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Capítulo 1

Eu sou Uri

A manhã era ensolarada, com pássaros cantando, um clima perfeito para não fazer nada além de dormir. Esse era o plano de Uri até o travesseiro voador acerta-lo com força. Sonolento e lutando para abrir os olhos, Uri nota o invasor que disparou o projétil, interrompendo assim, seu momento sagrado.

— Isso era mesmo necessário Karon?

Dando de ombros, o jovem invasor sorri imponente parado a porta. O que ressalta seus um metro e noventa, pele morena clara em forte contraste, com tranças de um cabelo extremamente escuro na altura de sua nuca; Sem dúvida um típico membro do clã Hakimi.

— Se não fosse porque eu faria irmãozinho? Vamos logo, se você se atrasar o pai e a mãe pode até fazer vista grossa, mas Ariel vai ficar desapontada. Quer correr o risco de desapontar Ariel?

A menção de sua irmã mais velha expulsa de Uri todo resquício de sono. Não era nada bom deixar Ariel irritada.

Com passos vagarosos e amaldiçoando por não ser o filho mais velho, ou pelo menos o filho do meio, Uri se arrasta para o banheiro. Um banho revigorante, uma capa cinza sobre sua túnica e calça pretas, e Uri sai novinho em folha de casa, relaxado e pronto para encontrar seus irmãos, esperando na estrada de pedra em frente sua casa.

Uri notou assim que deu um passo pra fora, a figura mediana com ar autoritário que de maneira impaciente batia o pé, com braços cruzados para aliviar o óbvio estresse que suas sobrancelhas franzidas revelavam. Seus cabelos trançados, se espalhavam como uma cachoeira escura sobre a capa azul clara, o que combinava perfeitamente com sua túnica e calça preta. Seus olhos eram de um preto profundo, como o de seus irmãos.

— Você está atrasado — disparou Ariel assim que Uri se aproxima.

— Eu sei, foi mal... dormi demais e perdi a hora.

— Você precisa ser mais responsável Uri, senão por você que seja pelo pai e a mãe.

Revirando os olhos Uri pergunta mudando o foco do assunto.

— Será que Klaus e Agatha estarão lá? — a mudança na expressão de Ariel e Karon foi imediata, o que deixou Uri interiormente satisfeito."Haha tão previsíveis! Quem não sabe qual o ponto fraco de vocês?".

Notando o sorriso e olhar conhecedor de Uri, Ariel foi a primeira a se recompor; rispidamente virou caminhando apressada pela estrada principal. Karon caminhou logo atrás imerso ainda na questão indagada, enquanto Uri os seguia sorridente.

A estrada cortava toda a propriedade do clã Hakimi, levando ao muro exterior do Palacete do clã. Feita de pedras azuis claras, era um dos marcos do clã.

Não demorou muito para que o trio, notasse os vários descendentes e associados que inundou a estrada principal rumo ao palacete.

— Parece que o registro desse ano vai ser tumultuado, mais pessoas do que o normal estão determinadas a tentar a sorte — Karon comenta preocupado.

— É natural, desde que o ancião supremo voltou da assembleia dos Clãs, é garantido que haveriam recompensas que valem o esforço do registro — Ariel explica, claramente preparada para esse fato e aparentando não se importar com as mudanças.

Depois de andar por quase três horas, finalmente eles avistaram o Palacete. Rodeado por um muro externo de nove metros de altura, suas torres despontavam majestosas. A praça em frente ao Palacete era espaçosa, mas Uri e seus irmãos já podiam ver o número imenso de pessoas aglomeradas no ambiente. Uns formando grupos de cinco ou mais, outros quietos e sozinhos. Expressões determinadas podiam ser vistos em vários semblantes.

— Tumultuado é efeumismo! Com certeza eu não passo esse ano — declarou Uri já aceitando sua derrota.

— Uri por favor, se papai ouvisse isso, o que

ele diria? A imperseverança é a marca do fracasso. — diz Karon numa imitação crua da voz barítona de seu pai.

— Acho que Uri não queria dizer que não vai tentar Karon, só que será complicado. Enfim vamos dar o nosso melhor — disse Ariel olhando avidamente para o pedestal de um metro, posicionado em frente as portas azuis metálicas do palacete.

O tempo passou e mais pessoas chegavam a cada minuto. Quando a multidão preencheu todos os cantos da praça, as portas do palacete se abriram. Um grupo de anciões, Três homens e duas mulheres, vestidos com túnicas azuis bordadas com o símbolo do clã acima do peito esquerdo, saíram encarando a multidão.

O ancião que estava no meio, com uma postura imponente, deu um passo a frente e começou a falar:

— Todos sejam bem vindos a mais um ano. Porém esta não será apenas mais uma inscrição. Esse ano devido a circunstâncias que anteciparam o torneio trianual dos Clãs, o conselho de anciões duplicou as recompensas. O que nem preciso dizer aumentou a dificuldade proporcionalmente.

A declaração arrancou murmúrios da multidão. Todos estavam animados, apesar do fato que muitos não passariam. Óbvio que só a elite brilharia, e cada participante estava confiante em si mesmo.

— A ordem dos testes será invertida para ganharmos tempo — continuou a explicar — A prioridade será eleger os mais habilidosos, e por isso o teste de linhagem será realizado primeiro. Os mais aptos ganharão o direito de competir, pelas vagas desse ano. Os descendentes que passarem com louvor por todos os testes não só iniciarão como membros dos ramos secundário e primário, como também poderão representar o clã no torneio trianual. Desejo a todos boa sorte, e que os capazes vençam!

A multidão ficou extremamente inquieta e silenciosa com essa declaração. Os testes revelavam a densidade do código de linhagem de um indivíduo. Ou seja quantas runas de linhagem havia no código de cada um. Cada código era passado dentro de um clã por nascimento ou por meio de selos, comprados com serviços meritórios. Cada clã tinha um código de linhagem específico formado por várias runas. Com o passar do tempo devido a vários fatores, os códigos poderiam se fortalecer ou se enfraquecer dentro de um ramo familiar. Escolher aqueles com a linhagem mais completa possível, garantia que os escolhidos pudessem num futuro próximo manifestar as técnicas únicas do clã. Os de concentração média e alta, seriam aceitos imediatamente no ramo principal e secundário sendo mudas boas para o clã investir. Aos de baixa concentração, só restava ingressar no ramo terciário e no futuro cuidar dos negócios do clã.

Adiantando–se perante a multidão ainda agitada, uma das duas anciãs, colocou uma esfera pequena no pedestal e disse:

— Atenção! Formem uma fila, e um de cada vez coloque a mão direita na esfera de leitura. A esfera lerá o código de linhagem e identificará quantas runas há no código. Quanto mais runas houver, mais intenso será o brilho da esfera. Conforme a esfera reagir, nós classificaremos cada um de vocês.

Ninguém perdeu tempo, e poucos segundos depois, uma tentativa de fila foi formada em frente ao pedestal. Um por um, todos começaram a fazer o teste.

O processo era rápido, e pouco tempo depois um quarto das pessoas da praça havia feito o teste. A grande maioria conseguiu fazer a esfera brilhar, sendo minoria aqueles que arrancaram um brilho intenso. Somente um descendente teve um desempenho fenomenal a ponto da esfera brilhar tão intensamente que parecia um pequeno sol, quase cegando todos na praça.

Uri olhava com apreensão e expectativa para o pedestal. Muitos não receberam um brilho decente da esfera, o que o deixou com medo e incerteza conforme o tempo passava. Ninguém sabia ao certo porque os códigos de linhagens se deterioravam ao longo do tempo, prejudicando a passagem de pai para filho.

A teoria mais aceita é que devido ao fato das runas não conseguirem absorver a fons ambiente, o código seria desgastado ao passar do tempo se o usuário não desenvolvesse as técnicas do clã, alimentando assim as runas com a sua própria fons.

O medo de Uri não era injustificado. Ele próprio tinha uma teoria que complementava a ideia popularmente aceita. Uri achava que o problema era o fato de que os códigos de linhagens foram projetados como sistemas complementares que só poderiam agir como auxiliar nas técnicas secretas do clã. Isso limitava qualquer mudança significativa que pudesse fortalecer a linhagem. Era até mesmo um tabu falar em pesquisar uma linhagem rúnica centenária, quanto mais ter ideias de desenvolvimento.

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Claro toda regra tinha uma exceção. Havia pequenas brechas na tradição. O ramo principal, formado pelo patriarca, anciões e seus descendentes primogênitos, poderiam considerar tal coisa, com a permissão do conselho do clã. Nem mesmo o patriarca poderia pesquisar o código de linhagem diretamente, sem o apoio da maioria do conselho.

Mesmo que Uri tivesse uma direção geral para seguir, ele mesmo não poderia nem sonhar em verificar o código. Ainda que tivesse uma noção média de teoria rúnica.

— Ei! vai nos fazer esperar o dia inteiro?!

Uri foi tirado de seus devaneios ao ouvir o jovem de sobrancelhas franzidas exclamar atrás dele.

Com um olhar envergonhado, deu passos rápidos em direção ao pedestal. Seus batimentos cardíacos acelerou a ponto dele ouvir seu próprio coração. Estendo a mão tocou na esfera, sentindo instantaneamente um calor por todo seu corpo. A sensação perdurou por vários segundos e depois do que pareceu uma eternidade, a esfera pulso com uma luz fraca, mal dava para notar a mudança.

Um minuto passou, a esfera estabilizou num brilho constante porém muito fraco, uma das piores reações possíveis. O sentimento sufocante no peito de Uri veio mesmo ele esperando esse resultado.

— Sério só isso? Essa enrolação toda pra... isso? — zombou o Jovem que Uri irritou com sua demora.

— Acho melhor você ficar quieto. — disse Karon já bravo.

— Ou o quê? O que será que você vai fazer amigo? Se é parente desse inútil não há muita esperança que...— o jovem sentiu um vento passar pelo seu corpo, o movimento tão rápido que o fez perde a voz.

Uma linha vermelha surgiu no seu pescoço, uma gota de sangue escorreu da ferida. Petrificado ele ficou encarando trêmulo a figura que surgiu do nada em sua frente. A fina espada azul escura feita do elemento gelo, em sua mão direita, a fazia parecer uma fada mortal.

— Se falar assim do meu irmão, te dou minha palavra que arrancarei sua cabeça. — Ariel anunciou a sentença devagar, seu tom de voz mais frio do que o construto elemental de gelo que empunhava.

A multidão ficou estupefata, até os anciões ficaram de boca aberta. Além da velocidade surpreendente, o controle elemental de Ariel foi um choque para todos. Ser capaz de manipular as partículas elementais sem atingir o primeiro nível de cultivo, somente contando com sua linhagem rúnica, tornava Ariel um gênio.

— Basta! Você vai para o fim da fila, quanto a senhorita não é necessário fazer o teste, e seu irmão também não. Vocês três podem vir comigo — disse o ancião que anunciou os testes.

Uri sentiu o calor do cuidado de seus irmãos. Em um grande clã onde o interesse pessoal era colocado acima de qualquer coisa, lá estava o excelente trabalho de seus pais.

— Isso não é justo! Essa escória quase arrancou minha cabeça por causa desse lixo inútil e você...— o jovem se sentindo injustiçado tentou protestar, quando uma luz branca azulada iluminou seu campo de visão. Tudo aconteceu muito rápido, no momento em que ele falava Ariel gesticulou com sua espada, uma rajada fina de energia fons na forma do elemento gelo, se condensou em uma meia lua disparando na direção da cabeça do jovem.

Quando estava prestes a decapitar o jovem, o golpe foi parado. Aparecendo na frente do jovem o ancião segurou com a mão nua o golpe de energia que vibrava em sua mão direita. Com um aceno ele dissipou o golpe, fazendo os presentes respirarem fundo.

— Eu disse basta! Recue para o final da fila. E você senhorita, atacar outro membro do clã com a intenção de matar, é estritamente proibido, saber as leis do clã é o mínimo que se espera de todos! Qual a desculpa para sua ignorância?

Mesmo sendo questionada pelo ancião, Ariel continuou com uma expressão normal no rosto, sua calma estampada em sua face. Uri e Karon passaram a temer pela segurança de sua irmã, afinal as regras do clã eram a dignidade do clã.

— Lealdade e a minha palavra, são os tesouros que prezo acima de tudo. Minha lealdade é para com os meus, e farei de tudo para cumprir minha palavra. Eu dei uma chance a ele, mas ele não aceitou. Ele perder a cabeça é problema e escolha dele, não minha.

— Isso... — o ancião ficou sem palavras, a postura firme de Ariel conquistou o respeito de todos, o olhar de aprovação dos anciões era nítido. "Essa garota vai me matar de susto um dia! Eu aqui preocupado e ela desafia o ancião?!" Uri não pôde evitar pensar com um sorriso amargo.

O Jovem trêmulo de raiva e vergonha, deu um passo a frente e com arrogância disse:

— Vocês sabem quem eu sou? Eu sou Dario Hakimi neto do grande ancião! O que você acha que vai acontecer quando eu contar ao meu avô sobre a humilhação de hoje e a tentativa de assassinato dessa escória? — o jovem presunçoso e altivo olhava complacente para todos ao redor, o terror no rosto de Karon e Uri, o agradou muito. A multidão se agitou com essa nova revelação, alguns até olhavam para Ariel com pena. Mas sua expressão indiferente e fria permaneceu estampada no rosto. Era óbvio que Ariel não tinha medo.

Quando a tensão aumentou a ponto do desconforto ser palpável, para horror de Dario uma gargalhada calorosa foi ouvida neste momento. Parecia que vinha de todos os lugares, ao mesmo tempo que não vinha de nenhum lugar específico.

— Ancião Malcon, coloque o encrenqueiro do meu neto no seu devido lugar, no fim da fila. Se ele ousar resistir quebre um de seus braços.

Quanto a esta jovem... as regras do clã devem ser mantidas, se você se arrepender, e mostrar sinceridade, vou deixar o que você fez hoje passar, o que me diz?

"Ufa Ariel está salva desta confusão, que bom que ela não se encrencou ainda mais por minha causa" pensou Uri. Karon já exibia um sorriso tranquilo. Quando finalmente Ariel respondeu:

— É uma satisfação ser vista pelo grande ancião. Porém não me arrependo de nada dito ou feito! Além de saber as regras do clã, eu sabia que era impossível matar um descendente aqui. Atacar seu neto foi uma ação que fui forçada a fazer. O único responsável é ele.

— Minha jovem você não acha que está sendo muito arrogante? — o tom frio na voz do grande ancião fez com que o silêncio no ambiente fosse instantâneo. Uri e Karon petrificados, olharam suplicantes para Ariel. Mas ela iguinorou o olhar dos dois e disse:

— Arrogante? Não esse é o privilégio dos fortes. Ainda estou longe de um estado que possa justificar arrogância. Meus princípios me definem. E sou fiel ao que acredito, é simples assim.

— Hahaha esse velho achou uma joia interessante! Qual o seu nome menina?

— Ariel Hakimi — respondeu sem exitar.

— Bom muito bom, você é talentosa, de excelente caráter, e obstinada. Ariel você conseguiu impressionar esse velho! Por isso não receberá nenhuma punição desta vez. Mas se você ousar desrespeitar as regras do clã outra vez terá que se ver comigo fui claro?

Juntando os punhos a altura do peito, Ariel se curvou para a frente e disse:

— Por respeito a os anciões e as regras do clã, prometo que nos terrenos do clã não encostarei em um fio de cabelo dele, mas se eu e ele nos encontrarmos fora da propriedade do clã, que o melhor sobreviva! — suas palavras causaram calafrios na multidão, e Dario suou frio. Era óbvio que ele nunca se igualaria a Ariel, a não ser que por um golpe de sorte ele se depara-se com um tesouro de desafiar o céu, ele jamais teria o mesmo nível de habilidade dela. Derrepente ele começou a se arrepender de ter caçado confusão com alguém talentosa e pelo visto louca, afinal ele só xingou o irmão da garota, o normal não seria ele ser xingado de volta? Não adiantava chorar pelo leite derramado, e conhecendo a personalidade de seu avô, sabia que estava por sua conta. Com passos desanimados foi para o fim da fila.

— Hum... certo, que lá fora sobreviva o melhor. Ancião Malcon traga esta jovem e seus irmãos para minha Ala.

Surpreso pela ordem e ponderando em suas implicações, o ancião se curvou com os punhos sobre o peito dizendo:

— Como comanda Grande Ancião. Levarei eles imediatamente.

— Os outros prossigam com os testes conforme planejado. Anciã Duran ficará responsável pelos arranjos finais.

Ouvindo isso, a anciã que colocou a esfera no pedestal se curvou e disse:

— Como comanda Grande Ancião! Todos retomem o teste, o próximo a ser testado apresente-se!

Virando para o trio, o ancião Malcon gesticulou para que eles o seguissem. Perante olhares de curiosidade da multidão, Ariel e Karon, seguidos por Uri, subiram as escadas do palacete adentrando assim pelas portas metálicas centenárias.