acaso reclamam de terem sido baixado ao chão? – ralhei para o vento, incomodado com o silêncio dele.

Com rancor olhei para ele, postado em silêncio à minha esquerda.

- E você fica aí, calado. Sei que não aprova as experiências, mas temos que avançar.

- Você vai mesmo insistir nisso?

- Qual é o problema com você? Temos que avançar.

- Nunca o questionei, sempre o apoiei, mesmo quando transformou aquelas criaturas em nada mais que escravos. E agora, já temos muitas castas deles, especializados em várias coisas. O que quer mais com eles? As experiências que estava fazendo são... são desumanas demais. Nem os animais merecem passar por isso.

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- Olhe bem para eles... – ralhei, a voz dura e irritada, o dedo apontado para baixo. – Ainda são animais, burros, estúpidos, ignorantes. Eles não aprendem. Ensinamos vezes sem conta, e eles ainda não conseguem ir além das coisas mais simples.

- Eles são uma raça jovem – gritou por sua vez. – Tínhamos que ter compaixão, amor. Temos que ser mais razoáveis. Ao meu ver, nós é que estamos nos transformando, nos transformando em animais. Essas experiências genéticas são terríveis; os monstros que surgiram...

- Eles são falhas, que logo são corrigidas...

- Eles são mortos, destruídos, você quer dizer.

- Que seja, que seja – abanei as mãos tomado de nervosismo. A teimosia dele estava me ameaçando tornar irracional. – Efeito colateral. Afinal, o que estamos tentando aqui é criar uma nova raça, uma raça híbrida... Essas perdas são justificáveis....

- Você olhou nos olhos desses efeitos colaterais? – zangou-se definitivamente. – Há dor naqueles olhos, há mágoa, há pedido de clemência. Há até mesmo pedido para que sejam mortos com rapidez, e não dessa forma lenta, para continuar as experiências.

- Que morram, que apodreçam – gritei quase histérico. – Todos têm que aceitar que isso vai acontecer, até que consigamos melhorar essa raça arcaica.

Em resposta ao meu estado emocional o cristal no cimo do templo ficou iridescente, o que foi notado com preocupação pelo meu irmão.

- Isso vai parar aqui – ele falou, a voz fria e determinada.

- O que você disse? – espantei-me. Eu sabia que ele encabeçava um movimento para acabar com as experiências genéticas, mas como não poderia ter esperança de que conversando a gente se entenderia? Mas, aquela voz que eu ouvia me deixou preocupado.

- O que você ouviu. Já conversei com os outros, e a grande maioria dos mestres está de acordo com essa visão. Temos que voltar a origem da Atlântida. Não podemos nos deixar afundar assim, dessa forma, negando a centelha a quem nos aprouver.

- Traição, é isso que você me conta aqui? – gritei possesso e colérico, vendo um grupo de guardas do templo se aproximando, os olhos presos em mim.

- Traição – meu irmão me olhou espantado. – Mas, isso não é sobre você. Você não é a peça importante aqui... Você vê o que está acontecendo com você? Você acha que está apenas lutando pelo que é certo, mas é o seu “certo”, a sua “verdade”, “você”. Isto é loucura.

- Está me chamando de louco, você que bloqueia a evolução desse planeta? É a mim que você chama de louco? – gritei zangado, a energia se acumulando perigosamente em mim.

Meu irmão sentiu a energia subindo ao lado, e seu rosto mostrou toda a preocupação. Quando eu liberasse a energia que estava acumulando, todos que estavam ali simplesmente iriam morrer.

De súbito a guarda avançou contra mim, tentando acreditar que eu ainda estava fraco. Mas eu já tinha energia acumulada, e minha vontade estava fixa. Eles estavam perdidos, e eles sabiam disso.

Eu senti claramente a faca entrando pelo meu peito, fina, quente, suave como um sopro.

Meu coração deu um pulo seco e uma dor excruciante me atingiu. Olhei perplexo para o meu irmão, e ele tinha os olhos mais amáveis que eu já tinha visto.

- Me desculpe, irmão – o ouvi sussurrar ao meu ouvido, enquanto eu ia lentamente tombando em seus braços, - mas você vai ter que recomeçar outra vez. Para você uma outra vida, para se curar. Akindará, irmão...