Eldoras era o tipo de lugar que parecia imutável, um vilarejo isolado cercado por campos e bosques, onde cada dia se repetia como o anterior. Não havia luxo, apenas a simplicidade de uma comunidade ajudava uns aos outros a sobreviver.
A manhã foi reconhecida pelo som do galo cantando, o ranger das carroças e o som das ferramentas de ferro. As pessoas cuidavam do gado, costuravam roupas e preparavam refeições ao redor do poço central. As crianças corriam descalças pelas ruas de terra, brincando de esconderijos entre as casas de madeira e pedra.
Kael era um jovem de quatorze anos, conhecido por seus cabelos bem pretos. Era um jovem curioso e inquieto, mas agradável de ritmo simples. Ele ajudava nos pequenos reparos da casa, fazia entregas para os vizinhos e, quando sobrava tempo, se dedicava ao seu passatempo favorito: esculpir madeira.
Enquanto Kael andava pelo vilarejo, ele avistou Gerrin, um caçador que antes era um guerreiro. Gerrin estava montado em seu cavalo robusto de pelagem avermelhada e crina escura. Sobre a sela, havia um veado abatido, o resultado de mais uma de suas caçadas bem sucedidas.
Kael se mudou e seus olhos brilharam de admiração.
— Você sempre consegue voltar com algum animal.. Queria ser um bom caçador também _Disse ele, com a voz carregada de diversão, enquanto lançava olhares para o animal morto e depois para Gerrin.
Gerrin suspendeu as decisões com firmeza, fazendo o cavalo parar. Ele tinha uma sobrancelha, avaliando o garoto com um leve sorriso nos lábios, enquanto ajeitava o chapéu de couro desgastado.
— Você está aprendendo, Kael. Só precisa de mais prática! Hoje vou caçar com os outros, mas quando eu voltar, nós dois vamos caçar. Depois pescamos, caso você fique estressado. _Enquanto conversamos, ele acariciou a crina de seu cavalo, como forma de agradecimento pela longa viagem de caça.
Kael franziu a testa, cruzando os braços com indignação.
— Mas eu nunca me estresso! _Exclamou ele com uma expressão firme, embora um sorriso surgisse nos cantos de sua boca.
Gerrin soltou uma gargalhada baixa e sacudiu a cabeça.
— Percebo, garoto. _Sua risada ecoou no ar tranquilo, enquanto ele fazia o cavalo andar novamente, levantando a mão em despedida. — Até logo garoto.
Mais tarde, já tarde da noite, o jovem Kael estava dentro de sua casa.
— O que vai ser dessa vez? _Perguntou Yelena, enquanto preparava uma sopa de legumes.
Kael estava sentado no chão, apoiando a ponta de um pedaço de madeira.
— Um lobo, Gerrin me mostrou eles uma vez quando me levava para caçar, vimos eles de longe... São verdadeiros predadores, fortes e implacáveis.
— Não me diga que ainda quer ser caçador _Yelena respondeu com um sorriso enquanto mexia a panela.
— Sua cabeça vive nas nuvens Kael.
Ele deu de ombros, concentrado na peça.
— Talvez eu não queira ficar preso aqui para sempre como todo mundo....
— Eldoras pode não ser grande, mas é seguro. _A voz dela ficou mais séria. — O mundo lá fora é cruel meu filho...
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Kael direcionou o olhar para sua mãe.
— E você acha que aqui é diferente? A vida aqui é só sobrevivência. Não há futuro em Eldoras.
Yelena suspirou, mas não respondeu. Havia verdade nas palavras dele, mas também sabia que a segurança era um luxo no mundo que conhecia.
Ao longo da noite, o vilarejo continuava calmo como sempre. Os moradores se recolhiam cedo, com exceção de alguns homens que ainda bebiam na pequena taverna. As luzes das lanternas lançavam sombras dançantes nas ruas, e o silêncio era quebrado apenas pelo som dos grilos e o vento suave que passava pelas árvores.
Mas naquela noite, o vento trouxe algo diferente.
Primeiro foi o som de galopes distantes, e depois um grito de alguém ao longe.
Kael olhou para a janela, confuso.
— Isso foi... um grito?
Yelena já estava alerta. Ela caminhou até a porta, espiando pela fresta.
— Fique aqui Kael. Não saia!
Ele se aproximou, teimoso como sempre.
— Mãe, o que está acontecendo?
Antes que ela pudesse responder, um rugido de fogo irrompeu na praça central. Uma das casas explodiu em chamas, iluminando a noite com um brilho laranja ameaçador.
~ Pelos deuses... _Yelena sussurrou.
A praça estava tomada pelo caos. Os soldados do Império Serdan avançavam como predadores, suas armaduras negras refletiam nas chamas. Eles esmagavam portas com golpes de machado, arrastando os moradores para fora como se fossem animais.
— Tragam as mulheres! _Gritou um deles, segurando um estandarte com o símbolo do corvo negro.
Um grupo de crianças tentou correr, mas foram rapidamente alcançadas.
— Pra onde acham que vão, ratos? _Um soldado puxou um garoto pelos cabelos, levantando o como se fosse peso morto. — Vamos ver se você grita como um porco.
Ele ergueu a espada e a lâmina desceu. O som da carne sendo cortada foi abafado pelos gritos desesperados ao redor.
Outro soldado arrastava uma mulher, segurando a pelos braços enquanto ela chutava e gritava.
— Para de se mexer, sua vadia! _Ele cuspiu. — Não vou machucar... muito.
— Não! Me solte! _Ela implorava, mas foi silenciada com um soco que a fez cair no chão.
Os homens riam, suas vozes grossas ecoavam acima do som das chamas e do choro.
— O cheiro de medo é o melhor tempero, não acham? _Zombou um deles, arrancando a roupa de uma jovem aterrorizada.
Kael observava tudo, escondido atrás de uma árvore. Ele queria correr, queria ajudar, mas estava paralisado. Seus olhos estavam fixos em um grupo de soldados que invadia sua casa.
Ele ouviu o som de sua mãe gritar e algo dentro dele quebrou.
— Não! _Ele murmurou, mas a voz saiu fraca.
Dois soldados arrastavam Yelena para fora, enquanto ela lutava com todas as forças.
— Tirem as mãos de mim, seus filhos da puta! _Ela gritava, tentando chutar o soldado mais próximo.
— Olha só a fera! _Riu um deles. — Acho que vai ser divertido domar essa aqui.
O outro soldado deu um tapa no rosto dela, a força suficiente para fazê-la cair de joelhos.
— Cala a boca, sua puta. Você não vai mandar em nada agora.
Kael apertou os punhos, sentindo a adrenalina misturada com a raiva tomar conta de si.
— Saiam de cima dela! _Ele gritou, saindo de seu esconderijo.
Os soldados se viraram, surpresos.
— Quem é esse? O ratinho saiu da toca?
— Melhor cuidar logo disso _Disse o outro, sacando uma adaga.
Yelena levantou a cabeça, o rosto inchado, mas ainda desafiador.
— Não... Kael, corre!
Mas ele não correu. Ele se jogou contra o soldado com a adaga, sem pensar. Foi um movimento desajeitado e desesperado, e ele foi facilmente derrubado no chão com um chute que o fez perder o ar.
O soldado se abaixou, segurando Kael pelo cabelo.
— Tem coragem, eu admito. Mas coragem não salva ninguém, moleque.
Ele ergueu a adaga.
— Vamos ver o que você tem nas entranhas.
O soldado estava prestes a enterrar a adaga no peito de Kael, mas foi interrompido por Yelena, que se jogou contra ele com toda a força que tinha.
— Não toque no meu filho, seu monstro! _Ela gritou, arranhando o rosto dele.
O homem cambaleou, irritado.
— Sua vadia! _Ele se virou para ela e desferiu um soco brutal em seu rosto, jogando a no chão.
Kael lutava para se levantar, mas a dor no estômago o mantinha imóvel. Ele viu sua mãe cuspir sangue e tentou gritar, mas sua voz não saía.
— Essa aqui tem mais energia do que eu pensava
_O soldado zombou, limpando o sangue do arranhão no rosto. — Vou ensinar algumas lições antes de acabar com ela.
Outro soldado se aproximou, rindo.
— Talvez devêssemos deixar o garoto assistir. Assim ele aprende o que acontece com quem desafia o Império Serdan.
— Vocês são covardes! _Yelena cuspiu. — Nem são homens de verdade. Só sabem espalhar dor e medo.
O soldado riu, agachando se perto dela.
— Você fala como se tivesse escolha. O medo é o poder. E agora, eu vou mostrar isso pra você.
Ele agarrou Yelena pelos cabelos, arrastando-a para longe de Kael. O garoto tentou gritar novamente, mas um terceiro soldado o chutou nas costelas, prendendo-o contra o chão.
— Quieto aí moleque. Ou vai ser o próximo.
Os gritos de sua mãe ecoavam pela praça enquanto o soldado começava a rasgar sua roupa. O horror nos olhos de Kael foi substituído por lágrimas de impotência. Ele tentou se mexer, tentou lutar, mas o peso do homem sobre ele o mantinha imóvel.
— Não... mãe... por favor... _Kael murmurou entre soluços, sua voz falhando.
De repente, uma flecha atravessou o pescoço do soldado que estava segurando Yelena. Ele caiu para trás com sangue jorrando de sua garganta. Os outros soldados pararam, confusos, enquanto mais flechas começaram a voar pela praça, atingindo um por um.
— Merda! Emboscada! Corram!! _Gritou um deles, procurando abrigo.
Kael olhou para os lados, ainda ofegante. Figuras emergiam das sombras, eram caçadores armados com arcos e lanças. E alguns outros moradores haviam reagido ao ataque, tentando desesperadamente salvar o que podiam do vilarejo.
Gerrin que havia voltado da caçada com os outros, correu até Kael e o levantou do chão.
— Venha, Kael! Temos que sair daqui!
— Minha mãe! _Kael inocente, apontando para Yelena, que caiu no chão, tentando se levantar.
Gerrin olhou para ela, mas sua expressão suportou quando viu um grupo maior de soldados Serdan chegando.
— Não temos tempo!
— Não! Eu não vou deixá-la!
Antes que Gerrin pudesse responder, Yelena cuidadosamente a mão em direção a Kael, com lágrimas nos olhos.
— Vá, Kael! _Ela falou, sua voz rouca e desesperada. — Sobreviva, meu menino!
Os soldados avançaram sobre ela antes que Kael pudesse reagir. Ele viu uma lâmina erguer-se acima de sua mãe e, em um único golpe, a vida dela foi tirada.
Kael falou, um som que parecia desde a noite em dois, mas Gerrin o segurou com força.
— Ela está morta, garoto! Você não pode fazer nada agora!
Mesmo lutando para escapar, Kael foi arrastado para longe, suas lágrimas se misturavam ao sangue e à fumaça.
Enquanto Eldoras queimava atrás deles, Kael jurou a si mesmo que o Império Serdan pagaria por tudo o que fez. Eles pagariam com sangue, desespero e lágrimas.