Assim que atravessaram o portal, Damien e Nyssa sentiram como se tivessem atravessado não apenas um véu, mas uma barreira entre mundos. O ar ali era denso, quase sólido, impregnado de um frio que não vinha da temperatura, mas de uma presença. A névoa espessa os envolvia como mãos invisíveis, agarrando suas peles e sussurrando segredos incompreensíveis em seus ouvidos. Era um som sutil, como um coro de vozes distantes, mas suficiente para arrepiar a espinha de qualquer um, até mesmo de deuses.
O chão sob seus pés era uma mistura peculiar de terra seca e rachada, com pequenas fissuras que brilhavam em um tom carmesim. Não havia grama, apenas árvores altas e retorcidas com cascas negras e galhos que se estendiam como dedos esqueléticos, prontos para agarrar o que passasse perto. Essas árvores não apenas balançavam ao vento inexistente — elas pulsavam, como se fossem vivas, respirando com lentas batidas de um coração oculto.
No céu, um firmamento sem estrelas estendia-se infinito, tingido de cinza e vermelho, como uma ferida aberta que nunca cicatrizava. Lá no alto, pequenos pontos brilhantes pareciam orbitar em círculos, mas Damien percebeu rapidamente que não eram estrelas. Eram olhos, enormes e vigilantes, que os observavam como predadores estudando suas presas.
Um odor indescritível permeava o lugar — algo entre sangue seco, madeira queimada e podridão. Não era suficiente para fazer vomitar, mas carregava uma náusea que crescia com o tempo.
Nyssa parou ao lado de Damien, seus olhos escaneando o ambiente. Ela, a princípio, não disse nada. Apenas franzia o cenho, como se buscasse entender o que sentia. Finalmente, ela falou, sua voz mais baixa do que o habitual:
— Isso… isso não é um lugar. Isso é uma cicatriz.
Damien não respondeu imediatamente. Ele concordava. Havia algo intrinsecamente errado ali. Não era apenas o ambiente que os pressionava, mas uma presença intangível, como se o próprio espaço ao redor quisesse sufocá-los. Era opressivo, quase insuportável, e mesmo ele, como deus da morte, sentia a energia drenando sua determinação.
Eles avançaram alguns passos, e logo a névoa começou a se dispersar, revelando o que havia além das árvores grotescas. Lá estava o vilarejo.
Casas pequenas e simples formavam ruas estreitas, feitas de pedras antigas e desgastadas. Mas havia algo errado. As construções pareciam recentes, como se tivessem sido erguidas há poucos dias, mas exalavam a sensação de estarem ali há séculos, abandonadas. Nenhuma luz saía das janelas, mas ainda assim era possível ouvir sussurros vindos de dentro delas.
Damien se aproximou com cautela, mas Nyssa o segurou pelo braço.
— Não toque em nada. Esse lugar é uma armadilha.
Ele a olhou com irritação, mas sabia que ela estava certa. Nada ali parecia seguro. Apesar disso, ele se forçou a continuar. Ele era Damien, o dominador das almas, o futuro rei do submundo. Não era possível que um vilarejo quebrado o assustasse.
Mas então ele viu os moradores.
À primeira vista, eram pessoas comuns. Homens, mulheres e crianças andavam pelas ruas, conversando entre si, como se aquilo fosse apenas mais um dia comum. Damien estreitou os olhos e sentiu uma pontada em seu estômago. Ele viu suas almas — e elas eram terríveis.
Não estavam apenas corrompidas, mas deformadas, como um pano rasgado e remendado com fios negros e espinhos. Cada alma pulsava com uma energia densa e suja, como um poço de escuridão que ameaçava engolir tudo ao redor.
Ele olhou para Nyssa.
— Essas pessoas... não são vivas. Mas também não estão mortas.
Nyssa, por sua vez, tinha uma expressão séria, quase sombria.
— Não. Elas são algo entre os dois. Uma aberração.
De repente, uma rajada de vento gélido soprou pela aldeia, levantando poeira e folhas secas. O som do vento soava mais como um grito distante. Nesse instante, os moradores pararam. Cada um deles congelou no lugar, como bonecos de cera, antes de lentamente virarem suas cabeças na direção de Damien e Nyssa.
Os olhos dos aldeões estavam completamente negros, como poços sem fundo. Não havia emoção, apenas uma presença esmagadora que parecia sussurrar dentro da cabeça de Damien:
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"Você não pertence aqui."
Ele sentiu a pressão aumentar, como se o próprio ar estivesse tentando empurrá-lo para fora. Mas Damien cerrou os punhos, lutando contra a sensação.
— Eles sabem que estamos aqui.
Nyssa olhou para ele, seu olhar carregado de tensão.
— Eles não sabem. Eles sentem.
O vilarejo inteiro estava silencioso agora, exceto pelo som de suas respirações. As figuras que antes pareciam humanas agora estavam completamente imóveis, encarando-os com olhos vazios. A tensão era palpável, como se o próprio mundo ao redor estivesse prendendo a respiração.
E então, o primeiro grito ecoou. Um som horrível, agudo e gutural, que parecia surgir de todas as direções ao mesmo tempo. A batalha havia começado, e Damien e Nyssa estavam no coração de algo muito maior do que poderiam imaginar.
O grito que ecoou pela aldeia não parecia humano. Era um som de agonia misturado a um riso perturbador, algo que parecia rasgar a alma. Em resposta, os aldeões começaram a se mover. Não de forma comum — seus corpos se contorciam de maneiras grotescas, ossos estalando enquanto suas cabeças giravam em ângulos impossíveis. Eles não andavam; eles deslizavam, como se seus pés não tocassem o chão.
Damien instintivamente deu um passo para trás, sua respiração pesada, os punhos cerrados.
— Isso... isso não são humanos. Nem mesmo almas corrompidas se movem assim.
Nyssa, ao seu lado, parecia mais alerta do que nunca, seus olhos varrendo cada figura ao redor.
— Seja o que for, não está mais escondido. Estão nos cercando.
Os moradores, agora criaturas irreconhecíveis, formavam um círculo em torno deles. Damien sentiu a energia escura no ar aumentar, como uma pressão que apertava seus ossos. Seus instintos gritavam para sair dali, para escapar e planejar uma estratégia melhor para o que estava por vir.
— Chega disso. — Ele rosnou, levantando a mão e segurando o colar em seu pescoço. Concentrando-se em sua habilidade de teleporte, ele tentou localizar a essência de alguma alma próxima fora daquele lugar. A escuridão começou a envolvê-lo, um redemoinho familiar que o tiraria dali.
Mas algo deu errado.
No momento em que ele tentou se conectar a uma alma distante, a escuridão ao seu redor desapareceu abruptamente, como se tivesse sido sugada por uma força invisível. Ele sentiu um impacto profundo, como se tivesse sido atingido por uma parede invisível.
— Não pode ser... — murmurou, seu tom cheio de incredulidade. Ele tentou novamente, despejando mais de sua essência, mas o resultado foi o mesmo. A conexão simplesmente não acontecia. Era como se o próprio tecido daquele lugar estivesse bloqueando seu poder.
Nyssa notou sua hesitação e estreitou os olhos.
— O que aconteceu?
Damien olhou para ela, e pela primeira vez, havia um leve pânico em seus olhos.
— Não consigo sair. Alguém... ou algo... fechou o caminho.
Nyssa engoliu seco, mas sua expressão não era de surpresa.
— Eu imaginei que algo assim pudesse acontecer. Esse lugar não é apenas um reino perdido, Damien. É uma prisão.
Antes que ele pudesse responder, os aldeões atacaram. Não com armas ou força física, mas com a própria energia negra que pulsava de suas almas corrompidas. Correntes de escuridão saíam de seus corpos, como tentáculos que avançavam para os dois deuses.
Damien reagiu primeiro, conjurando um escudo de energia sombria ao redor deles. O impacto das correntes contra sua barreira fez o chão tremer, rachaduras se espalhando pela terra como teias de aranha.
— Eles estão tentando nos drenar! — ele gritou, seus dentes cerrados enquanto mantinha o escudo intacto.
Nyssa, ao lado dele, levantou as mãos, e um brilho prateado começou a emanar de seus dedos. A energia dela era oposta à de Damien — não sombria, mas pura, como uma luz cortante.
— Segure firme. Vamos precisar lutar até encontrarmos um lugar seguro.
Com um movimento rápido, ela disparou rajadas de luz prateada contra os aldeões. As criaturas recuaram momentaneamente, mas não caíram. Pareciam apenas hesitar, como se estivessem aprendendo a resistir aos ataques.
Damien estreitou os olhos, analisando os movimentos delas.
— Eles não estão apenas nos atacando. Estão... nos testando.
— Ótimo. — Nyssa bufou, seus olhos brilhando com determinação. — Isso significa que quem quer que esteja por trás disso está nos observando.
Damien não respondeu imediatamente. Em vez disso, ele desfez o escudo, canalizando sua energia em algo mais ofensivo. Ele estendeu as mãos, e da escuridão ao seu redor surgiram correntes sombrias, que chicotearam em direção aos aldeões, prendendo alguns deles no lugar.
— Se estão nos testando, vamos mostrar que não somos brinquedos.
As correntes de Damien seguraram várias criaturas no lugar, enquanto as rajadas de luz de Nyssa derrubavam outras. Mas, por mais que lutassem, os aldeões pareciam infinitos. Por cada um que caía, mais dois surgiam das sombras, seus olhos negros brilhando com um ódio inumano.
Damien sentiu a exaustão começar a pesar em seus ombros.
— Isso não vai funcionar. Precisamos sair daqui antes que nos cerquem completamente.
Nyssa concordou com um aceno, mas seu rosto estava tenso.
— Fácil falar. Mas para onde vamos?
Ele olhou ao redor, seus olhos caindo em uma construção maior no centro da vila. Parecia uma igreja, mas estava coberta de raízes negras que pulsavam como artérias vivas. Algo dentro de Damien sussurrou que aquele era o lugar.
— Ali. — Ele apontou, seu tom resoluto. — Seja o que for, está nos guiando para lá.
Nyssa hesitou.
— Você quer correr direto para o coração do problema?
Damien deu um sorriso amargo.
— Não temos outra escolha. Este lugar não vai nos deixar sair... então vamos arrancar o coração disso tudo.
Sem mais uma palavra, os dois avançaram, abrindo caminho entre os aldeões que continuavam a atacá-los. Cada passo parecia mais pesado do que o anterior, como se o próprio ar tentasse impedi-los. Mas eles continuaram, movidos pela determinação — e pelo fato de que não havia outro caminho a seguir.
A igreja sombria estava cada vez mais próxima, mas Damien sabia que o verdadeiro desafio ainda estava por vir. Algo os esperava lá dentro, algo que provavelmente sabia tudo sobre eles. E enquanto entravam na escuridão daquela construção pulsante, ele sentiu um arrepio percorrer sua espinha.
Eles haviam passado do ponto sem retorno.