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Capítulo 3: Uma Trama

Uma Trama

Miguel estava estático com os olhos voltados ao chão, sem piscar ou se mexer um centímetro sequer, mesmo que acima dele estivesse acontecendo uma cena estranha e irreal.

Isabella, com suas asas prateadas, recebia um poderoso golpe nas costas de um velho mafioso de barba cinza.

Esse golpe desferido na lombar qual estilhaçou algumas costelas somente com a pulsação do ar que o acompanhou, não foi cem por cento efetivo, pois com a força de vontade em não ter sua existência apagada, a garota de cabelos brancos usou o impulso para girar-se e com partículas que formaram uma casca prateada, ricocheteou-se do punho fechado que estava prestes a tocá-la.

O abrupto impulso naquele escudo a jogou longe, fazendo com que caísse a uma distância considerável, expelindo um líquido cinza de emaranhados com alguns restos que provavelmente eram comida.

— Droga! — O velho agora se via com as roupas manchadas com aquele líquido.

Pairou lentamente até o chão e descartou no meio do processo o sobretudo preto manchando.

Isabella estava acabada, seu olho esquerdo estava fechado e o direito, avermelhado, ficou semiaberto.

Arfava sem parar com as pernas trêmulas e com suas forças deixando seu corpo, se esforçando para manter-se sã.

— Quem é esse desgraçado!? O que ele quer de mim!? Por que tem um anjo aqui!? — Encheu-se de dúvidas e não conseguiu manter o foco na figura à sua frente, a qual já não enxergava direito e que subitamente apareceu em sua frente.

— Ma- Mas O- Quê!? — De repente sua visão se escureceu e de frente aquela sufocante e poderosa energia extravagante apareceu.

— Na- Não! Eu vou morrer!? Na- não! — Isabella caiu em lágrimas, suas forças se foram e o escudo dourado entre eles se desfez com ela caindo de joelhos em seus pés, nada que fizesse ou tentasse, surtiria efeito, aquele era o fim.

A pesada mão esquerda daquele anjo que carregava grande poder agarrou o pescoço dela e a suspendeu.

— A- Argh! E- Eu na- não! Me de- desculpe, Me- Mestra — O corpo pesou como se na corda de uma forca estivesse amarrada, suas pequenas e frágeis mãos se debatiam puxando aqueles gigantes dedos com todas as forças que tinha, mas nem sequer os fazia tremer.

Ele não esperou as últimas palavras, mas quando fechou mais a mão, prestes a esmagar-lhe o pescoço, foi surpreendido por um nome que saiu de sua boca.

— Mi- Mirabelle.

— Oque!? — Subitamente a força que colocava cessou e uma questão enorme apareceu — Como sabe esse nome!? — perguntou ao passo que abriu a mão.

Isabella, se viu livre antes de cair em inconsciência. Seu nariz secretava uma gosma prateada, sua boca estava coberta com um líquido de mesma cor, os braços e pele estavam cortados e arranhados pela pressão da energia que a acertou e os olhos se encontravam fechados.

— Responda!? — Em meio ao espanto, suas ações ficaram deturpadas, mas logo a visão bagunçada se restaurou e percebeu que a garota não se encontrava mais consciente.

— Quantos mais infortúnios ainda tem que me acontecer hoje? — Colocou a mão sobre o rosto e fechou os olhos, apontou a palma da mão aberta para ela. — Melhor não pensar muito nisso, deixarei essa situação para depois.

Pequenas partículas douradas saíram e a envolveram, os fluidos que a rodeavam foram se desfazendo entre as partículas e em poucos segundos estava limpa, ele então colocou a bruscamente no ombro direito e virou para Miguel ali ao lado.

Silenciosamente o Anjo braceou o terno negro e tirou com a mão direita os flocos de neve que caiam e se aproximou do jovem.

Retirou Isabella do ombro e a colocou deitada no chão. Virou-se e olhou para Miguel.

Aproximou-se com a mão e a estendeu sobre a cabeça dele, soltando os pensamentos que tinha em voz alta — Almas que são clementes a Deus não podem ser perdidas, naquele momento tu não estavas destinado a morrer, o que houve para que viestes parar aqui? E… por que não está morto? — Segurou em seu ombro e em baixo tom entoou palavras que não se podia traduzir, suspirou e completou com um pesar na voz, pois sentiu algo nele. — Se Deus não o quis dar-lhe o devido descanso, significa que ainda há muito o que se fazer neste mundo.

Aonde quer que tenhamos que ir, espero que não perca sua fé.

Miguel não ouviu nem percebeu nada, seus sentidos estavam bloqueados, nada entrava ou saía de seu corpo além do ar ao respirar, mas sua alma recebeu naquele momento um grande poder e seu corpo algo que usaria futuramente…

Logo após retirar a mão dos ombros dele, voltou-se para Isabella — Ela é um ser qual a energia está presa e sua essência é parcialmente corrompida, eu deveria a eliminar, porém, tem algumas questões que precisam de respostas.

— Agora… — Olhou para a porta. — Estar no Supramundo não é algo que um humano pode aguentar, sua alma precisa de essência para sobreviver aqui… — Pausou por um par de segundos e olhou para Isabella novamente. — Uma fonte de essência que aceite coexistir com a energia volátil e em crescimento da alma de um homem incompleto… — Sua atenção voltou-se a Miguel e depois a ela novamente e pensamentos que teve geraram uma expressão duvidosa.

— Você está pensando o que eu estou pensando?

Uma voz fina apareceu subitamente atrás de seu ouvido, os delicados lábios que chegaram cobertos por um batom vermelho, foram empurrados pela grande mão do anjo. — Não tente me importunar! fedelha. — Após a empurrar, deu atenção ao ser que havia aparecido, uma menina trajada em curtas roupas de couro, um casaco azul-marinho, um curto short jeans de cor igual e uma camiseta com tons vermelhos, composta de alguns tecidos finos e no dedo anelar esquerdo um anel de latão, tinha olhos verde esmeralda e pele clara, corpo estreito e magro com duas marias chiquinhas loiras e caninos longos e acentuados.

— Se já não bastasse você ter aparecido quando este jovem desapareceu, agora vem até mim com sua lábia, se não fosse a forte ligação que ele tem contigo, eu já a teria eliminado.

— Ei! — A garota que não só foi jogada longe, como caiu no chão, logo levantou-se. — Eu tenho um nome! Sabiá? — Emburrada, colocou os punhos fechados sobre a cintura.

— É mesmo?

— Olha aqui! — Em uma velocidade estúpida, ela se aproximou, partindo o ar entre eles, tão forte era que o garoto sentado no chão rolou e parou com as pernas para o ar. — Me chame de Emília! E-MI-LÍ-A! Seu velho! — Gritou colocando o dedo na cara dele, empurrando o seu nariz.

— Com quem acha que está falando?! — Enfurecido, bastou o grave de sua voz aumentar para o ar pesar, e Emília ser empurrada para longe.

— Ih… Vanderlei, está estressadinho? — caçoou mostrando-lhe a língua e enquanto flutuava, virou o corpo e começou a balançar em sua direção — Velho fraco! Velho fraco!

— Como ousa caçoar da minha cara!? Vou cravar o que é respeito em sua alma!

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Uma energia quase transparente que circundava Vanderlei, começou a se reunir em seu corpo, uma luz advinda da junção de milhares de micropartículas douradas, como se um grande poder estivesse para despertar, seus olhos fecharam por um momento, os curtos cabelos brancos começaram a subir e as partículas se reuniam numa ascendente curva para o alto, até que ele abriu os olhos e uma pulsação começou a se propagar pelos cantos, e as partículas se dispersaram empurrando a neve ao seu redor.

— Hoje é o dia de sua segunda mor- — Antes de completar sua extravagante apresentação de poder, foi interrompido por uma visão inacreditável.

Emília, que não deu a mínima para o show espalhafatoso, virou-se e foi em direção a Miguel, pegou em suas mãos, virou-se para Vanderlei e em seguida o beijou, voltou-se novamente para o anjo e o mostrou a língua e levantou o dedo do meio.

— Su- Sua ABOMINAÇÃO!!! — A fúria em suas palavras foi tão grande que toda a neve ao seu redor foi empurrada para longe, o chão se partiu e os Marcos de pedra racharam se esfarelando junto a energia dos seres de outro mundo.

Em um salto sua mão foi no pescoço do espírito, o levantando.

— Ei! Você sabe muito bem que não tem como ele sobreviver ali sem essência! — Gritou Emília, que estava a um fio de desaparecer, sentindo o calor das brasas que emanava dos olhos daquele anjo enfurecido.

— Eu te fiz um favor! — Tossiu e sem conseguir abrir a mão que a enforcava, escorregou — vocês anjos seguem muitas regras chatas, e ficam pensando se podem ou não interferir e no final… acabam não fazendo é nada.— Em uma pequena pausa, mesmo sofrendo com a dor de seu pescoço apertado, desviou o olhar para Miguel que tinha uma camada imperceptível de partículas vermelhas ao seu redor e no meio de seu peito, um desenho de duas espadas gêmeas se formando.

Os olhos do senhor a acompanharam, e a mão que uma vez a levantou brutalmente, agora a descia com cuidado.

— Mesmo assim não acho que deveria ter o colocado um fardo tão grande, cuidar da própria alma é algo difícil, quanto mais da dos outros. — caminhou até o garoto. — E mesmo que fosse, humanos são fracos, a tentação os corrói e a sede por realizar seus desejos, mesmo que não sejam seus, os corrompe… e você! — Apontou para ela e depois virou-se. — Você não é o melhor exemplo de espírito puro para ele!

Caminhou até Isabella. — Eu tenho muito o que fazer, então isso é uma oportunidade para mim.

Emília Tossiu e escarrou. — Oportunidade? — cuspiu e começou a massagear a garganta que estava doendo.

Ao se aproximar de Isabella pegou-a em seus braços, endireitou-a e quando estendeu a mão direita, subitamente ela transformou-se em uma esfera de energia que flutuou até sua mão e quando a fechou, a energia desapareceu.

— Sim, agora que você se comprometeu a dar sua essência a ele, não preciso me preocupar tanto, parece que grandes provações aguardam ele em um futuro próximo, eu precisaria ir com ele, mas como você se ofereceu, vou poder me ausentar por um tempo, preciso de respostas dos meus superiores.

— Bem, espero que lhe respondam dessa vez, Lorium não deveria ter sido apagada? Lembro que a Ordem tinha destruído ela, ninguém além dos antigos Custodis e Arcanjos deveriam citar esse nome, tem os espíritos que viviam lá, mas… sabemos que não sobraram muitos. — Falou Emília.

— Sim, além de estarmos em Tusseras, não estamos nem mesmo perto de onde Lorium ficava. — Olhou para as montanhas daquele vale onde estavam. — Esse lugar sequer deveria ser habitado… Não há o que fazer sobre isso, sem os mapas estelares não teríamos nem chegado aqui a tempo. É muito estranho isso, ele está tão longe da terra e Lorium ter sido mencionado por esta coisa. são tantas informações aparecendo ao mesmo tempo, é como se- — Vanderlei se afastou e caminhou até a porta e pôs a mão sobre ela.

— Você sabe onde essa conexão vai dar, né? — Perguntou Emília.

— Se a energia que ela emite for realmente a que aparenta, ela vai para as bordas do universo, onde o abismo está.

— Sabe que em tese nem minha essência o salvaria lá né?

— Sim, Estar no Supramundo e estar vivo é algo inexplicável, eu sinceramente não consigo pensar o que pode se suceder com ele.

Por alguns segundos os dois ficaram em silêncio.

— Vandaliel. — Emília chamou o anjo por outro nome, o qual a olhou com estranheza. — não precisa temer por nada! Você sabe que depois de tudo, o supramundo só é perigoso para aqueles que a essência está selada, mas como agora ele tem “mua” para o prover essência, tudo vai ficar bem! — falou sorridente e brincalhona apontando para si mesma.

— Não é isso fedelha, você não presta atenção aos fatos?

— O quê é então? Você poderia estar preocupado com os portões? Sabe que aqueles portões foram perdidos junto a maioria das conexões, além de sempre terem sido estranhos! O único lugar próximo a o abismo é Nura, Iremos ou parar lá! não tem erro.

— Você não entende o porquê da minha preocupação Emíliare! Nura é um lugar sem leis, mas não seria nada difícil para ele viver na terra daquelas largatixas. Coloquei no jovem um estigma deles, Desde que não se envolva com nenhum daqueles calangos inteligentes, pode até mesmo viver lá sem minha companhia, mas você não entende onde eu quero chegar… porque Emíliare!? porque ele está aqui!? Como ele chegou no Supramundo e o porquê de Mirabelle ter sido citada por um espírito após Setecentos anos!!! — Deixou a emoção transparecer nas últimas palavras, ao colocar a mão sobre o rosto novamente.

— Por quê? Eu achei algo normal, no mundo normal não citam demônios, anjos, caídos, espíritos, almas amaldiçoadas e rituais satânicos a todo instante? — Emília respondeu indiferente, enquanto flutuava ao redor dele de ponta a cabeça.

— Ainda não entendeu? O nome não é tão importante! Mirabelle! Mirabelle é importante! Sabe quem é Mirabelle e sabe muito bem o que fez com os portões nos primórdios, as antigas conexões e o que a Ordem quer! Tem ideia do que aconteceria se o portão do abismo tiver sido reconstruído por ela!? Pior! Se respondesse ao desejo dela?

— Hein? Pera… Vo- você acha que ela!?

Demorou a raciocinar, pois tinha muitos anos de memórias em sua mente para separar até achar alguma que fosse de encontro com a preocupação do velho, mas ao perceber o porquê de Vandaliel se preocupar tanto, Emíliare entrou em um pânico tão grande que desfez o feitiço e as brincadeiras e ficou em pé. — não pode ser!

— Sim, pode, por isso preciso ter uma audiência com os Custodis atuais, não… Na verdade, preciso levar essa “coisa” e perguntar diretamente a um dos Arcanjos…

— Pera! Se você estava cogitando algo tão perigoso assim, porque está aqui ainda!? Precisávamos mesmo ter feito todo esse teatrinho!? — A pequena espírito de cabelo loiro colocou as mãos na cabeça e começou a andar de um lado para o outro. — Aí! Aí! Aí! Se a Ordem estiver tramando alguma coisa no Abismo ou se aproveitando das conexões que restaram! Não pode ser! Não pode ser!

— Se acalme! Você deve saber como ninguém que eles somente não respondem mais ao Conselho das Doze Casas e mais, não tem porque pensar que adiantaram o dia do julgamento, não depende deles, Jesus é muito paciente e Misericordioso com os humanos e seus erros. Estou preocupado com os movimentos dos Demônios em Nura, aquele lugar nunca foi guardado devidamente devido à existência dos dragões e da proximidade com o abismo, se a Ordem também estiver se movimentando naquela regiã- eu não sei. Preciso de respostas.

— Quem liga pra isso!? Mesmo que não seja para adiantar, sabe o que pode acontecer se a Ordem voltar justamente quando o número de almas realmente dissidentes é maior que o de inconscientes!? Eles estavam exilados!

— Sim, tenho certa ciência…

— Então o que está fazendo aqui ainda? Sabe quantos meses você vai demorar para chegar em Sansigro!? Você está louco se continuar aqui! — Em um clarão vermelho, Emília desapareceu e a marca no peito de Miguel emitiu um brilho.

Das pequenas espadas cruzadas uma voz saiu. — Eu vou cuidar dele, não tenho boas lembranças do Abismo, nunca sequer pisei em Nura e se Mirabelle estiver lá eu também não sei o que fazer! Mas se o que estiver pensando for verdade… protegê-lo daquelas cobras arrogantes e de alguns espíritos malignos não é o maior dos meus problemas.

O anjo ao ver o ato, esticou os braços para os lados e várias partículas por toda a região, se juntaram, milhares de pontos dourados voaram até o seu corpo que se expandiu ao alto, até que não era mais possível ver sua face, somente o emanar da luz sagrada que o circundava era perceptível, pois o interior daquela luz era desconhecido até mesmo aos olhos dos espíritos.

— Eu nunca vou me acostumar com isso. — Emília ao redor de uma enorme esfera em chamas, um espaço onde se encontrava a alma de Miguel, via aquela transformação exuberante por uma espécie de janela quadrada.

— Obrigado. — A voz que ecoou como um trovão foi seguida do vento sendo partido e retorcido pela velocidade do movimento do ser de outra realidade deixando aquele local.

— EEEEEEEEIIIIIIII! — Gritou a pequena que, no simples desaparecimento do anjo, foi arremessada com o garoto em direção às montanhas.

— Ainda estamos aquiii!

— Na- Não! — Sua coragem em brincar com um ser tão poderoso não vinha de idiotice aguda, uma luz mais forte emanou da marca, um escudo vermelho se formou, uma bolha que protegeu Miguel.

— Esse velho louco! — Gritou enquanto rodopiavam pelo chão após ter amortecido o impacto, rolando até perto da porta — Como ele pode fazer isso!?

O Espírito olhou para a situação assustadora à qual tinha se metido — porque eu tenho que ficar me metendo em tantos problemas? — frustrada, ficou quieta com a esfera ainda energizada.

— Ele nem tirou a paralisia dos sentidos! — Grunhiu e sussurrou desfazendo a esfera e se materializando no chão e olhando para o garoto pairando no ar.

Agarrou-o antes que caísse e o abraçou por um par de minutos.

— Eu queria tanto poder ficar assim contigo por mais tempo, lhe ver acordar, lhe abraçar mais…— O colocou na mesma posição em que estava antes, ficou de costa para a porta enquanto ela acariciava seu rosto e arrumava o cabelo. — Lembre-se de nossa promessa. — Enquanto olhava para aqueles olhos de preocupação, a energia que emanava entrou no corpo do garoto e ela começou a desaparecer, sobrando somente as lágrimas que caíram no rosto de Miguel quando acordou.