O tempo havia se tornado uma entidade cruel, esticando-se e se retorcendo ao redor de Lucien, enquanto ele lutava para manter a consciência. Seu corpo tremia, febril, exausto. O cheiro de ferro e suor impregnava o ar sufocante da sala de tortura, misturando-se ao leve odor de couro envelhecido e madeira apodrecida.
Ele não sabia quantas horas tinham se passado. Talvez fossem apenas minutos, ou talvez uma eternidade. Tudo que sabia era a dor. Ela o consumia, queimava, latejava em cada centímetro de sua pele.
O Homem Sem Nome, por sua vez, não parecia minimamente afetado pelo cansaço. Ele permanecia ali, frio e meticuloso, testando o limite da resistência de Lucien. Com cada golpe, com cada corte cuidadoso feito pela lâmina afiada que agora segurava, ele parecia estudar Lucien como um cientista analisa um experimento.
Lucien arfava, a respiração irregular. Suas mãos estavam dormentes devido às cordas apertadas ao redor de seus pulsos. Seus dedos tremiam, cobertos pelo próprio sangue.
— Você ainda não me deu o que eu quero, garoto — disse o Homem Sem Nome, limpando a lâmina ensanguentada em um pano. Sua voz era serena, como se estivessem apenas conversando casualmente. — Mas sabe o que mais? Acho que você nunca vai falar.
Lucien sentiu o coração disparar. Ele vai me matar?
O Homem Sem Nome sorriu, como se tivesse lido seus pensamentos.
— Não, Lucien… Não vou te matar.
Ele se inclinou, seu rosto se aproximando do de Lucien. Os olhos frios e penetrantes o analisaram por um longo momento.
— Pelo menos, não ainda.
Lucien cerrou os dentes, tentando não demonstrar medo, mas era impossível esconder o tremor involuntário em seu corpo. Ele sabia que qualquer resposta seria inútil. Já havia gritado, negado, implorado — nada havia mudado a convicção do torturador. O maldito artefato, a maldita bússola de ouro, continuava a dizer que ele possuía a Lágrima de Aether.
Ele não sabia o que fazer.
O Homem Sem Nome se endireitou, suspirando como se estivesse entediado.
— Você me forçou a tomar medidas mais drásticas.
Lucien mal teve tempo de reagir antes de vê-lo erguer a mão e estalar os dedos.
A porta da sala de tortura se abriu.
O assassino entrou.
Aquela mesma presença aterradora, fria e mortal. Ele caminhou lentamente para dentro, sua postura tranquila, os olhos vazios como um poço sem fundo. Cada movimento dele era meticulosamente calculado, como um felino se aproximando da presa.
Lucien sentiu um arrepio subir por sua espinha.
O Homem Sem Nome virou-se para ele com um sorriso satisfeito.
— Já que você insiste em não me dar o que eu quero… talvez sua irmãzinha possa ser mais cooperativa.
O mundo de Lucien parou.
— NÃO! — ele se debateu contra as cordas, sentindo a pele já machucada se abrir ainda mais. — VOCÊ NÃO VAI TOCÁ-LA!
O Homem Sem Nome nem sequer piscou.
— Matei pais, irmãos, filhos, maridos e esposas para conseguir o que quero, garoto. Você acha que eu teria alguma hesitação em usar uma garotinha para atingir meu objetivo?
O ódio subiu pela garganta de Lucien como bile. Seus punhos cerrados tremiam, as unhas cravadas na própria pele.
O Homem Sem Nome voltou-se para o assassino.
— Vá até a cidade. Encontre a irmã dele e a traga para mim. Viva.
Lucien sentiu o estômago revirar. Ele não pode… Ele não pode fazer isso!
— VOCÊ NÃO VAI TOCAR NELA!
Sua voz rasgou o ar como um grito desesperado. Ele puxou as cordas, lutando contra elas com todas as forças que restavam. Sua pele já estava em carne viva, mas ele não ligava. O pânico nublava sua mente, transformando seu corpo em um mar de desespero e adrenalina.
O assassino olhou para o Homem Sem Nome e assentiu. Então, sem pressa, ele se virou e começou a caminhar para fora.
Lucien se debateu ainda mais.
— EU VOU MATAR VOCÊ! VOCÊ OUVIU? EU VOU TE MATAR, DESGRAÇADO!
Seu corpo tremia. Sua garganta queimava. O medo, a raiva, a impotência — tudo se misturava dentro dele como uma tempestade violenta.
Mas então, o assassino parou.
Ele virou a cabeça levemente para o lado.
— …Há um problema.
O Homem Sem Nome franziu a testa.
— O que foi?
O assassino se virou completamente para encará-lo.
— A cidade está um caos. Os cavaleiros reais estão revistando casas, interrogando pessoas. Todos estão à procura de um garoto de cabelo negro e magricela.
Lucien congelou. Os cavaleiros… Eles ainda estavam atrás dele?
O Homem Sem Nome suspirou.
— E isso significa que você não pode fazer seu trabalho?
— Significa que qualquer movimento pode nos expor. Se eu tentar sequestrar a garota agora, chamarei mais atenção do que o necessário.
Lucien sentiu uma fração de esperança surgir em meio ao desespero.
Lucy estava segura… por enquanto.
O Homem Sem Nome ficou em silêncio por alguns segundos.
Então, ele soltou um riso seco.
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— Bem, parece que você tem sorte, Lucien.
Lucien não respondeu. Apenas respirou pesadamente, tentando se recompor. Seu corpo doía. Sua mente estava um caos. Ele sabia que aquilo não terminaria ali.
Apenas havia ganhado tempo.
O Homem Sem Nome aproximou-se novamente e segurou o queixo de Lucien, forçando-o a encará-lo.
— Mas não se engane. Ela não está fora do meu alcance.
Ele apertou um pouco mais, os olhos frios perfurando os de Lucien.
— Se você não me der o que quero, cedo ou tarde eu irei até ela. Não importa quanto tempo demore.
Lucien trincou os dentes, sentindo as palavras cravarem-se em seu peito como lâminas afiadas.
O Homem Sem Nome soltou seu rosto e se afastou, voltando-se para o assassino.
— Fique de olho nos movimentos dos cavaleiros. Assim que a situação se acalmar, traga a garota para mim.
Lucien não disse nada. Não adiantava mais gritar, não adiantava implorar.
Ele apenas sentia o desespero e a raiva queimando dentro dele.
Ele estava preso. Lucy estava em perigo.
E o pior de tudo...
Ele ainda não sabia onde estava a maldita Lágrima de Aether.
Lucien sentia a cabeça girar. O desespero pulsava em seu peito, fazendo seu coração bater forte demais, rápido demais. O medo pela irmã, a dor no corpo, o cheiro de sangue e suor impregnado no ar sufocante daquela sala—tudo era uma grande espiral de agonia e confusão.
Mas, acima de tudo, havia algo que não saía de sua cabeça.
A maldita bússola apontava para ele.
Isso não fazia sentido. Ele não estava com a Lágrima de Aether. Ele viu quando ela desapareceu. Ele falhou em roubá-la. Então como aquela maldita bússola podia continuar apontando para ele?
Ela estava errada?
Lucien sentiu um breve lampejo de esperança com esse pensamento. Se fosse isso, então o Homem Sem Nome estava baseando tudo em mentira, em uma informação incorreta. Mas… não. Não era tão simples assim.
Aquele homem não parecia ser o tipo de pessoa que confiaria cegamente em algo falho. E, se a bússola fosse errática ou quebrada, ele já teria percebido.
Então por quê?
Lucien apertou os olhos, forçando-se a pensar. Sua vida estava em risco. A vida da sua irmã estava em risco. Ele precisava entender o que estava acontecendo.
Seus dedos ensanguentados tremeram, e ele sentiu o estômago revirar. Ele precisava de respostas.
— Você sabe tanto sobre essa coisa… — sua voz saiu rouca, fraca, quase um sussurro. — Então me diga… o que realmente é a Lágrima de Aether?
O Homem Sem Nome, que estava tranquilamente limpando suas ferramentas de tortura, ergueu o olhar, como se finalmente tivesse ouvido algo interessante vindo de Lucien.
Por um momento, ele ficou em silêncio. Então, inclinou a cabeça para o lado e sorriu de maneira quase divertida.
— Ora… finalmente interessado?
Lucien não respondeu. Ele apenas o encarou, os olhos queimando com uma mistura de curiosidade e desespero.
O Homem Sem Nome soltou uma risada baixa.
— A Lágrima de Aether não é um simples artefato, garoto. Não é só uma joia, nem um objeto encantado qualquer. Ela é poder. Poder puro e absoluto.
Lucien sentiu um arrepio percorrer sua espinha.
— Poder para quê? — sua voz estava rouca, mas firme.
O homem deu de ombros, como se a resposta fosse óbvia.
— Para desafiar os próprios limites da realidade.
Lucien arregalou os olhos.
— Isso não faz sentido…
O homem riu novamente.
— Não para você, talvez. Mas eu estudei essa relíquia por muito tempo. A Lágrima de Aether não é algo criado por humanos. Sua origem é incerta, mas uma coisa é certa… aqueles que a possuírem terão o mundo na palma das mãos.
Lucien sentiu o estômago afundar.
Mas algo não fazia sentido.
Se Elias possuía um artefato tão poderoso… por que não tomou posse dele imediatamente?
Por que ele não o usava?
Por que ele simplesmente o deixou trancado, inutilizado, escondido?
Lucien sentiu um frio subir por sua espinha.
— Se é tão poderosa… por que Elias simplesmente a guardava? — ele perguntou, forçando-se a manter a calma. — Por que ele não a usava?
O Homem Sem Nome sorriu, mas dessa vez havia algo diferente em seu olhar.
Lucien engoliu em seco.
E então, em um lampejo, um pensamento passou por sua mente.
E se…
E se a Lágrima não pudesse ser usada?
E se ela só pudesse ser desperta sob certas condições?
Seu coração começou a bater ainda mais rápido.
Ele quase tinha a resposta.
Ele quase entendia.
Mas, antes que pudesse formular uma conclusão, o Homem Sem Nome se inclinou na sua direção, e seu sorriso se alargou.
— Ah… parece que você está começando a entender, não é?
Lucien sentiu um arrepio gelado na espinha.
Ele estava perto demais da verdade.
E isso o aterrorizava.
O Homem Sem Nome parou.
Por um instante, o silêncio na sala foi absoluto. O único som que restava era a respiração trêmula de Lucien, misturada ao gotejar de sangue no chão.
Então, lentamente, o homem levou a mão ao queixo, os olhos semicerrados.
— Se a Lágrima é tão poderosa… por que Elias simplesmente a guardava?
Ele repetiu as palavras de Lucien, mas agora para si mesmo. Ele nunca havia parado para refletir nisso antes. Se Elias possuía um artefato capaz de desafiar a própria realidade, por que o trancar? Por que não usá-lo?
A bússola de ouro não mentia. Ela nunca mentia.
E, ainda assim, apontava para o garoto.
Isso nunca fez sentido.
Até agora.
O homem puxou a bússola do bolso e a ergueu diante dos olhos, observando o brilho dourado pulsante no centro.
Dessa vez, ele fez uma pergunta diferente.
— Como Lucien está em posse da Lágrima?
A bússola brilhou mais forte. O ponteiro girou, rodopiando de maneira frenética, como se estivesse resistindo à própria resposta. Mas então… ele parou.
E a resposta veio.
“Não fisicamente. Mas através da alma.”
O Homem Sem Nome arregalou os olhos.
Sua respiração se tornou irregular, seus dedos apertaram o artefato com força.
— …Não pode ser…
Lucien, mesmo fraco, mesmo torturado, percebeu a mudança no olhar dele. Havia algo diferente ali agora. Algo errado.
O Homem Sem Nome começou a rir. Baixo, no começo. Um riso rouco, trêmulo. Mas, conforme a compreensão se instalava, a risada cresceu, transformando-se em algo insano, quase animalesco.
Lucien sentiu um arrepio de puro terror.
O homem finalmente entendia.
Agora ele sabia.
— Agora faz sentido… — ele murmurou entre risadas. — É claro que a bússola apontava para você… é claro que você acreditava que não a tinha…
Ele se inclinou, olhos brilhando de euforia.
— Porque você e a Lágrima são um só.
Lucien sentiu a mente entrar em choque.
— O quê…?
O homem se afastou, passando as mãos pelos cabelos. Ele parecia transtornado, o corpo tremendo, mas não de raiva. De êxtase.
— Elias nunca poderia usá-la, porque ela não estava realmente com ele. — Ele soltou uma risada alta. — O tempo todo, a Lágrima estava esperando um recipiente. E esse recipiente é você!
Lucien não conseguia processar aquelas palavras. Era loucura.
Mas a bússola… a bússola dizia a verdade.
Se fosse mentira, o Homem Sem Nome não estaria assim.
Então… era verdade?
O garoto sentiu o coração acelerar de puro pavor.
Mas o homem não estava assustado.
Ele estava extasiado.
— Isso… isso é perfeito. Eu achei que precisaria caçar a Lágrima como um objeto qualquer, mas agora… — Ele se virou para Lucien, um sorriso maníaco no rosto. — Eu só preciso arrancá-la de você.
Lucien sentiu um arrepio horrível atravessar seu corpo.
— O-o quê…?
O homem se virou abruptamente e gritou:
— Venha, apareça.
Lucien engoliu em seco.
Ele sabia exatamente para quem aquela ordem havia sido dada.
E então, poucos minutos depois, a porta da sal
a de tortura se abriu.
A figura alta e esguia do assassino entrou. Seus olhos frios recaíram sobre Lucien, como se já soubesse o que aconteceria ali.
O Homem Sem Nome sorriu.
— Dessa vez, vamos demorar um pouco mais.