A noite havia caído, e Damien estava acomodado em sua “cama”. Bem, o que ele chamava de cama era, na verdade, um galho de árvore, onde ele se recostava para descansar. Com os braços cruzados e a cabeça encostada no tronco, ele observava Nyssa, que ainda parecia levemente irritada.
A piada com o nome dela tinha sido desnecessária, talvez até maldosa, mas Damien não achava que aquilo fosse motivo suficiente para ela permanecer emburrada. O nome de um deus, afinal, podia soar peculiar, mas sempre carregava significados importantes.
O próprio nome de Damien, por exemplo, significava “domar” ou “controlar”. Era um nome ideal para o futuro governante do submundo, o lugar onde as almas mais rebeldes precisavam ser subjugadas. O nome de Nyssa, embora soasse estranho aos seus ouvidos, tinha um significado profundo. Representava renovação, crescimento, mistério ou nutrição. Não era algo que ele compreendia completamente, mas sabia que nenhum deus recebia um nome sem propósito.
“Ei, Nyss, me conte sobre o que está quebrando o equilíbrio. Esqueça o que eu disse antes”, falou Damien, tentando apaziguar a situação.
Ele usou um apelido casual, mas isso apenas reforçou a estranheza que via no nome dela, algo que fez a carranca de Nyssa se intensificar por um breve momento.
No entanto, ela pareceu cansar de seu emburramento. Ela era uma deusa, afinal. E que tipo de deusa ficaria amuada por uma provocação tão pequena? Suspirando, ela finalmente se virou para ele, pronta para dar as explicações que ele tanto esperava.
Damien quase sorriu. Finalmente, teria respostas! Desde que havia sido enviado ao reino mortal, tinha sido deixado completamente no escuro, sem instruções claras ou qualquer tipo de apoio. Ele havia sobrevivido até ali por puro instinto.
Enquanto Nyssa começava a falar, Damien decidiu focar toda sua atenção nela.
“Como você sabe, o equilíbrio entre vida e morte está em ruínas”, começou ela, sua voz firme. “Nem mesmo nós, os deuses do Olimpo, entendemos completamente o motivo. No entanto, sabemos onde buscar respostas.”
Damien inclinou a cabeça, interessado.
“Há um lugar, uma terra oculta aos olhos dos mortais, mas visível para nós, deuses. De acordo com os mapas humanos, aquele lugar sequer deveria existir. É como se estivesse fora da realidade deles. Porém, alguma força misteriosa impede que nos aproximemos demais. Nenhum de nós consegue chegar a menos de cinco mil quilômetros de distância sem encontrar resistência. Teletransporte, clarividência, tudo falha quando tentamos alcançar a região exata. Mas sabemos que é lá onde o problema se origina.”
“E o que sabemos sobre essa força?” Damien perguntou.
“Pouco”, respondeu Nyssa, balançando a cabeça. “Sabemos apenas que é algo antigo, perigoso, e que está mexendo com as almas dos vivos e dos mortos. E há mais uma coisa...”
“Continue”, incentivou Damien.
“A Oráculo do Olimpo viu sua face, Damien. Ela previu que você seria a única entidade capaz de cruzar aquelas terras. Foi por isso que Zeus decidiu enviar você. Sua presença estava predestinada a interagir com aquilo que se esconde naquele lugar.”
Damien estreitou os olhos. Havia algo desconcertante naquela explicação.
“Eu entendi a maior parte. Ainda assim, isso não explica como o equilíbrio está sendo afetado. Por que eu? Entre tantos deuses e semideuses, por que minha imagem apareceu na visão dela?”
Nyssa fez uma pausa, observando Damien atentamente antes de responder.
“Porque você já esteve em contato com as anomalias criadas por essa força”, disse ela, suas palavras carregadas de significado.
Damien arqueou uma sobrancelha.
“Anomalias?”
“Ellie e Ramon”, ela respondeu.
O nome de Ellie imediatamente trouxe à tona lembranças amargas. Ele se lembrou de como sua alma estava estranhamente morta, mesmo quando seu corpo ainda vivia. Mas Ramon? Qual era a conexão dele com tudo isso?
“Ellie eu entendo”, disse Damien. “Mas o que Ramon tem a ver com isso?”
Nyssa respirou fundo antes de explicar.
“Ramon estava sendo lentamente corrompido pela mesma força que está desequilibrando tudo. Apesar de ser um semideus, sua alma estava sendo drenada de vida. Mas ele, de alguma forma, conseguiu transferir parte desse fardo para Ellie. Foi por isso que a vida dela foi tirada de forma tão abrupta. Não foi apenas a maldição, ou os atos dele. Foi o desequilíbrio que agiu por trás de tudo.”
Damien sentiu a raiva borbulhar dentro dele. A lembrança de Ramon o fez cerrar os punhos.
“Maldito”, murmurou. “Eu deveria tê-lo julgado de forma ainda mais severa.”
Mas, por ora, ele deixou os pensamentos de lado. Suspirou e recostou-se novamente contra a árvore, fechando os olhos.
“Bem, agora eu sei o que preciso fazer. Obrigado, Nyssa. Você foi mais útil do que eu imaginava.”
A case of content theft: this narrative is not rightfully on Amazon; if you spot it, report the violation.
Nyssa cruzou os braços, aparentemente indiferente ao elogio.
“Tenha uma boa noite”, disse ele, preparando-se para cochilar.
“Boa noite”, respondeu ela, mas, para sua surpresa, começou a se afastar.
Damien abriu os olhos, confuso.
“Espera aí. Para onde você está indo?”
Nyssa olhou para ele com uma sobrancelha arqueada, como se a pergunta fosse absurda.
“Pra minha casa. Vou dormir na minha cama, como qualquer ser racional faria.”
Damien ficou boquiaberto.
“Casa? Você tem uma casa? E só agora você fala isso?” Ele se levantou num salto, indignado.
Nyssa o olhou com uma expressão divertida e sarcástica.
“Você realmente acha que eu ia te deixar dormir lá?”
Damien apontou para ela, incrédulo.
“Você ousa negar abrigo ao deus que está aqui para salvar o equilíbrio do mundo?”
Nyssa deu de ombros, como se não se importasse. Ela virou e começou a ir embora novamente.
Mas Damien insistiu.
“Você não vai a lugar nenhum sem mim. Se algo acontecer com você, quem vai me guiar?” ele parou por um segundo e acrescentou. “ Ah, deixando bem claro, que algo vai acontecer se você sair, então… tome cuidado” — Disse Damien em claro tom de ameaça.
“Eu sei me cuidar. E, sinceramente, não preciso de companhia para dormir. Além disso, se algo ousar entrar no meu caminho, tenho certeza que não será eu que terá que ter cuidado”
Logo, os dois ficaram se encarando, e a tensão aumentou. Quando ela tentou virar-se novamente, Damien avançou, e segurou em seu braço direito.
Nyssa parou, e, num piscar de olhos, os dois estavam trocando golpes. Ambos estavam em movimento, a tensão quebrada por uma explosão de energia. Damien tentou se antecipar aos movimentos rápidos de Nyssa, mas ela era astuta. Seus punhos se encontraram com força, e a batalha não era mais apenas física; era uma troca de vontades, de egos.
Nyssa tentou um golpe preciso em seu lado, mas Damien desviou, com um sorriso arrogante no rosto. "Você vai precisar de mais do que isso."
Ela deu um passo atrás, com os olhos desafiadores, então avançou novamente, mas dessa vez com uma estratégia diferente. Seus movimentos eram mais fluidos, mais calculados. Damien teve que se concentrar para não ser pego. Ela parecia estar se divertindo com aquilo, mas ele não ia deixar que isso o derrubasse.
Após um rápido confronto de socos e bloqueios, Damien fez um movimento ousado, pegando Nyssa pela cintura e, com força, imobilizando-a no chão. Ele olhou para ela, com um sorriso vitorioso. "Vejo que você não é páreo para mim."
Ela o encarou, a respiração ofegante, mas sua expressão era uma mistura de frustração e fascínio. "Você é impossível."
"Eu sei. Agora me leve para sua casa."
Nyssa o olhou, uma expressão divertida no rosto, mas sem nenhum sinal de capitulação. "Você vai continuar insistindo nisso, não é? Que tipo de deus da morte troca socos para dormir debaixo de um teto?"
"Eu", respondeu ele, com um brilho de determinação. "Acho que eu mereço ao menos isso. Se não eu, então quem vai garantir que o equilíbrio se mantenha? Quem vai fazer o trabalho sujo? Além disso, foi você que começou, que tipo de deusa é você? eu me pergunto"
Ela bufou, derrotada, mas não disfarçou o sorriso. "Você é insuportável. E, ainda assim... vou ter que te aturar."
Ela se levantou, ajeitando a roupa, e olhou para ele. "Vamos, então. Mas saiba de uma coisa: você não vai me vencer sempre. E eu sou a deusa do julgamento, então não me teste muito, para o seu bem"
Damien a seguiu, sua confiança inabalável, mas sabia que o jogo entre eles estava longe de terminar. Ela não ia facilitar.
“Só uma coisa mais, Nyss”, ele disse enquanto a seguia. “Você mencionou ser a deusa do julgamento. Mas não vai me julgar por ainda querer te irritar, vai?”
Ela lançou-lhe um olhar irritado, mas não disse nada, preferindo se manter em silêncio.
----------------------------------------
Damien e Nyssa caminharam em silêncio por um longo tempo, a tensão ainda pairando entre eles, embora já mais amena. O som das folhas farfalhando ao vento e o farol suave da lua eram os únicos companheiros durante a caminhada. Por fim, o cenário ao redor deles começou a mudar. A densa floresta foi cedendo espaço para uma clareira, e uma construção inesperada apareceu à vista.
A casa de Nyssa não era o que Damien esperava. Não era um simples abrigo, mas uma estrutura impressionante, cercada por uma aura de mistério. As paredes eram feitas de pedras antigas que pareciam ter sido moldadas pela própria natureza, como se a casa fosse uma extensão da floresta ao seu redor. Ela parecia viva, com vinhas serpenteando pelas paredes e flores exóticas desabrochando em torno dela, como se o próprio ambiente tivesse sido encantado para proteger aquele refúgio.
A entrada era uma porta imponente, esculpida em madeira escura, adornada com símbolos que Damien reconheceu, embora não soubesse exatamente o que representavam. Ele se sentiu, de alguma forma, pequeno diante da casa. Era como se ele estivesse prestes a adentrar um lugar com mais poder do que qualquer coisa que ele já tivesse conhecido.
Nyssa, com um passo calmo e deliberado, avançou em direção à porta, virando-se para Damien antes de entrar.
"Bem-vindo", ela disse, a ironia em sua voz, mas havia algo mais ali, algo que ele não conseguia decifrar completamente.
Damien olhou ao redor, seus olhos ajustando-se à escuridão que começava a se espalhar pela clareira. A casa parecia estar envolta em uma névoa suave, que se dissipava ao passar, como se estivesse em sintonia com a própria natureza que a rodeava. Ele, por um momento, esqueceu seu desdém e olhou com mais atenção.
“Então, essa é sua ‘casa’, hein?” Damien disse, ainda com o tom provocador, mas agora com uma ponta de curiosidade em sua voz. “Não é nada mal para uma deusa.”
Nyssa abriu a porta com um gesto elegante, revelando o interior da casa. O ambiente parecia ainda mais imponente por dentro. As paredes eram forradas com tapestries antigos, e o ar estava impregnado com um aroma de ervas e madeira que dava àquele espaço uma sensação de serenidade e poder. Velas flutuavam no ar, iluminando suavemente os corredores que se estendiam para dentro da casa, criando uma atmosfera calma, mas imponente.
Ela deu um passo para dentro e olhou para Damien. “Entre. Não morda a língua agora, por favor.”
Damien hesitou um momento, observando a entrada. Ele nunca se sentira tão deslocado, como se estivesse pisando em um lugar onde não pertencia. Mas, afinal, ele não tinha escolha. Seguindo Nyssa, ele entrou, seus passos ecoando suavemente no piso de pedra polido.
“Isso aqui parece... mais do que uma simples casa. Tem algo em volta disso. Você está me dizendo que isso é seu, ou é algo mais?”
Nyssa lançou-lhe um olhar enigmático. “Eu sou a deusa do julgamento, Damien. O que você vê aqui não é um simples lar, mas uma extensão de meu poder. Cada pedra, cada árvore ao redor, faz parte de mim.”
Damien franziu a testa, absorvendo as palavras dela. Não era apenas uma casa; era algo que transcendia os limites de uma morada comum. A casa parecia ter vida própria, uma energia que pulsava e que se entrelaçava com Nyssa de uma maneira que ele não conseguia explicar.
“Então, a casa também me julga?” ele disse, com um sorriso em seu rosto, mas agora com um toque de fascínio em seus olhos.
“Talvez”, Nyssa respondeu com um sorriso enigmático. “Mas não se preocupe, ela não tem a capacidade de fazer julgamentos tão bons e severos quanto eu.”
Ela se virou e começou a caminhar mais adentro da casa, levando-o a um cômodo espaçoso, onde uma mesa de madeira escura estava no centro, rodeada por cadeiras com encostos altos e ornamentados. Na parede, uma grande janela oferecia uma vista deslumbrante da floresta ao luar, como se o ambiente estivesse suspenso entre os mundos.
"Você vai precisar de descanso", Nyssa disse, enquanto ia em direção a um canto da sala, onde havia uma chaise longue coberta por um tecido macio. "Fique à vontade para descansar. Eu, por outro lado, tenho alguns assuntos a resolver."
Damien olhou para o local que ela indicava, mas ao invés de se deixar cair em um canto confortável, ele se aproximou da janela e se apoiou na moldura, observando o luar que se refletia nas árvores da floresta. Ele ainda estava tentando absorver tudo o que acontecia ao seu redor. O peso das revelações e da missão que o aguardava não desaparecia tão facilmente.
Damien, embora ainda incomodado por não ter controle total da situação, sabia que ela tinha razão. Ele precisava descansar e aprender a lidar com tudo isso. Então, após um breve suspiro, ele se virou para encará-la, determinado.
“Está bem, Nyss. Eu vou esperar. Faça o que tiver que fazer. Mas seja rápida, amanhã pela manhã daremos início.”
Ela assentiu e o deixou sozinho.
Ele ainda não confiava nela nenhum pouco, mas não tinha o que fazer por enquanto, tudo que ele precisava era se preparar.
Puxando o cordão que descansava em seu pescoço, ele segurou o pingente em forma de romã, e despejou sua essência.
Havia algo que precisava falar com sua mãe.