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MEMÓRIAS DE UM DEUS - VOL 02 (Fantasia - português)
DESCIDA DE SOL COMO BELLA - 92.715 E8

DESCIDA DE SOL COMO BELLA - 92.715 E8

Não sei porquê, mas precisamos nos preparar para o que está vindo contra nós.

I

- Ah, vamos lá, pessoal, gostaria que fossem vocês os meus pais. Vocês dois, descendo juntos, vão conseguir se encontrar. Vocês vão ajudar nisso, não vão Lázarus?

- Claro que vamos – sorriu Ariel tomando o pulso de Sol com carinho, os olhos passeando pelos rostos de Mulo e Valentina.

Valentina observou bem os olhos luminosos da amiga, e se imaginou em uma busca desenfreada por Mulo. E sua amiga já descera inúmeras vezes, desde a guerra dosvivos. Em algumas das vezes tivera sucesso em encontrar Adanu, mas o tempo estava errado. Ou ela era criança demais ou velha demais quando se encontravam. Era muito complicado sincronizar vidas. Mas, finalmente, tinha certeza de que agora haviam conseguido. O tempo era algo difícil com que se acostumar quando se está descido, ainda mais com um pesado véu sobre sua alma.

Adanu se tornara um chefe muito renomado e respeitado dos danatuás, e estava quase sempre na região da pedra riscada, no centro leste de Mércia, de lá se ausentando em períodos muito curtos. As vilas e habitações no entorno eram inúmeras, e a região era até bem pacífica, o que iria facilitar muito a sincronização. Além disso, era fácil ver que uma conjunção para que os veladores começassem a descer ali começava a se reforçar.

Mulo suspirou, um sorriso belo no rosto.

- Tudo por você, meu amorzinho – concordou com um grande sorriso, os olhos carinhosos presos nos de Sol. – Será uma honra nós descermos e sermos seus pais.

- Vou ser uma mãe muito severa, já vou avisando – Valentina declarou, lhe dando um pequeno beliscão.

- E eu não sei se vou querer deixar minha filhinha ficar com o brutamontes do Adanu – sorriu com deboche.

Sol não se aguentou e abraçou fortemente os dois.

- Obrigada, obrigada...

Ao se separar tinha os olhos marejados e felizes, as mãos se esfregando alegres uma na outra.

E foi assim que Mulo e Valentina desceram como poderosos ellos, que logo nos primeiros dias se tornaram amigos que rapidamente se firmaram como um casal. Não demorou muito e logo trouxeram à vida no planeta uma manira-ellos, que a todos encantava.

- Bella, esse será o nome dela – falou Valiá, a mãe, sob os olhos amorosos do pai.

Lázarus segurou com carinho a mão de Ariel, totalmente perdida na contemplação dos amigos. Então sondou um lugar ali perto, uma dor gostosa correndo no coração. Lázarus notou seus olhos felizes e seguiu sua atenção, não podendo deixar de também se sentir feliz.

Adanu, o grande general de guerra, parecia ter mudado nos últimos dias, se mostrando em constante expectativa sempre sondando os horizontes, como se tivesse pressentido a aproximação de algo que há muito lhe fazia falta.

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- É, ainda não ficou perfeito – Ariel parou, examinando a linha de tempo dos dois.

- É difícil, meu bem. Ele já participou de inúmeras batalhas, e tem muitas cicatrizes, não só no corpo. E ela está como sempre foi, com esse sentimento de liberdade e força. Os dois vão se estranhar muito, mas não vão se matar nesses encontros ..., eu acho. Bem, se isso acontecer, a gente tenta de novo... – sorriu.

Lázarus parou, cismando sob os olhos avaliadores de Ariel.

> Vamos cuidar para que não se matem[1], está bem? – exigiu com uma grande risada. – Isso me lembra algo – falou, levando uma cotovelada de Ariel.

II

- Você não sabe o que fala, menina – rebateu o grande curupira com cara de poucos amigos. - A ignorância, quase que sempre, é um fardo que a pessoa não vê que carrega, apesar de sentir no pelo.

A manira-ellos se empertigou, o ódio transpirando por todos os seus poros.

- Só porque participou da guerra se sente tão importante? Pois eu lhe digo, vira-pés, que eu estaria em meu elemento ali. Sou guerreira, sou filha das matas e da guerra. Nas guerras forjo meu espírito e ... O que foi? – perguntou fazendo um muxoxo de desagrado ao ver que ele a examinava com um pouco de desprezo.

Adanu a examinou com cuidado. Não podia esconder que era uma manira maravilhosa e com um gênio que lhe agradava, por ser independente e determinada. Mas ela era arrogante, e muito nova ainda. Ela teria o que? Talvez uns setenta anos, se muito – avaliou.

- Balelas de uma criança cheio de ego.

- Sei o meu valor – falou a garota, a lança vindo alguns milímetros para o lado enquanto as mãos se fechavam mais fortemente sobre ela.

Adanu bufou exasperado, baixando os olhos para a grama aos pés de FuraTerra. Então devagar desceu do amigo e se plantou à frente da menina impertinente que já o vinha incomodando há algum tempo. Não sabia porque, mas eles acabavam sempre se esbarrando, por mais cuidado que tivesse.

Devagar olhou para ela e, contrangido, novamente se perdeu pensando o quanto ela era magnífica. Depressa abanou a cabeça, vendo os modos tensos dela, e a arrogância que tanto o enervava.

- Por que não se vai embora? – perguntou ganhando ainda mais altura à sua frente, os cabelos se tornando um pouco mais avermelhados, o que fez surgir em Bella um sorriso de vitória.

- Então aqui está. Finalmente consegui te fazer ficar bravo de novo, héim?

- Já me viu bravo outras vezes, e sabe como isso vai terminar...

- Sei, outra surra para você, algumas marquinhas para mim – riu afastando levemente as pernas e flexionando os joelhos suavemente, enquanto descia a ponta da lança em mira para o seu coração.

III

- Outra vez? – riu Lázarus de olho nos dois, que se batiam logo abaixo.

- Outra – falou Ariel, absorta na batalha dos dois. – Eles não querem se matar, mas apenas se ferir. Uma brincadeira?

- Ajuste, eu acho. E Mulo e Valentina?

- Estão mais no norte. Sol acabou descendo sozinha a trilha enquanto caçava.

- Isso é o que ela pensa, não é mesmo? – riu mais uma vez.

Ariel se voltou para Lázarus, um sorriso malandro de descoberta preso no rosto.

- Você???

- Um sussurro ali, um obstáculo noutro lugar, um desvio apontado, uma caça fugindo para algum lugar ... Um toque na vontade de ArrancaTerra...

- Mas você não tem jeito, héim? – riu se abraçando nele. Felizes, os dois se deixaram a observar o curupira e a manira-ellos batalhando com fingida ferocidade. - Fico imaginando como Miguel e Emanuel, e Derfla e os outros deviam rir, vendo quando fomos nós.

- Ah, eles devem realmente terem se divertido a valer – Lázarus concordou. - Uiiii, essa doeu – a face dele se contraiu ao ver o ferimento profundo perto da primeira costela, que Bella acabara de infringir a Adanu com uma faca que, agilmente, sacara da coxa, no exato momento em que ele a atingira com uma palmada de fogo.

- Essa marca não vai desaparecer – Ariel suspirou, ao ver que os dois se afastavam e ficavam se estudando.

- Olha, você viu, Lázarus? – Ariel apontou para dois, um sorriso maravilhado no rosto. – A preocupação deles, temendo ter ferido demais o outro... Não é lindo isso? Está acontecendo...

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[1] O encontro de Bella e Adanu não foi fácil, tendo os dois se estranhado perigosamente, como foi o caso, bem mais tarde, de Allenda e Uivo, como está descrito na série “Os danatuás”, do mesmo autor. Mas, felizmente, os dois conseguiram se acertar, dessa união surgindo a bela menina Allenda.