O felino movia-se como um raio, suas patas quase não pareciam tocar o chão, tamanha era sua leveza. Apesar da velocidade impressionante, a experiência de viajar sobre ele era inacreditavelmente suave. Lucien podia sentir uma leve pulsação mágica ao redor, uma espécie de campo que amortecia qualquer impacto ou sacolejo. Ele tinha quase certeza de que o artefato rúnico no pescoço da criatura era responsável por isso.
Enquanto Lucien observava os arredores, ele permitiu que seu olhar vagueasse pelos campos verdes que passavam rapidamente, os tons dourados do sol nascente iluminando o mundo como uma pintura. Mas o que realmente capturava sua atenção era Lucy, sentada à frente, o rosto iluminado por um sorriso que parecia maior do que ela mesma.
— Uhuuu! — gritava ela a plenos pulmões, jogando os braços para cima como se estivesse em um parque de diversões. Seus cabelos balançavam ao vento, e seus olhos brilhavam com uma alegria pura que Lucien não via há muito tempo.
Ele não pôde evitar sorrir, um sorriso raro e genuíno. Ver Lucy tão animada fazia com que toda a tensão dos últimos dias diminuísse, mesmo que por breves momentos.
— Estão apreciando o passeio? — perguntou o condutor do felino, sua voz rouca cortando o som do vento.
Antes que Lucien pudesse responder, Lucy se adiantou com mais um grito cheio de energia.
— Sim! Isso é incrível!
O homem riu com gosto, satisfeito.
— Esses pequenos momentos são os que valem a pena, não é?
Lucien assentiu, relaxando um pouco mais no assento. Geralmente, eles faziam o trajeto até o bosque com uma bicicleta alugada, uma tarefa exaustiva que exigia esforço e muitas paradas para descansar. Mas desta vez ele havia decidido investir em algo especial. Apesar do custo das moedas de prata, ele sabia que cada centavo valeria a pena por aquele dia.
Enquanto o felino continuava seu caminho veloz, Lucien permitiu-se relaxar por um momento, deixando os pensamentos sombrios de lado. Ele olhou para o horizonte, onde as árvores densas do bosque já podiam ser vistas, e sentiu um raro momento de paz.
Lucy olhou para trás, seu sorriso ainda brilhando.
— Estamos quase lá, Lucien! Você acha que vamos encontrar flores novas dessa vez?
Ele riu suavemente e respondeu, com um tom leve:
— Talvez. Mas só se você prometer não arrancar todas.
Ela fez uma careta divertida, antes de voltar a olhar para o caminho à frente. Lucien não podia deixar de pensar que, por mais fugaz que fosse, aquele momento valia cada esforço que ele fazia para protegê-la.
Alguns minutos depois, o felino diminuiu gradualmente sua velocidade à medida que se aproximavam da entrada do bosque. O local era como uma pintura viva, cada detalhe parecia ter sido cuidadosamente moldado pela natureza para encantar. A entrada era composta por um caminho de lajes claras, ligeiramente cobertas por musgo, que se estendia como uma trilha convidativa. Ao redor, grandes árvores com troncos robustos e galhos extensos formavam um arco natural, com folhas verdes e frescas que balançavam suavemente ao ritmo do vento.
Lucien ajudou Lucy a descer do felino. Seus olhos brilharam ao ver a paisagem, e ela começou a pular de excitação. Ele virou-se para o condutor, que já estava acomodando o felino em uma sombra próxima.
— Vai ficar por aqui? — perguntou Lucien, ajustando a cesta em sua mão.
O homem, que já estava encostado em uma árvore, respondeu com um sorriso:
— Claro, o acordo inclui a ida e a volta, lembra? Ficarei esperando por vocês. Esse lugar é tranquilo, e o felino também gosta do ar puro daqui. Aproveitem.
Lucien assentiu, satisfeito. Ele sabia que não precisava se preocupar com o transporte de volta. Então, voltou sua atenção para sua irmã, que já corria pelo caminho de lajes, observando cada detalhe ao redor.
Ao entrarem mais profundamente no bosque, a beleza do local se revelava em toda sua grandiosidade. Flores de todos os tipos e cores preenchiam os arredores, criando um tapete vibrante e perfumado que contrastava com o verde intenso das árvores. Margaridas, tulipas, lírios e até algumas flores raras, com pétalas brilhantes que pareciam feitas de cristal, surgiam aqui e ali. O som de pássaros completava a sinfonia da natureza, enquanto pequenos insetos brilhantes, semelhantes a vaga-lumes, dançavam no ar.
No coração do bosque, o grande lago azul finalmente apareceu. Sua água era incrivelmente límpida, refletindo o céu como se fosse um espelho perfeito. Peixes coloridos nadavam em cardumes próximos à superfície, visíveis até mesmo de longe. Ao redor do lago, havia grandes pedras lisas, perfeitas para se sentar, e árvores cujos galhos se inclinavam sobre a água, como se quisessem tocá-la.
Lucy ficou extasiada.
— Uau, Lucien! É ainda mais bonito do que eu me lembrava!
Lucien sorriu ao ver a felicidade dela.
— Sim, é mesmo. Vá se divertir enquanto eu preparo as coisas.
Próximo ao lago, havia uma área perfeita para Lucy brincar: uma corda pendurada em um dos galhos mais fortes de uma árvore, formando um balanço improvisado que pendia sobre a água. Ela correu até lá imediatamente, rindo enquanto balançava cada vez mais alto.
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Lucien começou a preparar o local do piquenique. Estendeu a toalha sobre a grama macia, organizou as frutas e outros mantimentos da cesta, e colocou a garrafa de suco no centro. O som da risada de Lucy misturado ao som das folhas e ao farfalhar da água era uma melodia que ele gostaria de guardar para sempre.
Enquanto isso, o condutor observava tudo de longe, com um olhar sereno. Ele acariciava o felino, que parecia tão à vontade quanto qualquer um ali. O bosque não era apenas um lugar bonito; era como um refúgio, um pedaço de tranquilidade em meio ao caos do mundo lá fora.
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Lucien, estava sentado sobre a toalha de piquenique, observava Lucy brincar animadamente. A menina jogava água para o alto, criando pequenas ondas no lago que reluziam à luz do sol. Enquanto isso, seus olhos se desviaram para o felino, que descansava tranquilamente à sombra de uma grande árvore, próximo ao condutor. A criatura era imponente, com músculos bem definidos, um pelo negro que parecia absorver a luz, e olhos amarelos brilhantes que demonstravam inteligência.
A curiosidade tomou conta de Lucien. Ele se levantou, limpou as mãos na calça e caminhou até o homem que acariciava o felino.
— Ei, posso perguntar uma coisa?
O condutor levantou os olhos e sorriu.
— Claro, garoto. O que foi?
Lucien cruzou os braços, encarando o felino.
— Como você consegue controlá-lo? Quero dizer, o artefato rúnico foi feito por uma outra pessoa, você consegue simplesmente tomar posse dele e subjugar bestas?
O homem soltou uma risada baixa, olhando para a criatura com um olhar quase paternal.
— Ah, rapaz, essa é uma pergunta interessante. O controle dessas bestas não é algo que vem só do artefato. É preciso muito mais que isso.
Ele bateu levemente no colar que o felino usava, onde runas brilhantes pulsavam em um ritmo constante.
— isso aqui foi criado por um grande mestre do reino, um verdadeiro gênio quando se trata de magia e encantamentos. Esse artefato não só permite que eu me conecte com a mente da besta, mas também estabelece limites. Ele funciona como uma coleira mágica, uma ponte entre o animal e o condutor.
Lucien arqueou as sobrancelhas, intrigado.
O homem balançou a cabeça.
— Pode parecer, mas não é tão simples. O artefato é uma ferramenta poderosa, mas é só parte do processo. Para controlar uma criatura como essa, é preciso estabelecer um vínculo inicial. Você não pode simplesmente colocar o artefato em qualquer besta e esperar que ela obedeça. Elas têm vontade própria, e muitas vezes são agressivas ou desconfiadas. Sem paciência e treino, você nunca conseguiria sequer chegar perto de uma.
Ele fez uma pausa, o rosto assumindo uma expressão mais sombria.
— Mas mesmo com todos os encantamentos e vínculos, uma besta pode sair do controle. Se o artefato for danificado, ou se a criatura for exposta a uma grande quantidade de mana selvagem, pode perder completamente a razão. Quando isso acontece, ela não reconhece mais aliados ou inimigos. Vira puro instinto.
Lucien franziu o cenho.
— E o que acontece se isso ocorrer?
— Caos. — A resposta veio curta e direta, mas o peso na voz do homem deixou claro o perigo.
— Imagine uma criatura como essa, forte, veloz, com instintos afiados, atacando tudo à sua volta sem discriminação. Já houve casos no reino de bestas que escaparam do controle. Foi preciso um esquadrão inteiro de magos e guerreiros para detê-las. Algumas nem sequer foram derrotadas, apenas exiladas para regiões inóspitas.
Lucien sentiu um arrepio na espinha, mas a curiosidade ainda o impulsionava.
— E você nunca teve problemas com ele?
O homem sorriu, dessa vez com orgulho.
— Não. Porque eu respeito a criatura. Esse é o segredo, garoto. Você pode usar magia, runas, o que for, mas no final das contas, o respeito mútuo é o que mantém tudo em harmonia.
Lucien olhou para o felino novamente, dessa vez com uma mistura de fascínio e cautela. Ele sempre achou que criaturas mágicas eram apenas ferramentas para aqueles que tinham o poder de controlá-las, mas agora entendia que havia muito mais envolvido.
— Obrigado pela explicação. — Ele finalmente disse, voltando para onde Lucy brincava. Apesar de seu interesse, ele sabia que precisava manter o foco.
Enquanto se afastava, o homem voltou a acariciar o felino, murmurando algo para ele. A criatura ronronou baixinho, demonstrando o vínculo único que compartilhavam. Lucien, por sua vez, guardou as informações em sua mente afiada, imaginando como aquilo poderia ser útil no futuro.
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Após a breve conversa com o condutor, Lucien se juntou à irmã no lago. Lucy jamais ficaria satisfeita brincando sozinha, e, no fundo, Lucien também queria sentir a água fresca do lago. Era o tipo de momento que eles raramente podiam desfrutar.
Eles brincaram sem preocupações, jogando água um no outro e correndo pelo bosque. Risos puros ecoavam por entre as árvores, leves e contagiantes, vindos das duas crianças de cabelos negros e pele pálida que se entregavam àquele raro instante de felicidade.
O tempo parecia ter parado enquanto eles se divertiam, mas, quando algumas horas se passaram, Lucy começou a sentir fome. Ela parou perto da toalha para comer algumas frutas e beber o suco que Lucien havia trazido. Com uma maçã nas mãos, ela olhava ao redor com os olhos brilhando de satisfação.
— Está se divertindo? — perguntou Lucien, sorrindo ao vê-la tão contente.
— Muito! Já fazia tanto tempo que não brincava com você assim. Fiquei muito feliz! — respondeu Lucy, com entusiasmo, entre mordidas na maçã.
Ao lançar um sorriso radiante para ele, Lucien sentiu o impacto das palavras da irmã. A verdade era clara e crua: eles eram apenas duas crianças, mas viviam uma vida tão difícil que momentos como aquele eram uma raridade. Poder rir sem se preocupar com o amanhã, sentir a barriga cheia e o coração leve era algo que a maioria das crianças tomava como certo, mas, para eles, era quase um luxo.
Lucy, apesar da pouca idade, entendia bem a realidade em que viviam. Aos dez anos, já carregava nos ombros um peso que nenhuma criança deveria suportar. Talvez por isso estivesse aproveitando aquele dia ao máximo, sabendo que poderia demorar até que outra oportunidade como aquela surgisse.
Lucien observava a irmã com um misto de admiração e determinação. Ele sabia que, como irmão mais velho, era sua responsabilidade garantir que momentos como aquele se tornassem mais frequentes. Seus olhos, antes leves, agora assumiam uma expressão séria e resoluta.
— Não se preocupe, Lucy. Eu prometo que, em breve, você terá muito mais dias assim comigo. Confie no seu irmão! — disse, com uma voz firme, mas carregada de carinho.
Lucy parou de mastigar por um instante, olhando para ele com toda a confiança que só uma criança poderia oferecer. Seu sorriso doce voltou, e ela respondeu sem hesitar:
— Eu confio... Você é a pessoa em quem mais confio no mundo inteiro.
Aquelas palavras foram como uma chama dentro de Lucien, alimentando sua motivação. Ele sabia que não poderia falhar. Todo o sacrifício, toda a dificuldade, tudo o que ele enfrentava, tinha um propósito: garantir um futuro melhor para Lucy. E, naquele momento, sua determinação de fazer isso acontecer se solidificou ainda mais.