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Fim do longo dia

Lucien estava a caminho de casa, com a mente fervilhando de pensamentos. O dia havia sido repleto de revelações. Ele sempre soube da existência da magia e das lendárias espadas empunhadas por mestres. Também conhecia os títulos reverenciados por todo o Reino. Mas até então, nunca havia compreendido a complexidade e o sacrifício necessários para alcançar essas alturas. Antes, esse mundo parecia distante, irrelevante. Agora, era diferente.

Ele precisava encontrar um caminho para se tornar alguém digno desses feitos. Status, respeito e, acima de tudo, riqueza incomensurável o aguardavam no horizonte. Um sorriso ganancioso surgiu em seus lábios ao pensar nisso.

Sua mente então retornou ao trabalho que acabara de aceitar — um serviço que prometia a absurda quantia de mil moedas de ouro. Mil moedas... Aquilo não era apenas dinheiro; era uma chance de mudar sua vida e a de sua irmã para sempre. Uma fortuna capaz de sustentar não apenas ele, mas até mesmo as gerações futuras.

Porém, o brilho do ouro trazia consigo a sombra do perigo. Lucien sabia que não seria fácil. Não era à toa que a recompensa era tão exorbitante. Para concluir essa missão, ele precisaria caminhar por uma linha tênue entre o sucesso e a ruína.

O sorriso em seu rosto desapareceu, dando lugar a uma expressão sombria. Era a oportunidade de uma vida, mas também a provação mais perigosa que já enfrentara. Cautela, inteligência e manipulação seriam suas únicas armas. Um único erro... e seria o fim.

Ele apertou os punhos, determinado. Não importava o risco. Se quisesse alcançar o que nunca teve, precisaria fazer o que nunca ousou.

Para sua sorte, Lucien já tinha em mãos tudo o que precisava. A planta da mansão, o dia perfeito para invadir e até mesmo um artefato que, segundo o homem, permitiria abrir um cofre mágico. As peças estavam ali, prontas para serem usadas. Agora, tudo dependia de como ele agiria.

Essas informações eram literalmente sua tábua de salvação. Sem elas, seria impossível sequer sonhar em penetrar a segurança de um lugar como aquele. Contudo, ao refletir sobre a precisão e a profundidade dos dados que havia recebido, uma velha dúvida ressurgiu em sua mente.

— Como diabos ele consegue acesso a tudo isso?

Era algo que ele se perguntava desde o começo. O homem parecia saber de tudo. Plantas arquitetônicas de mansões, rotinas de mestres renomados, segredos sussurrados nos cantos mais distantes do Reino... Era como se ele tivesse olhos e ouvidos em todos os lugares, observando e escutando tudo.

Lucien lembrava-se de já ter feito essa pergunta diretamente, mas nunca obteve uma resposta concreta. O homem era um poço de mistério e cautela. Ele sequer sabia o verdadeiro nome daquele que era sua principal fonte de sobrevivência há dois anos.

Claro, aquilo era suspeito. Extremamente suspeito. Mas Lucien não tinha escolha. A confiança era um luxo que ele não podia se dar ao trabalho de exigir. Era graças às informações precisas daquele homem que ele conseguira manter Lucy viva durante os últimos dois anos.

Ainda assim, Lucien não era ingênuo. Ele também havia tomado suas próprias precauções. Quando começaram a trabalhar juntos, deu um nome falso, evitando compartilhar qualquer detalhe pessoal sobre si mesmo. Nunca mencionou Lucy, sua casa, ou qualquer coisa que pudesse ser usada contra ele. Para aquele homem, Lucien era apenas "Luen", um garoto órfão e invisível.

Enquanto andava pelas ruas sombrias, com a planta da mansão dobrada dentro de seu bolso, Lucien refletia sobre o quão frágil era sua posição. Era um jogo perigoso. Mas, até agora, ele havia sobrevivido. E, com um pouco de sorte, esse trabalho seria sua porta de saída para algo maior. Algo que finalmente lhe permitiria viver, e não apenas sobreviver.

Porém, uma sombra de dúvida permanecia. Quem era aquele homem? E por que ele parecia saber tanto?

Por ora, Lucien teria que conviver com a dúvida que o atormentava. Não era o momento de se preocupar com a origem das informações do homem. Seu foco era claro: concluir a missão, pegar o pagamento e desaparecer com sua irmã. Esse era seu objetivo, e ele acreditava plenamente que conseguiria alcançá-lo.

Depois de caminhar por um bom tempo, perdido em pensamentos, Lucien se viu parado em frente a uma pequena espetaria. Era uma loja simples, com um letreiro de madeira envelhecida onde letras tortas anunciavam “Churrasco do Rodrigo”. Mesmo com sua aparência humilde, o aroma que saía de lá era irresistível. O cheiro de carne assando na brasa — misturado com temperos fortes e uma pitada de fumaça — tomava conta da rua estreita.

A rua era movimentada, mesmo àquela hora da noite. Lojas de comida e pequenas barracas de frutas ainda estavam abertas, iluminadas por lampiões de óleo pendurados nas portas. As pedras irregulares do chão estavam sujas com restos de papel, cascas de frutas e pegadas molhadas, provavelmente da chuva da tarde. Pessoas andavam apressadas, algumas com sacolas cheias, outras apenas conversando em pequenos grupos. O burburinho de vozes se misturava ao som de panelas e grelhas, criando uma melodia típica daquele bairro pobre.

A espetaria ficava no centro de um cruzamento, onde os cheiros de diferentes comidas competiam entre si. A fachada era aberta, permitindo que os clientes vissem Rodrigo, o dono, trabalhando. Ele era um homem robusto, de bigode espesso, que manuseava espetos e brasa com uma agilidade impressionante. Ao lado dele, uma jovem, provavelmente sua filha, organizava os pedidos e entregava os espetos embrulhados em papéis amarelados de gordura.

Lucien sentiu seu estômago roncar. O aroma era inebriante, mas seu pensamento logo foi para Lucy. Era noite, e ele já havia demorado mais do que o previsto. Precisava compensá-la de alguma forma. Uma boa janta parecia o mínimo que podia fazer.

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Ele apertou o bolso, sentindo o toque frio da meia moeda de prata que havia recebido de troco mais cedo. Não era muito, mas seria o suficiente para comprar alguns espetos e talvez até um pouco de arroz em uma das barracas próximas. Um sorriso involuntário apareceu em seu rosto. Ele sabia que aquela refeição alegraria Lucy, mesmo que por um momento.

Além disso, uma boa alimentação era essencial para o que estava por vir. Ele precisava estar em plena forma física e mental para enfrentar o desafio que o aguardava. De certa forma, comprar aquela janta era mais do que um gesto de carinho; era uma preparação para o futuro.

Lucien respirou fundo e entrou na fila da espetaria. Ele já conseguia imaginar o rosto de Lucy se iluminando ao sentir o cheiro da comida. Por um breve instante, deixou de lado as preocupações e concentrou-se naquele pequeno prazer.

Quando Lucien finalmente chegou em casa, ele foi recebido de forma previsivelmente fria, mas isso não o abalou. Lucy, como sempre, estava sentada no canto da sala, fingindo estar furiosa, mas ele sabia que era só fachada. Ainda assim, aquele olhar acusador sempre pesava um pouco em sua consciência.

Lucy era profundamente apegada ao irmão. Afinal, ele era tudo o que ela tinha. Apesar disso, Lucien sabia que o sentimento era recíproco. Ele também era muito apegado a ela, mas, como o mais velho e o único responsável, tinha que tomar decisões difíceis, o que muitas vezes significava deixá-la sozinha para resolver os problemas que garantiam a sobrevivência de ambos.

Ele colocou a sacola com a comida na mesa improvisada de madeira, um pouco desgastada pelo tempo. — Ei, Lucy. Quando você vai perdoar seu irmão? — perguntou ele com um sorriso travesso, tentando suavizar o clima.

Lucy estava comendo seu espeto com um prato de arroz ao lado, e apesar de estar se deliciando, seus olhos brilhando denunciavam que ela estava gostando mais do que queria admitir. Mas, como sempre, quando olhou para Lucien, fez uma careta exagerada e fingiu que ainda estava zangada.

Talvez, pensou Lucien, ela acreditasse que, ao manter aquela fachada de irritação, poderia convencê-lo a nunca mais deixá-la sozinha. Na cabeça de Lucy, se ele a levasse junto para o que quer que fosse, ela não se sentiria tão solitária, nem precisaria enfrentar as horas de angústia enquanto esperava sua volta.

— Amanhã — respondeu Lucy, suspirando dramaticamente.

Lucien piscou, confuso por um momento. Amanhã? O que ela queria dizer com isso? Mas então, como uma lâmpada se acendendo, ele lembrou-se de sua promessa. "Amanhã eu te levo ao seu lugar favorito."

Ele soltou um riso baixo e bagunçou os cabelos da irmã, o que só fez ela resmungar ainda mais. — Você nunca esquece nada, não é? — perguntou ele, rindo.

Lucy finalmente sorriu de verdade, mas tentou esconder ao virar o rosto. — Claro que não! Você acha que eu não vou cobrar o que você promete?

Lucien balançou a cabeça e riu novamente, sentindo uma leveza momentânea. Por alguns minutos, enquanto comiam juntos, ele conseguiu esquecer os perigos que o aguardavam e as decisões difíceis que precisaria tomar. Naquele instante, tudo o que importava era o sorriso genuíno de Lucy e a promessa que ele precisava cumprir.

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Depois de jantar, Lucy estava quase dormindo em pé. Seus olhos estavam pesados, e ela tropeçava de tanto sono, parecendo um pequeno bêbado cambaleante. Lucien, observando a cena, deixou escapar um sorriso raro. Era engraçado e, ao mesmo tempo, reconfortante vê-la tão relaxada depois de um dia difícil.

Antes que ela desabasse no chão, ele a segurou gentilmente pelo braço e a guiou até a cama. Lucy resmungou algo incompreensível, mas não resistiu. Seus passos eram vacilantes, e Lucien tinha que controlar o riso enquanto a conduzia. Quando finalmente a deitou, ela caiu na cama como uma pedra, adormecendo instantaneamente.

Ele ficou parado por um momento, observando sua irmã dormir profundamente. O leve movimento de sua respiração e o rosto tranquilo dela eram tudo o que ele precisava para se lembrar do motivo de tudo aquilo. "Amanhã vai ser um bom dia para ela," pensou. Depois disso, o que quer que viesse, ele enfrentaria.

Lucien deu um passo para trás, fechou a porta do quarto com cuidado e voltou para a cozinha. Sentou-se em uma cadeira que rangeu sob seu peso e deixou seu corpo relaxar. O ambiente agora estava silencioso, exceto pelo ocasional som do vento batendo contra as paredes da velha casa de madeira.

Seus olhos se fixaram em um pequeno espelho que estava sobre a mesa. Era o mesmo espelho que normalmente ficava guardado em um armário, mas por algum motivo inexplicável, estava ali agora. Lucien encarou seu próprio reflexo, seus olhos sombrios refletindo uma determinação fria. Ele ficou assim por minutos, imóvel, mergulhado em pensamentos.

O homem sem nome havia deixado claro: a missão que o esperava exigiria foco, cautela e controle absoluto. Não havia espaço para erros. Lucien sabia que precisava se preparar mentalmente. Aquilo não era apenas um roubo; era uma prova de fogo, um divisor de águas.

"Concentração," ele murmurou para si mesmo, os olhos nunca desviando do espelho. Ele precisava disso agora mais do que nunca. Não era apenas sua vida que estava em jogo. O futuro de Lucy dependia de seu sucesso, e ele estava disposto a fazer qualquer coisa para garantir que ela tivesse uma vida melhor.

A concentração é tratada como uma habilidade rara, poderosa e extremamente difícil de alcançar, uma força mental que, quando devidamente dominada, pode abrir portas inimagináveis. Inspirando-se nisso, Lucien refletia sobre o desafio de manter o foco absoluto.

Ele sabia que concentração não era apenas "pensar em algo". Era muito mais do que isso. Concentrar-se verdadeiramente era como caminhar sobre uma corda bamba: qualquer distração, qualquer hesitação, e você despenca. Exigia disciplina, paciência e uma força de vontade inabalável.

Lucien, sentado diante do espelho, lembrou-se das palavras do homem sem nome, que enfatizava a importância de manter a mente clara e fixa no objetivo. Para ele, concentração era o alicerce de tudo — o que separava os que triunfavam dos que fracassavam.

Ele tentou colocar em prática. Respirou fundo, fechou os olhos e deixou os pensamentos correrem. Primeiro, vinham as distrações: a imagem de Lucy dormindo, o som do vento, as dúvidas sobre o plano. Ele as reconheceu, mas não se agarrou a elas. Deixou que passassem como folhas levadas pela correnteza de um rio.

Então, ele focou na missão. Visualizou cada passo, cada movimento necessário para atravessar a mansão de Elias. Ele imaginou os corredores silenciosos, os guardas distraídos, o cofre mágico que ele teria que abrir. A clareza começou a surgir, mas ele sentiu o esforço de manter o foco. Era quase doloroso, como segurar um peso que ameaçava esmagá-lo.

Em algum lugar, Lucien uma vez ouviu que "a mente é como um cavalo selvagem — indomada, feroz, sempre correndo para onde não queremos que vá". Para domá-la, era necessário muito mais do que desejo: era preciso prática, persistência e resistência. Lucien entendia isso agora. Ele não poderia se dar ao luxo de deixar sua mente vagar. Não quando tudo estava em jogo.

Ele respirou fundo, afastou os pensamentos e se levantou. A noite seria longa, mas Lucien sabia que, antes de mais nada, precisava descansar. O maior desafio de sua vida estava logo à frente, e ele precisava estar pronto.