Em um ambiente parcialmente cinza, onde o dia só era dia, porque os feixes de luz penetravam a neblina, havia duas pessoas, paradas, nesse lugar carente de árvores e arbustos. O terreno com sua coloração branca era empurrado gradualmente pela fraca brisa, Minúsculos eram os flocos de neve entre a neblina estendida até a montanha mais próxima.
Ali se encontrava um garoto de pele clara com seus castanhos e curtos fios de cabelo balançando. Estático os olhos claros como o sol, refletiam a pequena e pálida figura em sua frente, uma garota com um longo cabelo branco como a flor de jasmim, olhos de íris vermelhas e gravuras acinzentadas que se espalhavam entre a escuridão da branca e dilatada pupila.
Os dois permaneciam em silêncio e assim ficaram por um longo tempo enquanto as nuvens gélidas iam passando, até que um deles veio a si.
Um pouco desnorteado, desembaçou a vista borrada e olhou ao redor o menino de cabelos castanhos — Mas que porra é essa? O que aconteceu comigo? — questionou pávido.
A dúvida foi motivo para uma pequena risada acompanhada de um sorriso que transpareceu no rosto da garota, o que o assustou.
— Quem é você? — Deu um passo para trás.
— Espere! Não tenha medo. — A garota se aproximou para o acalmar.
— Como não ter medo? Me explique o que está acontecendo! — Gritou as dúvidas que tinha naquele momento não o permitiram pensar sobre a própria situação.
— Eu explico! Se acalme!
— Como eu me acalmo com você gritando comigo!?
— E eu que sei!? Você também está gritando comigo! — Após esse último grito, desferido por ela, os dois respiraram por um minuto.
Usaram o tempo restante, após recuperarem o fôlego, para conversarem melhor.
— Bem, agora que você se acalmou, deixe-me te explicar sobre onde você está. — Tossiu e se concertou — Você está em Loriun, uma passagem para as Almas que não tiveram uma morte pacífica.
— Como assim!? — Além de não entender, suas dúvidas só aumentaram sem sequer dar tempo para que as primeiras fossem respondidas. Isso fez com que a garota novamente gritasse, desta vez estirando os braços, com os punhos cerrados, irritada com aquela situação, logo então se desculpou, abaixou a cabeça e prestou a atenção.
— Agora, sem interrupções… o local onde está, se chama Loriun e você pode até não acreditar, mas... — Inclinou o rosto um pouco à direita e curvou o corpo, completando logo em seguida — Você está morto.
Ela pode até não ter tido a pior das intenções quando falou, mas suas palavras mesmo assim saíram acompanhadas de um sarcasmo que também carregava no sorriso.
— O quê!? — O garoto ouviu, porém, não acreditou e se enervou — Isso não deve estar acontecendo, eu? Morto!? Até agora a pouco, eu estava voltando do colég- — Atônito, sua mente se perdeu em pensamentos, tão quantos poderia digerir.
Em um estado profundo de discorrimentos, começou a lembrar o que lhe havia acontecido antes dali e se assustou com tudo aquilo.
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— Não pode ser, isso não pode ter acontecido! — Gritou ao ser visitado pelas memórias que em repentinos lapsus, responderam sua negação e tudo se tornou claro.
— Vai passando devagar. — Com uma voz intimidadora ao mostrá-lo uma arma de fogo em sua cintura, um homem calvo com desenhos de corpos celestes em sua cabeça e roupas curtas feitas de um tecido fino, ameaçou o garoto.
Calado e sem dizer uma única palavra, o jovem retirou uma ferramenta do bolso, no rosto demonstrava o medo que sentia, lentamente estendeu o braço e entregou ao criminoso o seu aparelho.
Por um curto período, após ter lhe entregue seu bem, pensava estar a salvo do perigo, um sentimento afável tomou conta de si, porém o pior aconteceu. Numa rápida sacada de arma, o bandido atirou três vezes, atingindo o e correndo logo em seguida.
Seus olhos se encheram de lágrimas, a dor de seu tórax perfurado era intensa e o contraía, fazendo-o agonizar.
O toque com o chão só piorou a tortura que gradualmente o afetou, perdendo a consciência entre seus murmúrios de amargura que só alcançavam o duro asfalto, mesmo em gritos de sofrimento, ninguém veio em seu socorro.
— Pobre infeliz. — No escuro, uma figura com um manto negro esfarrapado apareceu, portando uma foice maior que a própria e com a face coberta, falou, colocando sua mão esquelética no rosto dele — A você, mal-querido deste mundo, desejo em seu pós-vida, o fim que não conseguistes em vida. — levantou-se e colocou a foice, no pescoço do coitado em prantos.
Os olhos cheios de lágrimas se ofuscaram, ao passo que a vida em seu corpo se esvaiu, estirado em meio ao frio asfalto de uma noite chuvosa, teve a vida ceifada.
Após aquela última lágrima cair, o ceifador desapareceu na escuridão e levou consigo a alma do garoto, a tirando do mundo ao qual nunca retornaria…
Caiu de joelhos quando relembrou o que lhe havia acontecido naquele dia.
— Não pode ser! Minha vida foi tomada assim!? — falou com a voz rouca, seus olhos perderam o brilho e o rosto ficou pálido, despencando em angústia ao sentir na espinha o frio daquela noite.
— Meus pais, irmãos, amigos, tudo… — Um enorme vazio encobriu seu peito, apertado com força por sua mão, tentando segurar a dor qual nunca havia sentido.
— Não, não pode ser verdade! Isso não pode estar acontecen- — Os olhos não o deixavam negar e lentamente abaixou o rosto em lamento.
— Ei... me diga que isso é ment- — Interrompido novamente pelo próprio choro, abalado, não conseguiu reagir a todas as emoções e sentimentos intensificados.
O máximo que pôde fazer foi continuar despejando através de suas lagrimas, as memórias felizes e tristes que eram lembradas a cada instante.
O silêncio imperceptível de seu choro desapareceu quando o clima acinzentado se escureceu, a leve brisa gélida se tornou uma ventania e o ambiente ao redor do pobre infeliz mudou.
A garota, olhou para as nuvens que do alto circundavam o local onde estavam, notou uma grande espiral com o centro direcionado ao garoto em sua presença, devagar se aproximou, já não mantendo um sorriso no rosto, a distância de um passo se agachou e colocou a mão direita em seu ombro e a outra nos cabelos.
Ao percebeu o tocar daquelas delicadas e macias mãos, seu choro se amenizou e virou lentamente o rosto, olhando-lhe, sentiu em sua expressão, pena.
— Eu sinto muito, não posso dar a resposta que você quer, só posso esperar que aguente essa dor. — disse em palavras que logo foram envolvidas por um gentil e repentino abraço.
Em prantos, não conseguiu se expressar e somente a ouviu, sentiu o calor daquele abraço, apartando o frio que vinha de sua Alma.
— Mas não se preocupe, esse não é o fim, me perdoe por lhe dar uma resposta tão insensível, é que tem tempo que não converso com ninguém, esse lugar vive vazio, então acredito que perdi a sensibilidade… me desculpe. — Em palavras francas, enquanto acariciava seu cabelo, amenizou um pouco da tristeza que ele sentia.
— Eu só queria que tudo isso fosse, um sonho... não queria qu- que terminasse assim… mãe… pai…— falou o garoto que com a mão pressionava ainda mais o peito, tentando suportar a dor que sentia.
— Entendo.
Desse momento em diante, só se ouviu o pobre infeliz em suas lamentações, despejando os arrependimentos que não pode consertar em vida, os momentos que perdeu, as dores e sentimentos que tinha no presente.