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DESPEDIDA

Para trás sempre deixamos os que amamos nessa lida solitária. Ao adormecer, ao sentirmos medo, ao nos sentirmos alegres, sempre nos descobriremos sós, tal como no dia em que estivermos para morrer. Solidão, é o que resta, ao final.

Adanu se voltou na direção do sol e, sob um silêncio extremamente pesado, levantou os braços e soltou um grito profundo e longo, cheio de saudades e dor, que foi ecoando por dentro da floresta. Vozes de todos que estavam nos campos aos pés dos montes foram se juntando naquele grito que trazia em si despedida, esperança e fé. Logo encorpou, se tornando como que um rufar, como um trovão que fazia vibrar a própria terra; todos os que estavam ali sentiram seus corpos se arrepiarem, numa onda de poder que varria e tomava todo o ar.

Repentinamente, sem mais qualquer palavra, Adanu montou no queixada. A comitiva, solenemente, sob as explosões dos gritos, foi para borda da floresta das sombras.

Adanu sentiu um terrível peso no coração. Para trás ficavam os amigos, os dias dos quais se podia dizer com alguma certeza de como seriam os seguintes; para trás os dias de sol; para trás os votos de sucesso e sorte. Morreriam todos na distância que estava para colocar entre eles e esses dias.

Com alguma dificuldade romperam o mato alto que cercava a borda da mata em direção ao início da trilha do Tatu, anunciada por duas árvores imensas e encorpadas que uniam seus galhos bem no alto, como um vivo portal. Assim que finalmente atravessaram o mato e pisaram na borda da floresta, imenso paredão coruscado e vivo à frente, Adanu parou o queixada sob a arcada da trilha que penetrava as sombras e sorriu. Nos últimos anos fizera dali seu lugar, onde se mantinha em silêncio, parado, sondando as profundezas da floresta, escutando seus sons e os sons dos que viviam ali dentro. E agora ali estava ele, no verdadeiro momento que sempre soube que teria. Já o vira muitas vezes e, com alguma certeza, sabia o que poderia estar lá dentro, a partir do momento que pedisse ao seu queixada para se afundar naquelas sombras.

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Ali estavam as guerras e as pessoas ruins, e os demônios e,... gestos nobres e poderosos, companheiros e senhores de dias incríveis; ali dentro estaria a perdição e a salvação e, tinha certeza absoluta, melhores dias para os homens que deles seriam senhores, e para as pessoas, e animais e nefelins. Dias melhores, sempre, porque mesmo que demore, nada é feito para regredir.

Vencido pela emoção virou-se para trás, para o alarido quase doloroso e espantado de despedida dos que ficavam, para os rostos tristes e assustados, para os homens de faces abobalhadas, para os entes de olhos estreitos e luminosos como a lua, para os que sabiam estarem perdendo o mundo que conheciam nesse espaço de tempo cada vez mais curto. Por longo tempo esse dia foi esperado, mas agora que viera ficavam indecisos, procurando cada migalha do tempo velho antes de se deixarem engolfar pelo turbilhão terrível.

Seu peito doeu ao compartilhar tamanha perda.

Ante tanto sentimento de perda as cores alegres com que os humanos haviam se vestido e decorado os postes e árvores mais próximas pareciam despropositadas.

De relance passou os olhos pela comitiva, e sentiu uma dor fina no peito ao seguir os olhos da filha, que procurava no meio da multidão ao longe por alguém especial, mesmo que assim fosse pela última vez. E a viu baixar os olhos, uma nuvem triste pesando nos olhos.

- Despedidas, apenas despedidas - sussurrou para o vento.

Com firmeza, lentamente levantou o braço e o abanou em despedida.

Um grito único, feito de tudo que conhecia e amava ecoou no ar. A comitiva levantou as armas em despedida. Adanu cerimoniosamente afagou o queixada e falou-lhe baixinho:

- Tudo é temporário, grande amigo.

Olhos fixos para frente avançaram na trilha, sob explosão de gritos, para dentro da escuridão da floresta.