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COOPTADA

Já tentei sonhar em não ser arma, mas sei que esse é um desejo superficial.

Éfrera, antes de entrar no “palácio”, ficou se perguntando o que realmente estava acontecendo. A queda parecia se acentuar cada vez mais. Ainda podia se lembrar de Netradir Vall, a cidade branca dos anjos, na sexta dimensão. Era até cômico ver aquele arremedo de palácio. Era claro que HasEdrel, que se autodenominará rei dos caídos, a houvesse mandar construir, de acordo com suas lembranças.

Podia ver que grande atenção fora dada às cachoeiras e pontes, e córregos que desciam das montanhas e aos jardins mais além, aos pés dos vários andares escalonados.

Mas, não pode deixar de ter pena deles, e de si mesma.

Então, decidida, avançou pelas escadarias feitas para as pessoas e homens. Podia voar e chegar rapidamente ao algo, mas era bom dar-se esse tempo para ir mascando seus pensamentos.

Assim que sua entrada no salão foi autorizada, avançou com lentidão pelo corredor largo. Então o viu, sentado, empoado, como se satisfeito com sua própria importância.

No momento em que a viu ele se levantou, descendo os poucos degraus até parar à sua frente.

- Belo palácio – cumprimentou, tentando não parecer sarcástica. – Me lembra um outro palácio, longe daqui.

- E não lembra? Gastei muito trabalho neste aqui – falou, como se ele o tivesse levantado com suas próprias mãos.

Então ficou em silencio, examinado a face da demiana.

HasDrael a examinou com interesse, avaliando seus impulsos. Sem qualquer aviso sacou a espada e atacou, a espada descendo verticalmente contra a cabeça de Éfrera, que esquivou ficando de frente para a espada que passou rente ao seu corpo. Quando a pressão de descida da espada diminui ela chutou sua face, imprimindo uma terrível velocidade, girando-a para deixar a lâmina contra o portador. HasDrael, pego de surpresa, a soltou e pulou para o lado, um sorriso satisfeito no rosto enquanto sacava a adaga e partia para cima da demiana, que já embainhara a espada e se mostrava com as duas adagas em ação, descrevendo golpes e contragolpes em velocidade alucinante, que HasDrael estudava enquanto se desvencilhava deles.

Então, em dado momento, se afastou de súbito, guardando a própria adaga, o sorriso aprovador no rosto.

- Você, realmente, é tudo o que dizem. Precisamos de você para uma missão especial. Sua ligação com DasEdrel será impedimento?

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- Eu e DasEdrel não estamos presos um no outro. Nada me impede.

- Sei que vocês ficam muito tempo longe um do outro. Ele te deixou, não é mesmo? De novo abandonada por causa desses bonecos.

Éfrera ficou em silêncio. Responder ao anjo seria dar poder a ele, e não gostava muito de poderar alguém contra si mesma.

- Qual a missão?

- Já ouviu falar de Mercator?

- Dizem que ele é o causador da queda – falou.

- Sim, o próprio. Ter torturado e matado o arcanjo endureceu o coração de Tupã.

- Qual a missão com Mercator?

- Matá-lo...

- Vocês já tentaram isso inúmeras vezes.

- Pois então. Essa será mais uma tentativa, e devo dizer, uma de nossas melhores. Você é uma guerreira fenomenal. Vi que poderia ter me vencido facilmente.

- Por que o desejam morto? Vingança pela nossa queda?

- Também, mas não só isso. Nos preocupa a atenção que os anjos estão dando a ele. Tememos que ele se volte contra nós. Ele ainda não decidiu o que vai ser, e isso pode não ser bom.

- Mas – titubeou espantada, - ele é um dos mais terríveis, talvez o mais terrível dos demônios que já existiu. Como podem pensar que ele pode... Isso quer dizer que estamos juntos com os demônios? – assustou-se.

- Não estamos, nem nunca estaremos associados aos demônios. O que acontece é que os anjos nos colocam no mesmo saco, vigilantes e demônios. Achamos que Mercator pode estar sendo preparado para ser lançado contra nós – HasDrael esclareceu.

- Entendo – falou lentamente, após pensar longamente, vendo coerência nas palavras do vigilante. – E sabem onde posso encontrá-lo?

- Isso será fácil, demiana. Apenas tome cuidado, pois ele já matou muitos de nós, e dos demônios também.

- Dos anjos não?

- Tirando o arcanjo, parece que não. Aí está mais uma prova, não?

- Ele conta com alguma proteção?

- Não, ao que me consta.

- Afinal, o que sabem dele, com certeza?

HasDrael sorriu, sentando-se em sua cadeira de alto espaldar.

Éfrera a examinou rapidamente e com desdém. Uma tosca e tímida representação de um trono. Teve pena de HasDrael.

- Ele é um louco. Fique atenta a ele, porque ele pode atacar sem qualquer aviso. E o poder dele é muito grande.

Éfrera aguardou um pouco, os olhos pousados no semblante distante do vigilante.

- Só isso? Isso que me contou já é de conhecimento de todos.

- Sei que parece muito pouco, mas é o que realmente temos dele. Afinal, ele tem se mostrado arredio a qualquer aproximação desde que retornou para cá, na última era.

- Que benefício a morte dele trará para nós, para os caídos?

- Acho que apenas um afago no ego e saber que o futuro não nos colocará um terrível inimigo à frente.

- Entendo... – falou, o semblante pensativo, avaliando possibilidades.

- Aceitará a missão? – HasDrael a observava com cuidado.

- Vou pensar! Assim que eu decidir você saberá – falou, virando-se para se afastar.

- Sei... Espero que aceite, Éfrera... O apoio dos vigilantes é muito importante, você não concorda?

Éfrera parou, a cabeça baixa examinando o chão de ladrilhos queimados. De súbito teve vontade de rir. Ser ameaçada era algo estranho, mesmo que fosse comum que ouvisse todos os dias após a queda.

- Você saberá. E que bom que acha a proteção dos vigilantes tão importante. Quem sabe quando se precisará dela, não é? – sorriu retomando seu caminho. Quando saiu da grande tenda e sentiu o vento no rosto suspirou satisfeita.

- Acho que estou me acostumando com esse planeta fedido – sorriu.