E se... Tenho que tentar mais uma vez...
Eu sentia minha energia pulsando. Apesar de todos os preparativos, apesar de toda a expectativa que até bem pouco me tomava, agora eu realmente estava apavorado. Eu sentia uma vibração, uma vibração real, e ela tinha uma frequência pesada. Logo eu estava como que num túnel cinzento, largo. Olhei para os lados, e tudo agora se tomava de borrões. As paredes vibravam em alta frequência, e tudo estava tomado por um som grave que parecia encher tudo o que eu era, junto com aquela pressão que eu temia, acabaria por me sufocar.
Segurei minha vontade de gritar e desistir, mesmo sabendo que desistir agora era impossível; a roda já estava em andamento. Minha mente oscilou, apavorada que estava.
Então eu, que agora era o próprio túnel, começou a tremer de uma forma até mesmo perigosa. Tentei me controlar, porque eu sabia que era eu mesmo criando tudo aquilo. Mas, tudo aumentou ainda mais de intensidade e eu temi pela minha insanidade.
Vozes reboavam no meio daquele som absurdo e daquela pressão absurda.
Tomado de um pânico incontrolável eu gritei, os olhos estatelados. Eu sentia lágrimas jorrando dos meus olhos. Olhei apavorado para todos os lados, e gritei novamente, de puro terror.
Me encolhi naquele mundo túnel e fui me fechando, me fechando cada vez mais fortemente para tudo aquilo, criando em meus pensamentos apenas um mantra, um som que ficava repetindo vezes sem conta, me forçando a ficar alheio a tudo aquilo que me sufocava.
Então, subitamente, tudo estava em silêncio. Aguardei mais um pouco de tempo, e percebi que o silêncio se mantinha. Então, bem lentamente, fui abrindo os olhos.
Me assombrei com o que vi: eu estava em um lugar amplo, onde nada mais havia do que aquele piso branco. Não havia paredes, nem teto nem qualquer outra coisa que não fosse aquele piso branco, sem qualquer mácula.
Indeciso me levantei naquele mundo onde até o som não existia, nem sombra que fosse, nem mesmo uma fonte de luz.
Subitamente senti uma presença ao meu lado, e quando me dei conta disso lá estava ele, um senhor com um belo sorriso no rosto. Ele era da minha altura, e vestia uma camiseta verde clara, uma calça jeans e um tênis cinza.
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Sabia que ele era o meu mentor, que havia me acompanhado por muito tempo, me preparando para essa nova encarnação.
- Me desculpe – sussurrei envergonhado com minha fraqueza. – Achei que seria mais fácil.
- Você passou por um tremendo trauma em sua vida anterior. Uma guerra como essa foi um evento muito intenso, nós sabemos. E isso sem contar que você já vem numa sequência de quatro reencarnações muito duras.
- Sinto tanto medo... – gemi.
- É compreensível – ele disse. – Mas, você tem que se esforçar, meu querido amigo. Essa vida que programamos juntos vai lhe dar um pouco de paz, desta vez. Quer dizer, só um pouco – ele sorriu, o que foi um pouco estranho, porque ele sempre se mostrou sério e focado.
- Eu sei... – sussurrei. – Mas, esse túnel cinza...
- Você já tem muita familiaridade com ele. afinal, você já passou de mil reencarnações nesse planeta. Não há como se acostumar com a terrível sensação de nascer, mas é a única forma.
- Me lembro de alguns lugares onde não há essa tortura terrível para nascer.
- Eu sei. Mas esses lugares não são capazes de proporcionar uma aventura como esse. Tudo vai dar certo, apenas deixe ir, não se fixe no medo.
- Se eu tivesse nascido agora há pouco...
- Provavelmente desenvolveria uma doença, e os planos teriam que ser alterados.
- Altismo?
- Provável. Ou demência aguda também... Mas, independentemente de como estaria sua condição nessa encarnação, você não iria atingir os objetivos que se propôs. Se quiser insistir, que assim seja. Planos podem ser alterados.
Suspirei, passando rapidamente em revista minha encarnações anteriores: um portador de incapacidade mental que foi abusado até ser assassinado, um menino que foi torturado de uma forma terrível pela igreja na inquisição para assumir um erro de um padre local; uma mulher acusada de bruxaria e queimada em uma fogueira em Salém e um cristão cátaro torturado como exemplo na região de Langdoc. E agora, o que poderia acontecer? Temi pelo pior.
- Não quero desistir – gemi. – Vou continuar.
- Apenas se lembre do porque está nessa jornada, e tudo vai ficar bem. Tudo é um jogo, e você é um jogador. Você não deve resistir, mas apenas observar e deixar ir. Se você prender sua atenção a algo, ele encherá seu mundo, porque você estará criando.
- Está bem, está bem. Eu...
Eu não havia terminado minha frase e lá estava eu novamente, no túnel que vibrava e onde eu me sentia sufocado.
Suspirei fundo, me lembrando de algo, sutil, ao mesmo tempo que de imenso poder: o tempo ali era uma construção minha. Eu poderia ficar me torturando naquele túnel por largo tempo, ou poderia fazer com que tivesse a brevidade do pulso do ponteiro de segundos. Se eu resistisse o tempo se alongaria; mas se eu...
Relaxei naquele mundo terrível, e passei a observar cada aspecto daquilo em que estava imerso como a vibração, as cores, os sons, as pressões em ondas. Então, sem me aperceber disso, me deixei levar e..., de um modo súbito, a luz se fez.
Eu fui puxado e examinado. Cortaram a ligação que eu tinha, e comecei rapidamente a sufocar. Eu precisava respirar, eu sabia, só não sabia como, porque ainda não dominava o modo como teria que fazer. A dor no peito e na garganta se intensificaram, e eu temi pelo pior. Ter chegado até ali e deixar tudo acabar assim? O pânico começou a ensaiar suas garras em mim, até que algo seco e dolorido me atingiu, e eu chorei como acho que nunca tinha chorado antes.