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NOVO MUNDO - ano 01 e7

Eu deveria ter desconfiado da voz que se escondia dentro do vento.

Lázarus ficou em silêncio, observando o mundo lavado. Havia sinais reconhecíveis do velho mundo em todas as partes, mas o mundo era definitivamente diferente. Par Adenai se fora, como a casa Azul e as outras construções. Até mesma a muralha estava de alguma forma diferente: ela parecia ter se contorcido e encorpado mais para o leste. O mesmo acontecera com as colinas e montes. Tudo estava diferente, irreconhecível, até mesmo em sua essência.

Seu coração doeu ao, finalmente, tomar coragem para enxergar a terra. Nada mais das árvores portentosas que cantavam ao vento; nada mais das campinas verdejantes e ondulantes, com as quais as brisas brincavam, nada mais do número incrível de animais que viviam sobre a terra. Havia lama, e dela subia um cheiro ruim de carne sendo decomposta e material orgânico se desfazendo.

Voltou então seus olhos para os oceanos. Claramente via seres se movendo neles. Então por algum tempo ficou zanzando por eles, passeando entre as imensas cordilheiras submarinas, tocando em seus vulcões e falhas, descendo em suas fossas mais profundas, vendo a vida ali, vendo a esperança ali. Via que muito seres conseguiram sobreviver. Eles sofreram também, é logico, porque a composição e as correntes oceânicas foram alteradas, mas se recuperariam bem mais depressa que a terra.

Inspirou lenta e demoradamente. Num impulso saiu do oceano e ficou no céu, flutuando pensativo, os olhos postos nas costas recuadas e lavadas.

Lentamente levantou os olhos, não se permitindo cair, nem ao menos ficar abatido ou triste.

Lá estava Gaia, a centelha, pulsando forte; lá estava a linha de tempo se refazendo rapidamente, como lá estavam anjos e demônios e nefelins e dahrars e, ... toda sorte de vida que, apesar de observarem o novo mundo com enorme surpresa, continuavam a seguir em frente.

Logo tudo estaria bem, ouvia ressoando no ar, se esticando pelas mentes, ligando uma a uma, ente que fosse.

Num impulso se encaminhou para o norte, no topo do mundo, e depois para o sul, examinando as novas paisagens.

Com surpresa viu o quão dramático tinha sido a recomposição das camadas de gelo em ambos os polos do planeta. Elas agora eram bem mais portentosas. As montanhas que antes se avistavam no sul, principalmente em Nardária, estavam cobertas por centenas de metros de gelo, e a passagem ao norte fora totalmente interrompida. Não fosse ainda mais dramático toda essa nova capa de gelo, bem mais grossa que a anterior, deixara ainda mais terras à mostra, quase ligando continentes nas terras de zona mais temperada ou trópica.

Mas havia algo mais, que esfriou um pouco seu coração

Lázarus inspirou com cuidado, escutando o vento, os pensamentos distantes. Havia um silêncio no mundo. Um pássaro ao longe, um urro solitário que se afastava nas montanhas quase vazias; e nada mais. Silêncio e mais silêncio. As florestas ainda demorariam um pouco para se recomporem, via com tristeza. Porém, doía ver a quantidade de seres que haviam perecido. Toda aquela azafama e febre que havia antes se fora, quando a grande maioria de seres fora retirada.

Então se voltou para a muralha Espinha do Dragão. Ela ainda estava lá, e parecia estar mais agasalhada em seu manto branco. A seu ver ela parecia não ter sido tocada com muita severidade, talvez porque tenha ficado menos tempo sob as águas, não tão lamacentas quanto as que encheram os vales e as planícies nas terras mais baixas.

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Então procurou, e encontrou. Estava tudo ali, quase como fora deixado.

A cidade que toca o céu, ao lado do lago e no alto da espinha ainda estava lá, com alguns poucos habitantes nela. Mas também lá estavam os demônios em sua guarda, ciosos de sua posse. Logo os habitantes acabarão mortos e só restarão os demônios, que se verão famintos e sem alimentos, sorriu, imaginando o que poderia acontecer a partir dali.

Deu de ombros sobre a cova que cavavam para si mesmos.

- Mundo novo... – suspirou. – Uma nova aventura – sorriu para si mesmo.

> Par Adenai se foi – repetiu novamente.

E se fora juntamente com os maravilhosos dragões, que por vontade própria se despediram dessa dimensão, apesar de não terem se despedido do mundo. Não conseguia ver com clareza além da quarta dimensão, mas os anjos haviam lhe contado que eles estavam, em sua grande maioria, espalhados nas dimensões acima.

Com cuidado e respeito sondou as linhas de tempo e os espaços, e inspirou um pouco desanimado. Não conseguia ver claramente os anjos como antes via. Ao invés disso via naves no céu e na órbita do planeta. No começo eram poucas, mas lá estavam elas. Reconheceu poucas delas, como as dos pleiadianos e algumas outras de orion. Mas também viu os terríveis drakos e algumas de outras civilizações escuras.

Os escuros haviam chegado mais sedentos, reconheceu com pesar.

Devagar foi descendo em um vale. Quarenta dias sob as águas deixaram uma grossa camada de lama naquele vale que se formara onde antes só havia uma pequena e altaneira cadeia de montanhas. Agora havia um vale apertado e escuro, que deveria ficar ainda mais penumbroso quando as florestas se erguessem ali.

Havia um vento constante e sibilante varrendo aquele lugar, triste, como se procurasse incessantemente por algo. Era um sentimento com um intenso cheiro de saudade. Sorriu ao sentir que Ariel se aproximava. Ficou em silêncio, perdido em seus pensamentos. Ariel baixou ao seu lado, os olhos cismando ao longo do vale.

- Que destruição – Ariel lamentou.

- Oportunidades, Ariel – falou quase que em um sussurro. – Par Adenai pode ser refeita, as cidades podem ser refeitas, a Casa Azul pode ser refeita. Os homens, nefelins, dahrars e pessoas vão reencarnar, e poderão ser lembrados. Mas os dragões... Eles simplesmente se foram. Já sinto muitas saudades – confessou com um sorriso abatido.

- Como você disse, meu amor, oportunidades. Oportunidades nesse novo mundo. Aqui já não há tantos poderes, você viu? Os anjos já não podem mais ser vistos como antigamente.

- Já tinha percebido isso – sorriu. – Oportunidades e riscos.

- Sim – ela concordou, os olhos sondando as altas montanhas. – Quando são poucos os seres de poder, a arrogância é bem diminuída.

Lázarus voltou o rosto para examiná-la. Um frio percorreu todo seu corpo. Nesse momento sentia ainda mais fortemente que algo se aproximava, algo que não podia precisar. Como esse mundo poderia ter somente alguns seres de alto poder vivendo ali? Como poderia ser possível que isso fosse permitido? – se perguntou com preocupação.

Devagar sondou as linhas do tempo, o que lhe trouxe algum conforto.

- Apesar de ser verdade, ela não é bem assim, minha querida. Ainda há muitas pessoas de poder, e nefelins e dahrars. A luz brilha ainda aqui, e é forte.

- Mas a escuridão está lá, acantonada e à espreita sobre a Espinha do Dragão. O poder deles é muito grande, e novamente podem corromper toda a vida que foi preservada.

- Eles estão isolados e impedidos de descer ou subir além do planeta.

- Mas estão lá. E ainda há muitos demônios vagando pela terra, bem mais que anjos, que parecem mais arredios agora.

- Isso é verdade.

Ariel se esticou, tateando com cuidado os caminhos para a cordilheira, e notou um silêncio estranho. Com cuidado sondou um pouco mais profundamente.

- Você os observou com cuidado? O poder imenso que tinham parece ter diminuído como que por magia. É tão estranho que dá para sentir que o medo deles aumentou de maneira absurda.

Lázarus sentiu um impacto em sua alma. Havia algo ali, naquelas palavras. Não podia precisar com certeza o que seria, mas sentia que era algo importante.

Sem poder pensar com clareza o que seria aquele sentimento, acabou deixando de lado.

- Tempo ao tempo, que parece ser o senhor desse novo mundo nessa dimensão – sussurrou.

Devagar se elevaram, deixando o vale para trás. Sem pressa os dois sobrevoaram antigos lugares, agora irreconhecíveis, até encontrarem a pequena aldeia que os seus amigos construíam, não muito distante de um largo rio, uns vinte metros acima de sua estreita calha.